Relação entre Prefeitura e Câmara estremece após ameaça de chefe de gabinete a vereadores
Gestor sugere na tribuna que vereadores não entrem em escolas sem autorização por ofício
Foto: REPRODUÇÃO - Discurso do chefe de Gabinete da Prefeitura foi criticado por vereadores
Por Guilherme Gandini | 14 de abril, 2022

A sessão ordinária da Câmara de Catanduva, na terça-feira, 12, trouxe uma situação inusitada que estremeceu a controversa relação entre Executivo e Legislativo. O chefe de gabinete da Prefeitura, Fernando Martins de Sá, ocupou a tribuna para, supostamente, apresentar projetos, mas seu discurso acabou se transformando em uma espécie de ameaça aos vereadores. 

Falando em nome do prefeito Padre Osvaldo (PSDB), como fez questão de frisar, o gestor estava acompanhado por secretários, diretores e outros funcionários com cargos comissionados. 

Depois de conceituar o que é imunidade parlamentar, a separação dos três poderes da República e culpar a burocracia, dificuldades de logística e de execução para problemas da cidade, o advogado frisou que “a imunidade parlamentar não é total” e que “a fiscalização tem limites”. 

“O Legislativo tem prerrogativas que a gente respeita. Os limites estão bem definidos. Uma das prerrogativas é fazer fiscalização. Essas fiscalizações têm limites, dentro da prerrogativas, quando vereador encontra irregularidade, ilegalidade. Quando tem uma situação que todo mundo já conhece, é extravasamento, é abuso, e esse excesso não é bom pra ninguém”, disse. 

A seguir, afirmou de forma taxativa, valorizando seu próprio histórico. “Se precisar, o Executivo vai usar suas prerrogativas também, sem medo de ninguém. Não tenho medo do Ministério Público, nunca tive. Defendi prefeitos, arquivei mais de 60 inquéritos civis, mais de 50 ações nos TCEs, não tenho medo de enfrentar o MP, porque respeito todos os membros do MP, sou cordial e eles são cordidais comigo. Conheço juízes, promotores e a gente se lida muito bem. Nós não temos medo de ameaça. Essas prerrogativas se precisar usar, vamos usá-las.” 

Nesse ponto de sua fala, Fernando de Sá fez referência, de forma indireta, à entrada dos vereadores Maurício Gouvea (PSDB), Alan Automóveis (Progressistas) e Marquinhos Ferreira (PT) à escola municipal Dr. Armando Prandi, na Vila Soto. “As prerrogativas foram usurpadas, abusadas, alunos estavam em aula, professores em aula, todos ficaram assustados”, relatou, garantindo a seguir: “Isso não vai acontecer mais, eu garanto para os senhores.” 

“Querem falar mal do governo, do que está acontecendo, é uma prerrogativa. Não invadam mais escolas, áreas de saúde, porque as prerrogativas nós vamos usar. Existe um meio para isso. Nos oficiem que querem vistoria, que querem um documento. Vim aqui para defender meus irmãos, ser a ponte sobre eles”, afirmou, fazendo referência aos secretários municipais. 

RESPOSTAS 

A manifestação dos vereadores foi imediata. “Eu senti que ele veio dar um recado para esta Casa, para alguns vereadores. Se algum secretário não aceita crítica, que não aceite o seu cargo em comissão, aí não vai ter crítica. O papel do vereador é fiscalizar o Executivo. Quero dizer a todos que estão presentes, isso que ele falou não me abala, quem se sentiu ofendido, o Fórum fica no outro quarteirão. Que entre com uma ação. Quero dizer que vou procurar qualquer secretaria e nunca vou fazer um ofício para entrar, porque eu tenho as minhas prerreogativas como vereador eleito pelo povo”, rebateu Marquinhos Ferreira. 

“O que a gente viu esta noite, pra mim, pra população que está assistindo, é inédito. Vir dentro da Casa do Povo, colocar a faca no pescoço de um vereador, é colocar a faca no pescoço da população. Nós não somos funcionários do prefeito, do governo. Somos 13 funcionários da população e a prerrogativa do vereador é fiscalizar e denunciar. O que Fernando fez aqui hoje é colocar a faca no pescoço do povo e pedir para o povo ficar calado”, argumentou Gouvea. 

O vereador tucano, que até pouco tempo era um dos integrantes da base de apoio de Padre Osvaldo na Câmara, também refirmou que manterá a rotina de fiscalização. 

“Eu vou continuar fazendo o que o povo permitiu que eu faça, me deu uma nova oportunidade para fazer. Vou fiscalizar todos os setores que for chamado pela população. Eu não fui em escola nenhuma porque quis ir, fui em escola porque eu quis, fui porque os pais me ligaram, porque os munícipes me pediram. Não adianta vir aqui colocar a faca no meu pescoço. Isso é tentar intimidar o vereador, intimidar a população. Não vou deixar a população falando sozinha. Hoje, nesse momento, eu entendi que é guerra. E eu vou ficar do lado do povo”, frisou. 

As críticas à condução da administração também vieram à tona nas falas do vereador Maurício Gouvea, que disse que a conduta do chefe de Gabinete teve anuência e bênção do padre, chamado de omisso. “Uma cidade abandonada, suja, sem comando, num castelo de areia.” 

Na visão do presidente Gleison Begalli (PDT), a forma utilizada pela Prefeitura, com repreensão aos vereadores, foi inadequada. “Foi uma forma completamente errada para tentar resolver um litígio. As atitudes que o Executivo possam vir a tomar não deveriam ser colocadas na forma de ameaça, mas na forma de ações concretas. Achei inapropriado e desrespeitoso com a Câmara, uma forma despreparada do governo em lidar com essa situação”. 

Autor

Guilherme Gandini
Editor-chefe de O Regional.

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