No Dia Internacional da Mulher, 10 líderes falam sobre a luta feminina
O Regional convidou mulheres que ocupam posições de liderança para comentarem quais são os principais desafios enfrentados
Por Guilherme Gandini | 08 de março, 2023

Do trabalho restrito ao lar, nem sempre remunerado, até alcançar a presidência de grandes empresas e espaços na política. Essa reviravolta meteórica, entretanto, não ocorreu da noite para o dia: foi fruto de muita luta e coragem. E pensar que até 1827, as mulheres não podiam estudar sem permissão dos maridos e que seu acesso às faculdades só viria em 1879.

O problema é que ainda hoje as mulheres enfrentam muitas dificuldades no Brasil apenas por terem nascido mulheres. No mercado de trabalho, por exemplo, levantamento divulgado pelo Dieese na segunda-feira, 6, com dados de 2022, mostra que o rendimento médio mensal das mulheres é 21% menor do que o dos homens – R$ 3.305 para eles e R$ 2.909 para elas.

Mesmo com mais anos de estudo, as mulheres recebem menos que os homens. Até nos setores de atividades em que as mulheres são maioria, em média, o ganho financeiro é inferior.

Outros temas a serem debatidos são o machismo e o feminicídio. O estudo “Elas Vivem: dados que não se calam”, baseado em dados da Rede de Observatórios da Segurança, aponta que no ano passado houve ao menos uma morte desse tipo por dia nos seis estados pesquisados.

Ao todo, 495 mulheres foram assassinadas e 2.423 foram vítimas de violência na Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo. Este último lidera o ranking. A cada quatro horas, uma mulher dessas localidades sofreu algum tipo de violência. Na maior parte dos casos, 75%, o agressor é o próprio companheiro da vítima ou os ex-companheiros.

A VOZ DAS MULHERES

Para ampliar a discussão, convidamos 10 mulheres catanduvenses que ocupam posições de liderança em setores diversos a comentarem quais os principais desafios enfrentados sendo mulher em posição de poder e se elas já sofreram preconceito ou injustiças por serem mullheres. As 10 convidadas confirmaram, de forma unânime, que o Dia da Mulher é importante.

MARA GABAS

‘Quando a mulher impõe respeito, tem o seu lugar’

Profissional multitarefas, Mara Gabas diz que sua geração não vivenciou o mesmo preconceito que as anteriores, como de sua mãe e sua avó. Jornalista, radialista, empresária e presidente do projeto Corujas do Bem, Mara foi eleita vereadora aos 23 anos. “Eu nunca sofri preconceito. Acho que a mulher quando impõe respeito e é competente, ela tem o seu lugar e eu nunca tive problema em nenhum setor por ser mulher, muito pelo contrário, só tive vantagens”, pontua.

A jornalista frisa que a mulher precisa ser competente e se profissionalizar. “Não tem nada que o homem faça que a mulher não possa fazer e bem-feito”, afirma. Sobre a data, Mara diz que ela é importante para mostrar que “a mulher pode estar onde ela quiser, do jeito que ela quiser e fazer o que ela quiser”, ficando em casa e assumindo os trabalhos domésticos se preferir. “A gente vê muitos homens que cuidam dos filhos, são donos de casa e as mulheres trabalham.”

VERA PINFILDI

‘Desafio é fazer com que elas se sintam capazes’

Referência no setor assistencial, a presidente do Fundo Social de Solidariedade de Catanduva, Vera Pinfildi diz que em sua área de atuação o desafio é fazer com que as mulheres sintam-se fortalecidas, capazes de dar bons exemplos aos seus filhos, capacitem-se para gerar renda e busquem independência. “O maior desafio é fazer com que elas se sintam capazes.”

Verinha, como é conhecida, frisa que o setor social é um segmento em que a mulher, com todas as suas qualidades, costuma se encaixar bem. Ela frisa que a data de hoje possibilita reflexão e, a partir dela, avanços. “É um momento que se faz reflexão e avaliação dos avanços que as mulheres estão conquistando no decorrer do tempo. Traz, também, propostas para avanços maiores, como respeito e a não violência, avanços que as mulheres vão pleiteando.”

TAISE BRAZ

‘É desafiador se fazer ser ouvida e respeitada’

Para a vereadora Taise Braz, primeira mulher preta a ocupar a vereança, bem como posição na mesa diretora da casa, “é desafiador para nós mulheres se fazer ser ouvida, respeitada e por vezes provar nossa competência nesta posição”. Ela garante que sentiu preconceito várias vezes ao longo da vida. “Com o reforço de ser uma mulher preta essas situações são recorrentes.”

A parlamentar diz que as mulheres não devem aceitar nenhum tipo de silenciamento ou situações que as deixem desconfortáveis ou em risco. E, dentro de sua possibilidade ao construir sua trajetória, Taise afirma que a mulher deve apoiar e levar outras mulheres consigo.

“Só de estar viva em uma sociedade com uma cultura tão machista e patriarcal é um ato de resistência diário”, aponta ela, completando que o Dia da Mulher deve ser um moneto de reflexão. “Sobre como nós mulheres somos diversas, temos necessidades distintas e como vamos criar ações para que possamos sair das estatísticas negativas e viver com dignidade”.

IVÂNIA SOLDATI

‘A representatividade deve continuar a aparecer’

A vereadora e protetora de animais Ivânia Soldati considera como um dos principais desafios o ropimento de paradigmas estabelecidos que limitam a atuação feminina para poder mostrar, através de ações e resultados, que o lugar da mulher é onde ela quiser.

“Sempre tive uma opinião muito firme e não me deixei abater pelas dificuldades, seja no setor privado, de onde vim na área de vendas, enfrentando resistências tidas como comuns, mas sempre procurei me manter firme ao meu propósito”, conta Ivânia, que aconselha as mulheres a incentivarem umas as outras a encontrar dentro de si o seu próprio poder.

A parlamentar diz ainda que a data diz muito, principalmente ao se observar o contexto histórico de avanços que tardaram, mas hoje são realidade para as mulheres. “Essa representatividade deve continuar a aparecer, no meio político e profissional. Sempre com a ideia de soma.”

HELENIR HERNANDES KUSCHNAROFF

‘Não deixe ninguém falar que você não é capaz’

Presidente do Conselho da Mulher Empresária (CME), Helenir Hernandes Kuschnaroff, lembra que todas as mulheres que ocupam cargos de liderança têm que ficar provando sua capacidade. “A mulher sempre que se destaca fica evidência porque é boa e capaz, mas precisa ficar provando a todo momento que pode estar nessa liderança e local de destaque”, lamenta.

Ela diz nunca ter sofrido preconceito, mas reconhece que outras mulheres, além de não conseguirem o cargo que almejam, são discriminadas e até ganham menos [pela mesma função que o homem]. “O conselho é não desistir dos seus sonhos. Não deixe ninguém falar que você não é capaz, porque nós mulheres somos capazes de tudo que nós queremos. Podemos alcançar qualquer cargo, qualquer liderança, estamos trabalhando para que essa mentalidade mude.

SIMONE TROVÓ

‘A maior arma feminina é o conhecimento’

Mestre em Enfermagem, gerente de Cuidados nos hospitais da Fundação Padre Albino e coordenadora do curso Técnico de Enfermagem do Colégio Catanduva, Simone Trovó afirma que o cenário feminino já vem apresentando mudanças. “A questão da desvalorização era muito presente, assim como o preconceito, pois lidávamos com líderes homens e ficava claro, em reuniões ou discussões de alguma situação, em que a mulher tinha maior entendimento e capacidade técnica sobre o assunto, porém ela acabava não sendo tão ouvida. Hoje percebo a mudança, pois nas mesmas situações a voz da mulher tem o mesmo poder de decisão.”

Segundo ela, a maior arma feminina para atuar na liderança é o conhecimento. “Temos algumas vantagens, que são características femininas, como maior atenção aos detalhes, liderança mais inclusiva e participativa, apta a multitarefas. Somando isso ao aprimoramento técnico, que todos devem ter quando buscam ser líderes, as injustiças são superadas no dia a dia.”

A data do Dia da Mulher, salienta Simone, deve ser comemorada. “O empoderamento feminino cresce em todas as áreas. Temos que estar preparadas para acompanhar essa mudança e prontas para assumir os desafios que virão, sabendo nos posicionar diante das conquistas que tanto almejamos, desenvolvendo, assim, a equidade de gêneros no mercado de trabalho.”

LUCIANA BIANCHIN LOPES PEREIRA

‘Reconhecer as conquistas é validar nossa luta’

Ao falar sobre o Dia da Mulher, a dirigente regional de Ensino, professora Luciana Bianchin Lopes Pereira fala que a data vai muito além das comemorações. “É uma oportunidade de reverenciar todos os movimentos em direção à igualdade de direitos e de condições das mulheres”, garante, lembrando que a sociedade tem muitos passos pela frente para superar a disparidade de gênero.

Ela prossegue: “Reconhecer as conquistas sociais, políticas e culturais das mulheres é validar sua luta constante pela igualdade e sua presença marcante nas mais diferentes demonstrações de força nas famílias, nas ruas e no trabalho, conquistando merecidamente muitos espaços de fala e os transformando, em espaços de escuta capazes de evidenciar sua influência de forma eficaz.”

Na educação, Luciana frisa que as mulheres são protagonistas e precisam ter seus trabalhos devidamente reconhecidos pela importância e relevância para a sociedade. Diz, também, que enquanto gestora tem o compromisso de construir relacionamentos de qualidade entre homens e mulheres. “Que entendem que as diferenças os torna mais criativos, inovadores, eficientes e sobretudo capazes de identificar em cada um as qualidades que os fazem completos.”

LUIZA MARQUES DE FÁZIO

‘A desconfiança tende a acabar quando percebem nosso preparo’

Para a presidente do Conselho dos Direitos da Mulher de Catanduva, a advogada e professora Luísa Helena Marques de Fázio, o principal desafio é a dupla jornada, ou seja, conciliar o trabalho doméstico e cuidado com os filhos/família e a carreira profissional. “Por mais que o marido ou companheiro divida as tarefas, ainda recai o ônus do cuidado sobre as mulheres. Além disso, sofremos com a misoginia no trabalho e na sociedade. Muitas vezes acreditam que nós não vamos conseguir executar uma atividade pelo simples fato de sermos mulheres.”

Luísa diz que a área do Direito ainda é muito machista, mas que as mulheres foram galgando posições e espaço: hoje, elas correspondem a mais de 51% dos quadros da OAB e são sócias de grandes escritórios. Nas carreiras da Magistratura e Ministério Público, já são a maioria aprovada nos concursos. “Mas ainda demora a atingir os cargos de maior poder”, pondera.

A profissional ainda fala sobre as injustiças. “Como professora no ensino superior, já enfrentei inúmeras situações de assédio, discriminação e injustiças. Já fui preterida em cargos em favor de pessoas do sexo masculino. Alguns clientes ou a parte contrária às vezes duvidam de nossa capacidade. Ainda mais quando somos mais jovens ou recém-formadas. Entretanto, a desconfiança tende a acabar quando percebem nosso preparo e capacidade.”

Ela salienta que as mulheres não querem ocupar o lugar dos homens. “Mas queremos igualdade e estar junto com eles. Uma sociedade, uma empresa, um país, só tem a ganhar e crescer quando há multiplicidade de ideias. Para dar o colorido necessário a tudo, é preciso a diversidade. Diferentes olhares e visões da realidade contribuem para um mundo melhor.”

VIVIAN SIQUEIRA

‘Nosso diferencial é a doçura para conduzir esse mundo tão rígido’

A empresária Vivian Siqueira, gestora da Unidade de Negócios de Catanduva da RTE Rodonaves Transportes e proprietária de uma loja de decoração de interiores, enfrentou o machismo no dia a dia em sua principal área de atuação há 15 anos: o ramo de logística e transportes.

“Não é fácil ser mulher desempenhando qualquer função, sempre teremos olhares nos julgando, se somos capazes para tal função, se seremos firmes nas decisões. Mas quando se fala do ramo de logística a conversa fica um pouco mais intensa, pois mulher não "entende" dessas coisas. E se entendemos de mecânica, pneus, km, média kg, aí a situação fica mais controversa porque parece que perdemos a nossa feminilidade e passamos ser vistas como homens”, relata.

Vivian enfatiza que as mullheres podem ter conhecimento de vários segmentos e continuarem sendo doces e maternas. “Esse tabu tem que ser quebrado”, reforça.

Em um episódio, Vivian lembra que o cliente se irritou pois sua carga não havia chegado como ele esperava e quis falar com o dono da empresa. Ao vê-la de salto e batom nos lábios, retrucou que queria falar com o dono e não uma funcionária. Mesmo quando ela se apresentou como proprietária, ele se virou e saiu, recusando-se a estabelecer uma conversa com uma mulher.

“Falo para todas que já passaram por situações parecidas, não abaixem a cabeça, entretanto não percam o nosso diferencial que é a doçura para conduzir esse mundo tão rígido e frio. Sei que o que faço a maioria dos homens não faz, dar conta de tantos afazeres, mas isso não os diminui e pelo contrário me engrandece. Nunca almejei ter igualdade de sexo, não! Pelo contrário, quero ser mimada, bajulada, protegida como sou pelo meu marido.”

NATÁLIA BURIAN

‘As pessoas que desconfiam da gente um dia vão aplaudir em pé’

Um dos principais nomes do esporte catanduvense, Natália Burian é jogadora de basquete e, atualmente, presidente do Bax Catanduva, a equipe feminina da modalidade que representa a cidade nas principais competições do país.

A gestora afirma que desafio é superar a desconfiança. “Tenho que matar um leão por dia para mostrar que eu sou capaz de gerir uma equipe de basquete como um homem faria. Graças a Deus tenho conseguido conquistar este espaço e muitos homens têm me dado parabéns, pois sabem que não é fácil. O preconceito ainda existe, mas o lugar da mulher é onde ela quiser.”

A atleta diz que não foi discriminada, mas já sentiu que duvidavam de que ela seria capaz de ser uma gestora e estar dentro da Federação Paulista como vice-presidente. “A gente pode ser o que a gente quiser, lutar pela igualdade sim, se valorizar e a gente consegue fazer tudo e muito bem-feito. As pessoas que desconfiam da gente, um dia vão aplaudir em pé.”

Autor

Guilherme Gandini
Editor-chefe de O Regional.

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