Quando o perito criminal entrou na residência em que uma idosa de 86 anos foi assassinada com golpes de marreta, no mês passado, em Catanduva, o autor do crime era desconhecido. Com perspicácia, o profissional da Polícia Científica decidiu analisar uma porta danificada no local e acabou detectando uma impressão digital que possibilitou a identificação do suspeito.
“Ele achou que aquilo seria um campo propício para tentar levantar fragmento dígito-papilar, que não são visíveis a olho nu. Dependendo a superfície, ele tem que usar um tipo de reagente. Sendo uma porta, usou carbonato de cálcio, salvo engano, e conseguiu êxito em revelar essas impressões dígito-papilares”, detalha José Eduardo Basaglia, chefe da Equipe de Perícias Criminalísticas.
O mandado de prisão foi expedido a partir da identificação da impressão digital, abrindo caminho para a operação da Polícia Militar, que localizou e prendeu o indivíduo, que teria confessado a autoria do crime. Ele estava foragido da Justiça desde que foi beneficiado pela saída temporária, em março, e não retornou ao presídio de Lucélia, onde respondia por crimes de roubo e estupro.
O trabalho da perícia, visto muitas vezes em séries criminais na tevê, segue metodologia e procedimentos técnicos que envolvem, além da busca por impressões digitais, a coleta de sangues de suspeitos para exame de DNA, a perinecroscopia – exame minucioso do cadáver para detectar possíveis orifícios de disparo de arma de fogo ou de instrumento perfurocortante, por exemplo.
Em cenas de acidentes automobilísticos com vítima fatal, o perito também analisa o cadáver, com o intuito de definir a causa do óbito – se foi um mau-súbito ou se a morte foi causada por trauma pós-impacto. Ele ainda busca por marcas de frenagem para determinar trajetória e a velocidade dos veículos envolvidos ou mesmo para definir qual foi o veículo responsável pela colisão.
Nos últimos anos, segundo Basaglia, a tecnologia de perícia criminal tem avançado bastante, sobretudo a partir do advento do exame de DNA, que aumentou as identificações de suspeitos e eventuais autores dos crimes. Mesmo aqueles exames mirabolantes vistos nas séries televisivas são feitos pela Polícia Científica de São Paulo – excluindo-se, é claro, alguns excessos.
“A gente já tem esses equipamentos que fazem aquilo que é retratado na televisão, mas às vezes não da forma como é retratado. Tem determinadas superfícies que você não tem como fazer essa coleta de impressão digital. É um pouco de ficção, mas muita realidade também”, diz Basaglia.
Ele ressalta que Catanduva tem tecnologia e mão de obra para esclarecer todo tipo de crime. “Se a gente não tiver condições de efetuar determinado exame, a gente tem órgãos de apoio, a própria superintendência da Polícia Técnico-Científica tem um laboratório central que nos acolhe nesse sentido e nós temos outros órgãos auxiliares, como o Instituto Adolfo Lutz e as universidades.”
BUSCANDO MINÚCIAS
A Polícia Científica costuma ser a última a chegar ao local do crime e faz seu trabalho a partir da busca por minúcias e resquícios do fato delituoso. Basaglia afirma que a eficiência desse trabalho depende, e muito, da preservação da cena do crime.
“Hoje 1% das ocorrências resultam em cadeia. Não diria inquérito instaurado, mas resulta em condenação, prisão das pessoas. Isso está diretamente ligado à preservação dos locais, porque muitas vezes a equipe de perícia chega ao local e ele está completamente desfigurado”, lamenta.
Ele frisa que todos os envolvidos precisam agir nesse sentido. “O primeiro policial que chega ao local, desde que esteja devidamente treinado, tem que saber que ele precisa preservar o local. Às vezes um fragmento de vidro para ele não é importante, mas para nós é muito importante para saber o direcionamento do impacto, se foi de fora para dentro ou de dentro para fora.”
‘Não dispenso um bom trabalho humano’
Com trajetória de 37 anos na Polícia Científica, José Eduardo Basaglia acompanhou toda essa evolução tecnológica das investigações criminais. Questionado se isso tem contribuído para que o trabalho seja mais assertivo, ele diz que não dispensa um bom trabalho humano.
“Não adianta a gente ter tecnologia de ponta se você não tem um bom piloto, vamos dizer assim. A tecnologia é muito importante, ela substitui muitas vezes as nossas vistas, mas se você não tiver um bom profissional que saiba direcionar, eu acho que a perícia fica comprometida”, afirma.
As qualidades de um bom perito, diz ele, é ter atenção aos detalhes, ter curiosidade, saber mexer com os resquícios. “Ele tem que dar valor a todo e qualquer vestígio de crime, desde uma bituca de cigarro até uma marca de solado na terra, até uma marca de frenagem em acidente de trânsito, até um simples grampeamento de um documento é importante para a perícia.”
Autor