Busca pela felicidade: caminhos, limites e perigos dessa perseguição
O Regional convidou a psicóloga Thamires Januário Iamamoto e o professor Dayher Giménez para falarem sobre o tema que move o ser humano
Fotos: Arquivo Pessoal
Por Guilherme Gandini | 19 de março, 2023

O Dia Internacional da Felicidade, em 20 de março, foi instituído pela ONU - Organização das Nações Unidas em 2012 para estimular políticas públicas a favor desse sentimento. O órgão aponta, inclusive, que a erradicação da pobreza e desigualdade contribuiu com o aumento da felicidade e fazem parte dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que são 17 ao todo.

O tema, entretanto, é bastante complexo e profundo e as discussões em torno da felicidade humana envolvem estudiosos de várias áreas do conhecimento. Nesta abordagem, O Regional convidou a psicóloga clínica Thamires Januário Iamamoto, que utiliza a abordagem da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), e o professor e historiador Dayher Giménez.

Afinal, o que é felicidade? Para Thamires, é um estado emocional constituído por sentimentos de satisfação, contentamento e realização. “É desenvolvida pela qualidade dos pensamentos, equilíbrio emocional e satisfação em relação às diversas áreas da vida”, afirma, fazendo referência à TCC e à Psicologia Positiva, que diz que se trata de estado de plenitude composto por emoções positivas, engajamento, relacionamentos positivos, propósito de vida e conquista.

Algumas características de pessoas felizes, segundo a especialista, são bom autoconhecimento, boas interações sociais, bom humor, paciência, resiliência, reconhecimento das situações diárias, amor próprio, boa resolução de problemas, entre outras.

Já Dayher Giménez, aprofundando-se na área da Filosofia, diz que cada um de nós costuma ter sua própria resposta para o significado de felicidade, mas frisa que a raça humana tem uma base comum de anseios, vontades e situações existenciais positivas que busca tornar permanente. A felicidade é uma delas. Ele relembra que o texto mais antigo sobre felicidade, de Tales de Mileto, diz que é feliz “quem tem um corpo saudável e forte, sorte e uma alma bem formada.”

O historiador cita, também, Aristóteles, que afirmou séculos depois que o segredo da felicidade é viver em harmonia pessoal, em equilíbrio, sem excessos, como numa balança. E, dando um salto no tempo, menciona Confúcio, que ensinou que só há felicidade na harmonia coletiva.

“Podemos revisitar três, quatro mil anos de produção filosófica. No final, iremos concluir que as propostas são meramente diferentes nesta variação: felicidade é estar e se sentir (de alguma forma) bem. Acho que esta é a síntese máxima do que Voltaire, Sócrates, Kant, Epicuro, Russell, Aquino, enfim, todos os grandes pensadores do passado e do presente diriam.”

Ele salienta que a felicidade plena é real, se não for confundida com total. “Felicidade plena é atingir um patamar onde você aceita o que acontece, numa resignação muito consciente, e faz o melhor de acordo com as suas possibilidades. É um estado interior de calma, de quietude, de paz, independente das turbulências que ocorrem no mundo exterior.”

Voltando à psicologia, Thamires comenta que a felicidade é uma busca individual. “Ser feliz está associado à percepção geral sobre a vida e, cada pessoa é única e tem seu modo de olhar para a vida.” Já Dayher diz que o núcleo da felicidade é atemporal, mas que ela toma diferentes formas conforme a cultura sofre metamorfoses. “No íntimo, seja no plano individual ou coletivo, todos os homens e mulheres de todas as eras sempre quiseram a mesma coisa: estar bem.”

Questionada se há receita para uma vida feliz, a psicóloga relaciona várias fontes de felicidade, já que as pessoas podem se sentir felizes em um trabalho, com amigos, familiares, viajando, se exercitando, conquistando bens, se divertindo. “Mas um item que deve estar presente na vida de qualquer ser humano é ser autorresponsável, ou seja, assumir o controle da sua vida”, frisa.

Quando a felicidade vira obsessão

São diversas as consequências à saúde mental para o ser humano que se torna obsessivo pela felicidade. A busca tão frenética pode gerar o inverso, desencadeando ansiedade, tristeza, sofrimento e outros comportamentos compulsivos.

“Tudo em excesso não faz bem. A busca pela felicidade deve acontecer, pois isso lhe trará qualidade de vida, mas, sempre tenha limites. Se permita também ter outras emoções e comportamentos, mesmo que para você não sejam “tão boas”, como por exemplo ficar triste em alguns momentos, errar, chorar, ter incertezas. Isso é a vida”, aconselha Thamires.

Ela diz que, nesse contexto, a tristeza e o sofrimento mostram que é o momento de parar, pensar e modificar pensamentos. “Uma parcela considerável do nosso bem-estar psicológico é afetada por eventos de vida e sentimentos. E a partir do momento que alimentamos com frequência sentimentos mais negativos, isso irá gerar consequências ruins.”

Sobre o tema, Dayher parafraseia Flaubert. “Ele disse: “Tenha cuidado com a tristeza. É um vício.” E eu digo: Tenha cuidado com a felicidade. É um vício! Tudo o que pretende ser e ter um fim em si mesmo, ou seja, tudo o que é ou se transforma numa obsessão, é um vício. E o vício mata justamente aquilo que se busca”. Para o historiador, a felicidade está no equilíbrio.

Vida moderna cada vez mais instantânea

Os dois especialistas foram questionados sobre a vida moderna e sua instantaneidade, bem como sobre as redes sociais, que só exibem momentos felizes. Thamires atesta que esse estilo de vida não precisa ser uma barreira inatingível. “Temos a capacidade de ir nos ajustando às diversas situações do dia a dia - dentro do nosso limite. É importante manter a calma e se organizar.”

Ela confirma que redes sociais e os meios de comunicação podem ser possíveis gatilhos para o desenvolvimento de sentimentos negativos e contribuir com o desencadeamento de transtornos mentais. “Nas redes postamos só parte do nosso dia. Por isso a importância de ter um bom autoconceito, autoconfiança e amor próprio, para um bom enfrentamento das situações.”

Já Dayher Giménez contribui com a questão dizendo que a vida instantânea é barreira à felicidade. “A felicidade é fluída, progressiva, escoa e acontece no tempo: leva tempo com começos, meios e fins muito graduais. O instantâneo abdica dos processos porque quer as coisas já, imediatamente. E a felicidade foi feita para durar. Logo, a felicidade abomina o instantâneo.”

Autor

Guilherme Gandini
Editor-chefe de O Regional.

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