Valiatti projeta que ‘médico do futuro’ fará medicina mais individualizada
Coordenador do curso de Medicina da Unifipa analisa impactos tecnológico na formação de profissionais e na relação com pacientes
Foto: CÂMARA DE CATANDUVA - Valiatti diz que a Covid-19 causou impacto em todos os níveis, incluindo o ensino universitário
Por Guilherme Gandini | 19 de outubro, 2022

A celebração do Dia do Médico, nesta terça-feira, 18 de outubro, levou O Regional a fazer duas abordagens sobre o tema, com foco para pontos que, em tese, são opostos: a Medicina de Família, da qual se espera a relação próxima entre médico e paciente, e os impactos das novas tecnologias sobre a Medicina e a formação de novos profissionais – levantando, neste caso, questões sobre o possível distanciamento que esse processo possa causar.

O primeiro tema foi abordado na edição de ontem pelo médico de família e comunidade João Marcelo Porcionato e, nesta sequência, o entrevistado é o médico Jorge Luis Valiatti, especialista em Clínica Médica e Medicina Intensiva, coordenador do curso de Medicina da Unifipa e responsável pelas UTIs dos hospitais da Fundação Padre Albino. Para ele, a “robotização” não afastará médicos e pacientes e o “médico do futuro” fará uma medicina mais individualizada.

O Regional: Pensando na formação de novos médicos, qual a principal mudança conceitual que vem acontecendo ao longo dos anos?

Dr. Jorge Luis Valiatti: Acredito que o ensino da Medicina, apesar das mudanças conceituais que possam ocorrer no futuro, deve ter sempre como baliza profissional uma formação geral, humanista, crítica, reflexiva e ética, com capacidade para atuar nos diferentes níveis de atenção à saúde, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da saúde, nos âmbitos individual e coletivo, com responsabilidade social e compromisso com a defesa da cidadania, da dignidade humana, da saúde integral do ser humano e tendo como transversalidade em sua prática, sempre, a determinação social do processo de saúde e doença.

O Regional: O perfil do jovem que se interessa pela área também sofreu mudanças?

Valiatti: A mudança do perfil dos jovens que buscam qualquer profissão que seja obviamente passa por transformações ao longo dos anos. Não vejo, porém, grandes diferenças entre hoje e quando ingressei no curso de medicina em 1977. Hoje o leque de profissões é enorme. Acredito que seguir qualquer carreira nos dias atuais tenha menor influência dos pais no sentido de obrigar a fazer uma escolha. Eles são mais livres para escolherem. Por outro lado, sempre é uma decisão difícil qual caminho tomar ainda numa fase de muita dúvida na fase da adolescência. Com o médico pode existir uma gama de oportunidades que o aluno acaba descobrindo durante a sua graduação, e que pode não o levar para a prática médica, mas a inúmeras áreas que atuam ligados à Medicina.

O Regional: Qual impacto as novas tecnologias têm na formação dos novos médicos?

Valiatti: As novas tecnologias obviamente estão sendo decisivas para a formação de qualquer profissional. Mas imputo acesso à informação em tempo real, um dos fatores primordiais por essa revolução, que permite que o aluno durante a sua formação esteja conectado e tenha acesso a fontes científicas de qualquer lugar do mundo. Um exemplo é o acesso à literatura especializada. Me lembro que para ter acesso a um periódico cientifico tínhamos que nos deslocar a São Paulo, usar copiadoras, tudo isso hoje está na palma da mão. O desenvolvimento de novas tecnologias permite uma conexão rápida de acesso a informações dos pacientes e exames, incluindo imagens em tempo real, agilizando a tomada de decisões. Este fenômeno da expansão da tecnologia é acelerado pela redução dos custos dos microssensores. A Telemedicina já é uma realidade, quer seja com a utilização de um “simples” celular ou utilizando sistemas complexos que incluem monitoramento de pacientes em tempo real de seus sinais vitais. Será possível fazer uma medicina mais individualizada, as drogas desenvolvidas terão alvos mais específicos. E o médico do futuro, assim como toda a equipe multiprofissional terá que lidar com tudo isto. Isto tende a melhorar o relacionamento médico-paciente e aumentar a segurança dos procedimentos.

O Regional: Considerando o aumento da expectativa de vida, qual o principal desafio da Medicina hoje?

Valiatti: O aumento da expectativa de vida terá impacto importante nos custos com a saúde. Hoje vive-se mais, muitas enfermidades tiveram seu curso mudado pela ciência. O grande desafio é que este envelhecimento em anos possa ser acompanhado de qualidade de vida, e aí que reside o problema. Pensar numa sociedade mais idosa, mas menos doente, requer investimentos na promoção da saúde desde a infância, e isto tem custos. É lamentável o que se observa por exemplo hoje com a volta de doenças que já estavam erradicadas.

O Regional: A Covid-19 acarretou transformações na Medicina e na formação de novos médicos?

Valiatti: Os impactos na área de educação foram sentidos em todos os níveis, incluindo o ensino universitário. Tivemos, como professores, de nos habituar ao ensino remoto, fato que nunca tínhamos vivenciado. O mesmo aconteceu com os alunos. Campos de estágios no auge da pandemia foram reduzidos. A decisão de mantermos as internações numa ala específica do Hospital Emílio Carlos quase que exclusivamente para pacientes com Covid-19, e o Hospital Padre Albino para as demais doenças permitiu que o ensino não fosse interrompido durante o internato.

O Regional: A “robotização” da Medicina pode tirar a humanização da relação entre médico e paciente?

Valiatti: Em relação à “robotização” da medicina, entendendo a mesma como a substituição de algumas habilidades médicas por máquinas, acredito que será exatamente o contrário. Vou dar um exemplo. Vejo muitas pessoas imaginando que ao serem submetidas a uma cirurgia robótica acreditam que não estejam sendo assistidas por médicos. É exatamente o contrário: para que isto ocorra deve existir alguém capaz de programar a imensa maioria dos procedimentos, inclusive todo o procedimento anestésico. Ter inteligência artificial sugerindo atitudes “inteligentes” não excluem a necessidade de um médico experiente para tomar as principais decisões.

O Regional: O advento das novas tecnologias e consultas on-line tornará a relação médico-paciente mais distante?

Valiatti: As consultas acredito que dificilmente no primeiro contato sejam “a distância”. Parte desta abordagem, que inclui a anamnese, ou seja, o relato de sinais e sintomas, possa ser realizado desta maneira. O exame físico, por outro lado, ainda está longe ainda de excluir o médico presencialmente. Agora me parece óbvio que o seguimento de muitas doenças já diagnosticadas possa ser seguido e controlado de maneira remota. Isto certamente reduziria as filas nos ambulatórios simplesmente para checar exames ou solicitar exames rotineiros. A mesma coisa já ocorre com exames de imagens. Os laudos e as imagens já são disponibilizados para médicos e pacientes. Estes equipamentos podem ser acionados remotamente por médicos, na presença de pessoal técnico especializado. Toda esta tecnologia irá revolucionar a medicina em lugares remotos. Lembro também a possibilidade de assessoria remota de especialistas no auxilio a médicos menos experientes.

Autor

Guilherme Gandini
Editor-chefe de O Regional.

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