A conversa com um amigo de infância, cujos pais são médicos, é uma das lembranças do médico de família e comunidade João Marcelo Porcionato sobre o momento em que ele decidiu, ainda no Ensino Médio, que seguiria a profissão celebrada neste 18 de outubro. “Ele contou que sua mãe dizia que para ser médico é preciso gostar de ajudar as pessoas. Aquilo me marcou muito.”
Porcionato não tinha qualquer inspiração familiar para seguir a Medicina. Seus pais foram criados na área rural, na cidade de Viradouro, e depois se mudaram para Bebedouro quando ele ainda tinha 3 anos de idade. Porém, sempre estimularam os dois filhos a estudar.
Depois de três anos de cursinho, o jovem universitário iniciou os estudos na Fameca/Unifipa. “Entrei na faculdade querendo ser cardiologista, era vidrado pelo coração. Quando fazia feira de ciências no colégio era sempre tema relacionado ao coração, eu achava fantástico”, lembra.
No primeiro ano da faculdade, Porcionato conheceu a especialidade Medicina de Família. Quem apresentou, em uma aula no anfiteatro da Fundação Padre Albino, foi o médico Carlos Roberto Surian, que hoje dá nome à unidade de saúde do bairro Nova Catanduva.
“Ele foi um dos meus maiores incentivadores para me tornar médico de família. Passei os seis anos de faculdade indo atrás, pois não se falava disso, não era dito como uma especialidade”, confidencia Porcionato, ponderando que a Medicina de Família está no rol das especialidades médicas desde o início, com registros no nome de Medicina Geral e Comunitária nos anos 70.
“A Medicina está tão focada em tornar o corpo humano em porções, se é cabeça é neurologista, osso ortopedista, coração cardiologista, que ninguém consegue valorizar ou enxergar o médico que olha para o paciente como um todo, que se preocupa com aquele sentimento; não consideram isso uma especialidade, porque o foco nas especialidades focais é muito grande.”
O médico de família, frisa Porcionato, faz a abordagem centrada na pessoa. “Eu foco na pessoa, não no que ela está reclamando. A queixa vai ser a porta de entrada para o início de um diálogo.”
Ele dá como exemplo muito comum o paciente com dores no pescoço, que irradiam para a cabeça. “Esse paciente às vezes passa por dois ou três médicos, faz uma série de exames, ressonância e dá tudo normal. O médico olha para ele e fala: você não tem nada, mas o paciente está com cor. Por quê? Porque eu estou valorizando o resultado do exame, não deu nada, o paciente não tem nada, às vezes até parece que é frescura, e ninguém olha para a pessoa.”
Por outro lado, pontua, quando a abordagem é centralizada na pessoa, o médico de família consegue compreender o que está acontecendo. “Será que essa dor tem algum cunho relacionado ao estresse? Será que essa pessoa está passando um momento difícil na vida, que trabalha sobre forte pressão, eu preciso entender, eu vou entender essa pessoa inserida no trabalho, inserida na família, na comunidade que ela vive, para saber o que mais eu posso fazer para ajudá-la. Quando você faz essa abordagem, o paciente tem tendência de criar um vínculo maior com você, vai te falar realmente o que ela está sentindo, às vezes chora, desabafa.”
Diante do avanço da tecnologia na área médica, Porcionato alerta que a população tem a tendência de relacionar quantidade de exames ao cuidado médico. “Será que o fato de eu pedir dezenas de exames para um paciente significa que eu estou cuidando dele? Pelo exemplo anterior, pediu-se um monte de exame, falou-se para o paciente que ele não tinha nada, mas não se resolveu o problema dele. Ele continou com as dores.”
“Na verdade o cuidado médico precisa se dar de maneira pessoal, humanizada, com conversa, com informações, com uma boa comunicação. Eu vejo que isso também falta muito”, opina.
Autor