Arte, saúde e neurociência. Esses são os pilares da musicoterapia, especialidade utilizada para tratar pessoas com síndromes e transtornos, em especial o Transtorno do Especto Autista (TEA). O assunto ganhou luz em Catanduva, recentemente, diante da aprovação pela Câmara de projeto de lei que cria o Programa de Musicoterapia ‘Pedro Antônio Novelli’ para tratamento terapêutico de pessoas com TEA, a partir de proposta do vereador Gleison Begalli.
“É a única terapia que consegue atingir os dois hemisférios do cérebro. A melodia que o som traz, essa energia toda, libera os nossos hormônios, serotonina, dopamina e ocitocina, que são os hormônios da felicidade, alegria e prazer, e também da tristeza”, expõe a musicoterapeuta Daniela Pavão, que trabalha na área há 20 anos e defendeu o tema na sessão do Legislativo.
Segundo a profissional, a técnica proporciona inúmeros benefícios. “Ajuda na memória, atenção, concentração, comunicação verbal e não verbal, expressão corporal, aumenta a capacidade cardiorespiratória, pois normalmente o autista tem a imunidade baixa, estimula a expansão conigniva, afetiva e educacional - é necessário sempre estimular essa cognicação.”
Daniela frisa que a musicoterapia não é aula de música. “É ciência, é terapia séria que utiliza a música como ferramenta. Você usa a melodia, a harmonia, o som e o ritmo pra estimular, desenvolver e potencializar as habilidades tanto das pessoas autistas, quanto dos transtornos, que servem para redução da ansiedade, depressão e síndrome do pânico.”
O paciente da musicoterapia, diz Daniela Pavão, não precisa ter dom ou habilidades musicais. Mas o musicoterapeuta sim. Ele precisa ter conhecimento musical e dominar plenamente um instrumento. “O musicoterapeuta precisa saber de fisiologia, anatomia, neurociência, psicologia, além das práticas fundamentais para a clínica”, completa a especialista.
A musicoterapeuta ressalta que qualquer habilidade, estímulo ou resposta é celebrada. “Qualquer coisinha que essa criança consegue atingir é muito bom pra essa família, é vibrante pra essa criança. Porque ela sabe que ela tem dificuldade, a família também sabe, mas a criança sabe que ela pode ser musicocriativa, sabe que pode ser transformacional dentro da dificuldade dela, ser evolutiva e potente dentro do transtorno ou síndrome dela.”
DUAS MIL CRIANÇAS
Daniela Pavão diz que a rede municipal de ensino de Catanduva tem, hoje, cerca de 400 crianças autistas, fora os alunos da Apae, outros projetos e da rede privada.
A estimativa é que o número gire em torno de 1,8 mil e 2 mil. Ao somar pais, mães, avôs e avós, esse público poderá alcançar até 5 mil adultos tentando ajudar essas crianças.
“Essas crianças precisam de fonoaudiologia, terapia ocupacional, musicoterapia, isso é um custo caro e essas famílias não têm”, pondera.
O PROJETO
A proposta de criação do Programa de Musicoterapia ‘Pedro Antônio Novelli’ deve ser abraçada pela Prefeitura. “Catanduva pode trazer uma melhor qualidade de vida a todos esses munícipes. Apenas Cascavel e Goiânia têm leis semelhantes. O núcleo em Catanduva para tratamento de síndromes e transtornos seria histórico, uma referência estadual e nacional”, sugere Daniela.
HISTÓRIA
Os primeiros registros de musicoterapeutas aplicando suas técnicas para beneficiar pessoas com TEA são de 1940. Na década de 1950, foram fundadas duas importantes associações que auxiliaram difusão da prática clinica aplicada a pessoas com autismo: a National Association of Music Therapy (NAMT), nos EUA, e a British Society of Music Therapy, no Reino Unido.
Desde aquela época, mesmo antes da comprovação científica dos benefícios, os profissionais já aplicavam a musicoterapia de forma individual ou em grupos a fim de beneficiar os autistas na autoexpressão, socialização, reabilitação, melhoras fisiológicas e recreação.
Foto 2: ARQUIVO PESSOAL - Lívia com o filho Raul: ela utiliza a música para transmitir novos aprendizados, cores, números e letras
"Ela achou o tom em que o Raul consegue soltar algumas palavras"
O pequeno Raul, hoje com 3 anos e meio, morador de Novais, começou a participar das sessões de musicoterapia com apenas 1 ano e 10 meses. Depois de 2 meses de atividades, a musicoterapeuta Daniela Pavão confirmou o diagnóstico dele, já próximo do autismo severo.
“Até hoje ele é um autista não verbal, ele não fala, não conversa, porém, principalmente no piano, ela achou o tom em que o Raul consegue soltar algumas palavras. Ela já teve privilégios que eu não tive, como ouvir ele dizer o nome dele, e em quase todas as sessões no piano ele fala tia Dani”, relata a mãe Lívia de Almeida Silva.
Raul faz outros acompanhamentos com fonoaudióloga, terapeuta ocupacional, psicólogo, mas é com a musicoterapia que ele demonstra mais evolução.
A música inclusive abriu caminho para outros aprendizados. “Ela começou nas terapias e eu, em casa, auxiliando tudo através de música. Tem música para escovar os dentes, tomar banho, para as cores, letras e por mais que ele não fale, já conhece todas as cores e números”, comemora.
Lívia diz que foi possível identificar o hiperfoco e constatar que o filho é muito musical. “O hiperfoco dele é em cores, números e letras. Por exemplo, com o amarelo ele já solta a letra a... e espera a gente completar. Parece ser pequeno, mas pra gente isso é um ganho magnífico.”
APOIO AOS PAIS
Outro ponto citado por Lívia, relacionado à terapia, é o apoio oferecido a mães e pais. “Isso é muito importante, não só as crianças precisam de tratamento, mas os pais e cuidadores também, pois o mundo vira de cabeça para baixo e a gente precisa estar num nível controlado para conseguir ser uma segurança para eles, e a Daniela Pavão me ensinou isso, deu esse suporte, então faço questão de ajudar para que outras mães saibam sobre a musicoterapia.”
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