Por que ser enterrado com seus órgãos e privar tantas pessoas de continuarem vivendo? Esse é o principal questionamento da publicitária Natália Carvalho Esteves, que passou por um transplante de estômago aos 4 anos de idade, após luta contra o câncer. Hoje, aos 31, ela lembra com gratidão o processo que a permitiu voltar a viver normalmente como qualquer criança da sua idade.
“É tão óbvio. Por que você vai ser enterrado com tanta vida que os outros podem ter. Eu falo muito, para toda a minha família, de mim você não deixa nada. Pode me enterrar com o caixão fechado, doa toda a minha pele, doa tudo, o que você puder transformar a sua vida em muitas mais vidas vai em frente”, diz.
Os pais de Natália descobriram a doença quando ela tinha um ano de idade. Certo dia, ela acordou com uma espécie de caroço no estômago. Os médicos de Catanduva diagnosticaram câncer e aí começou sua batalha. Em Campinas, passou por quimioterapia, além de diversas cirurgias. Sua história ganharia novos rumos a partir da constatação de um dos médicos, que pediu que sua mãe a levasse embora para morrer em casa. Para ele, não havia mais chances de cura.
“A minha mãe não parava de chorar. E aí passou aqueles caras que antigamente te dava um papelzinho, com um bilhetinho, e ele falou ‘mãe, não chora, sua filha vai ter muito sucesso’. E eu tirei um papelzinho, que eu não me lembro exatamente do que estava escrito, mas era alguma coisa ligada a ‘ela tem muitos anos aí pela frente, vai ter sucesso’. Nisso veio uma luz na minha mãe, que falou que iria para São Paulo. Ela então foi para São Paulo, pediu ajuda e aí eu fui parar nas mãos do Dr. Paulo Chapchap, do hospital Sírio Libanês. Ali eu continuei fazendo algumas cirurgias para raspagem e até que chegou à conclusão que era necessário o transplante e eu entrei na fila de órgãos”, relata.
O tumor já estava em estágio avançado e Natália estava cansada. Foi então que a família se mobilizou para encontrar entre eles quem poderia doar. Apenas a mãe e uma tia eram compatíveis. Com a cirurgia marcada para 11 de novembro de 1996, tudo estava pronto. O que eles não esperavam era que dois dias antes a morte de um rapaz vítima de acidente mudaria a história da publicitária.
“Poucos dias antes, no dia 9, o doutor Paulo ligou lá de São Paulo e disse pra minha mãe que o órgão tinha chegado. Só que ele tinha até duas ou três horas de vida. Minha mãe estava com tudo pronto, a malinha tipo de maternidade, eles entraram em um carro e meu pai voou. Em duas horas e meia eu estava dentro do centro cirúrgico para operar. Meu transplante teve 12 ou 14 horas de duração. No meio do transplante, teve uma complicação, que precisou tirar meu coração pra bater numa máquina, porque eu não estava aguentando. Mas foi tudo ótimo, foi lindo. Eu saí da cirurgia pedindo Mc Donalds pra minha mãe”, conta.
Doações aumentaram em São Paulo
O número de doadores de órgãos aumentou em mais de 10% neste ano em São Paulo, na comparação com o ano passado. Os dados são da Central de Transplantes da Secretaria de Estado da Saúde. O motivo, segundo a pasta, é atribuído à campanha de incentivo às doações, impulsionada por casos de grande repercussão na mídia, como do apresentador Fausto Silva.
Nos hospitais Padre Albino e Emílio Carlos, em Catanduva, foram registrados nove protocolos com captação de múltiplos órgãos de janeiro ao início de setembro, em que foram doados dois corações, um coração para válvulas cardíacas, dois pulmões, seis fígados, oito rins, oito córneas, um pâncreas e uma doação de ossos. Somam-se ainda 59 doações específicas de córneas nos dois hospitais no mesmo período.
A doação de órgãos deve ser feita com a concordância de cada pessoa e quem quiser ser doador, basta comunicar a família sobre esse desejo. No caso dos falecidos, a autorização para doação deve ser dada por familiares, com até o segundo grau de parentesco.
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