Você ‘ganha’ dinheiro?
O idioma expressa a psicologia do povo que o fala. O nosso português brasileiro, ou à brasileira, define bem o que vai dentro da cachola nacional. Por exemplo: a forma como lidamos com o dinheiro. Já parou para pensar o porquê de usarmos o verbo “ganhar” [dinheiro] ao invés do verbo “fazer” [dinheiro], como dizem os americanos?
A não ser que você seja herdeiro, inválido, carente ou uma criança/adolescente com mesada, etc, você não ganha dinheiro. Você labuta ferrenhamente por cada centavo. Você devolve ao planeta litros de suor por cada boleto pago. Não é assim? Empenhamos muito tempo e muita energia para fazermos nosso pão, o pão que Deus amassou. Aliás, olha aqui outra expressão problemática: “ganha-pão”. Só o filho do padeiro ganha pão...
Então, por que dizer que é ganhado se é conquistado, se é feito com sua vontade e com seu despertador berrando logo cedo? No inconsciente coletivo do latino (nós somos um povo latino), habita o conceito de sorte. A sorte é o acaso deificado, distribuindo favores e benesses. Mas não apenas a sorte [de]anima o latino, o brasileiro então, no seu relacionamento conturbado com o “vil metal”: apesar de muito existencialista, o brasileiro detém uma pulsão um tanto quanto irada contra o dinheiro, ou seja, grana é mal-vista.
Misto de má interpretação do Evangelho (com seus nobres ideais de pobreza espiritual, igualdade, humildade, caridade, etc) com visões ideológicas mais à esquerda no espectro político, o brasileiro médio, em regra, é financeiramente um Frankenstein que quer ter muito dinheiro ao mesmo tempo que não gosta de quem tem muito dinheiro e não se empenha o suficiente para ter muito dinheiro. Então, bem ou mal, nos conformamos à uma espécie de “mediocridade dourada” compulsória, na qual o dinheiro acaba sendo um tipo de “maná” coletivamente desejadíssimo, mas reduzido ao holerite e à formalidade do emprego formal. Nesta lógica, o patrão (seja ele privado ou governamental) nos dá o dinheiro; afinal, não se trata de uma única soma e parcela que chega geralmente nos dias 5 ou 10, num passe de mágica bancário? O salário no Brasil cheira à concessão paternal, à dádiva estatal, à privilégio espiritual.
Más idéias conduzem à más ações e... omissões. A grande omissão na cultura financeira nacional é o pouco apresso pelo empreendedorismo. Por que? Porquê o empreendedorismo é uma saga individual. E nós não gostamos de quem se destaca: preferimos [ser] a massa amorfa, niveladora. Falta-nos empreendedorismo porquê nos falta amor pela liberdade individual. Falta-nos aquele empreendedorismo hardcore ancestral, que atravessava oceanos para, sim!, lucrar -- individualmente, lucrar. Mas nós, brasileiros, achamos o lucro uma coisa horrível, imoral, repulsiva. Então, preferimos dizer que ganhamos a dizer que fomos lá e fizemos...
Ao ganhar, o brasileiro trabalha muito e sem vontade. Ao ganhar, o brasileiro ganha pouco e se desespera. Por isto, é necessário transformar pensamento e ação e tomar a própria vida pelas rédeas. Quando o brasileiro se sentir (logo, quando ele for) mais responsável por quanto tem na carteira e na geladeira, mais ela fará dinheiro e, como consequência, se emancipará do Estado ladrão que impõe impostos e semeia semânticas.
Você não ganha dinheiro. Você faz dinheiro. Você não ganha a liberdade. Você é livre.
Autor