Um cidadão pleno

A concepção de democracia e virtude cívica em Aristóteles oferece uma análise profunda e relevante sobre a participação política polis grega e seus reflexos nas democracias contemporâneas. Para Aristóteles, a democracia não é apenas um sistema de governo, mas um espaço fundamental para o desenvolvimento da virtude cívica e do bem-estar coletivo.

Aristóteles, em sua obra "Política", defende que a polis (cidade-estado) existe para proporcionar aos seus cidadãos uma vida boa e virtuosa. A participação política ativa é um meio essencial para alcançar essa finalidade. Diferente de outras formas de governo, como a oligarquia ou a tirania, onde o poder é concentrado nas mãos de poucos, a democracia aristotélica promove a igualdade e a oportunidade para que todos os cidadãos participem das decisões políticas. 

No pensamento aristotélico, a virtude cívica é intrinsecamente ligada à noção de cidadania. Para ele, ser um cidadão pleno não se resume a gozar dos direitos políticos, mas também a cumprir deveres cívicos e participar ativamente na vida pública. A prática da cidadania envolve deliberação, decisão e ação conjunta, aspectos que são fundamentais para a construção de um governo justo e eficiente.

Aristóteles distingue a democracia pela prática da isonomia e da isegoria, princípios que garantem igualdade perante a lei e igualdade de participação nas assembleias políticas, respectivamente. Esses princípios são cruciais para a formação de uma sociedade onde a justiça e a virtude prevalecem. A participação política ativa permite que os cidadãos desenvolvam suas capacidades racionais e morais, contribuindo para o bem comum e para a estabilidade política. 

Na democracia, a virtude cívica se manifesta através da prudência, justiça e coragem. A prudência permite que os cidadãos façam julgamentos sensatos sobre questões públicas; a justiça assegura que as leis sejam aplicadas de forma equitativa; e a coragem habilita os indivíduos a defenderem os interesses da polis contra ameaças internas e externas. Dessa forma, a prática democrática não só promove a realização pessoal, mas também fortalece a comunidade como um todo.

A relevância do pensamento aristotélico sobre democracia e virtude cívica transcende o contexto histórico da Grécia Antiga e encontra eco nas democracias modernas. A participação ativa dos cidadãos continua sendo vital para a saúde e a legitimidade das instituições democráticas. Em um cenário onde a apatia política e a desconfiança nas instituições crescem, a valorização da virtude cívica e do engajamento político é essencial para a revitalização democrática.

A aplicação dos conceitos aristotélicos no contexto contemporâneo implica na promoção de uma educação política que fomente a consciência cívica e a responsabilidade social. As instituições educacionais e os meios de comunicação têm um papel crucial na formação de cidadãos informados e ativos, capazes de contribuir para o debate público e para a tomada de decisões políticas.

Ademais, a participação política deve ser inclusiva, garantindo que todas as vozes, especialmente as dos grupos historicamente marginalizados, sejam ouvidas e consideradas. A diversidade de perspectivas enriquece o processo deliberativo e fortalece a democracia, tornando-a mais representativa e justa. 

Autor

Jaquelini Cristina de Godeis
Advogada. Ex-Assistente Especial da Assembleia Legislativa de São Paulo. Especializada em Direito de Família e Sucessões. Pós-Graduanda em Direito Contratual pela PUC-SP e Mestranda em Direito Público.