Terra à vista: Adolescência

Adolescente vem do verbo adolescere que em latim significa crescer. No particípio passado do mesmo verbo se originou a palavra adulto, termo equivalente a crescente e crescido. A palavra adolescente é cerca de cem anos mais antiga que a palavra adulto, e pensar nela como uma fase, só fez sentido após a conceituação de sujeito que possibilitou caracterizá-lo como adulto. Antes de tal nomeação éramos todos crescentes.

Trata-se de uma fase entendida como passagem que liga nada a lugar nenhum, mas que possibilita novas combinações e composições que levam a mecanismos complexos e exigência interna de independência, uma fase que é vivida num tempo de individuação e consolidação de múltiplos fatores.

O adolescente se rebela contra o curso de seu destino e confronta através de atos, palavras, queixas e transgressões a herança simbólica que fixa a realização de seu ser no mundo, onde a vivência do desamparo é sentida como uma condição que norteia o espaço narrativo que tende a se abrir à medida que ele se distancia da família e se autoriza a transitar espaços públicos, numa passagem que faz nascer um sujeito de direitos e deveres.

Na contemporaneidade, os ritos de passagem estão diluídos entre tarefas que não estão somente ligados a capacidade reprodutora e idade cronológica. Ter uma profissão é uma etapa importante para ter independência, sendo necessário passar no vestibular, fazer graduação, mestrado, doutorado, pós-doc, assim como estabilizar no emprego ou ser aprovado num concurso.

Todas estas exigências de sobrevivência acabam contribuindo para que o adolescente consiga atingir sua independência num tempo maior do que há décadas atrás, muitas vezes mantendo-se na casa dos pais, realidade gerada pela dificuldade em conseguir autonomia financeira, tendo que batalhar muito para conquistar sua independência.

Eles entram na vida adulta ainda morando na casa dos pais, e normalmente casam mais tarde, e se casam mais cedo, quase sempre é sem autonomia, tendo uma falsa impressão de independência, e se vão morar sozinhos, continuam sendo sustentados pelos pais.

Todas as mudanças que ocorrem na adolescência atreladas a dificuldade de autonomia financeira que enfrentam na atualidade colaboram para que o período seja vivido de maneira individual, de acordo com a posição social, grupo familiar ou religioso.

A maneira de lidar com estas questões em nossa sociedade tem se transformado cada vez mais, mediado também pela garantia no mercado de trabalho.

Este período que marca tantas transformações corporais, de carreira, etc., é um momento extremamente importante, e quando vivido de maneira plena, colabora para que as conquistas da vida adulta aconteçam por uma sucessão de investimentos individuais que não estão determinados somente pelo tempo, mas por conquistas duradouras realizadas de maneira adulta. É uma fase de construção social no qual o indivíduo se desenvolve para ocupar um cargo na sociedade, e dessa maneira, aprende a ser independente pela conquista da produtividade por conseguir ser autônomo.

Ser adulto não é morar sozinho, casar e ter filhos. Ser adulto é ter autonomia financeira e maturidade emocional.

Na atualidade, estamos diante de um mal-estar na civilização tentando aprender e entender as mudanças sociais, estruturais e contemporâneas, necessitando cada vez mais discutir estas urgências. Do contrário, quem continua pagando a conta são os jovens.

Texto escrito ao som da música “Stop” de Spice Girls.

Autor

Claudia Zogheib
Psicóloga clínica, psicanalista, especialista pela USP, atende presencialmente e online. Redes sociais e sites: @claudiazogheib, @augurihumanamente, @cinemaeartenodivã, www.claudiazogheib.com.br e www.augurihumanamente.com.br