Surto de Tifo em Catanduva

Uma das doenças mais comuns encontradas em países subdesenvolvidos é a febre tifóide, causada pela bactéria Salmonela Typhi, também conhecida como bacilo de Elberth, assim chamado em homenagem a Karl Joseph Elberth, bacteriologista, que o descreveu pela primeira vez, em 1880.

Mesmo sendo característica de países onde as infraestruturas não são bem edificadas, a tifóide já vitimou vários personagens históricos famosos, como o compositor Franz Schubert, o consorte da Rainha Vitória do Reino Unido, Alberto de Saxe-Coburgo-Gota, além de Péricles, grande governante da cidade de Atenas e da princesa do Brasil, dona Leopoldina de Bragança e Bourbon.

A transmissão do vírus se dá através da ingestão de alimentos ou água contaminada, além de contatos diretos com os portadores, como um simples beijo, por exemplo. Muitos casos são devidos à preparação não higiênica da comida, em que o indivíduo portador suja os dedos com seus próprios detritos fecais e não lava as mãos antes de preparar os alimentos.

Os primeiros sintomas, aumentando ao longo da primeira semana, são febre alta, dores de cabeça, fadiga, bradicardia e agitação durante o sono, podendo aparecer manchas na pele.

Se não for tratada, a febre tifóide pode complicar-se em hemorragia e até em perfuração intestinal, podendo levar o indivíduo à morte, chegando a taxa de 25% nos casos não tratados.

No quesito prevenção, além da vacinação, é necessário tratar a água e os alimentos, controlar o lixo, observar as boas condições de higiene e a boa alimentação.

Em 1967, Catanduva passou sérios problemas com a febre tifóide em sua população.

Desde aquela época, o sistema de saúde estadual não atendia os requisitos necessários para um bom tratamento de qualidade e atendimento decente para a população. Leis arcaicas, código sanitário de 1918, leis e decretos que não mais atendia às novas exigências que se apresentava dentro da sociedade, ainda mais o maior Estado da Federação.

E não era apenas na cidade de São Paulo que o serviço era precário: em quase todas as cidades do Estado a situação era péssima, onde aqui mesmo em Catanduva, a entidade funcionou nos mais diversos locais que para tudo poderia servir, menos para um Centro de Saúde.

E dentro de todo esse contexto de precariedade da saúde pública, Catanduva acabou sendo agraciada com uma onda de tifo que assolou e assustou toda a população.

Vale destacar que na época vários eram os casos de tifo noticiados em jornais em outras cidades. Catanduva foi apenas um “bode expiatório” que pagou caro às deficiências de uma infra-estrutura que deixava muito a desejar.

Oito dias de angústia

Os boatos cresciam em Catanduva a respeito da persistente febre, nos primeiros dias de janeiro de 1967.

Logo que chegou no conhecimento do Centro de Saúde local, este se pôs em campo imediatamente e seu médico-chefe, Dr. Waldir Corradi, juntamente com os funcionários daquela unidade de saúde, estabeleceram uma pesquisa para saber o que estava provocando aquilo.

No dia 14, ficou comprovada a existência de vários casos de paratifo e alguns de tifo, iniciando a vacinação no Centro de Saúde Local, realizando um total de três mil aplicações em um único dia. Foi nesse dia também que se dá o primeiro óbito local, o Sr. Antônio Carlos Santos.

No dia 15, por meio de um telefonema do vereador Eder Pedro Pelizzon, o deputado Orlando Zancaner é colocado a par da situação, prometendo algumas providências junto à Secretaria de Saúde, conseguindo uma grande quantidade de vacinas no dia seguinte.

Chegando em Catanduva no dia 17, o Delegado Regional da Saúde, a fim de inteirar-se da grave situação que assolava a cidade. Além da presença do delegado, nesse dia também chegava na cidade a equipe de especialistas do Instituto Butantã, onde com apoio de aparelhos mecânicos foram vacinadas sete mil pessoas em poucas horas.

Paralelamente à essas atividades, o grupo do Instituto Adolfo Lutz, de São José do Rio Preto iniciam as pesquisas visando a descoberta do surto epidemiológico, já agora diagnosticado.

No dia 18, continuou a todo o vapor a campanha de vacinação da população, chegando ao número de vinte mil pessoas vacinadas somente neste dia. A população começava a mostrar sinais de pânico e preocupação, onde foi necessário o prefeito da época, José Antônio Borelli, juntamente com os meios de comunicação, tranquilizarem a população.

No decorrer do outro dia, mais trinta mil pessoas são vacinadas só no Centro de Saúde, pois as farmácias locais começaram a auxiliar no trabalho. A situação nesta altura começa a ficar controlada.

No dia 20, continua a vacinação, apesar da situação estar plenamente dominada e a população se encontrava tranquilizada.

Para finalizar, no dia 21 a Delegacia Regional de Araraquara e o Centro de Saúde local assinam por extenso um comunicado, dando à população de Catanduva plenos esclarecimentos sobre a situação do surto epidêmico, dizendo sobre suas reais proporções e dando o mesmo como absolutamente controlado.

O foco

Apesar de todo o alarde ocorrido na cidade, ficou registrado que a epidemia atingiu apenas dezessete pessoas com tifo, e alguns casos com paratifo.

De acordo com o relatório oficial, o surto se originou por causa de uma ruptura de uma rede de esgoto, o que provocou a contaminação de uma parte baixa da cidade.

Além disso, o rio São Domingos oferecia certa preocupação, além de pequeno perigo, pois alguns trechos de sua zona ribeirinha encontrava-se em um estado lastimável, necessitando de uma completa drenagem.

O próprio Mercado Municipal, por sua localização muito próxima ao rio, não oferecia as perfeitas condições de higiene que se esperava alcançar.

Por fim, todo o alvoroço estava totalmente controlado e a população descansava em tranquilidade.

 

Foto: Na época do surto de tifo em Catanduva, Catanduva era administrada pelo prefeito José Antonio Borelli (o 2 da esquerda para a direita), que precisou acalmar a população pelo rádio. Nesta foto, datada de 1956, da esquerda para a direita: Orlando Zancaner, José Antonio Borelli, Carlos Machado e Antonio Mastrocola.

Autor

Thiago Baccanelli
Professor de História e colunista de O Regional.