Sobre dias e afetos

Sabe quando você olha para certo dia da semana e, por algum descompasso da rotina, ele parece ser outro? Quando é quinta-feira, mas porque é feriado ou porque você ficou em casa, você sente o dia como sendo um sábado, por exemplo?

Sabe aquela sensação de associar determinada inclinação da luz às tantas horas da tarde de tal dia e uma certa aura mista (e mística?) de “temperatura-altura-e-pressão” a um jeito específico de um outro dia de outra estação? Sabe quando você sente cada dia da semana de um jeito e, intuitivamente, atribui suas características específicas a outros dias?

Penso que quanto ao coração as coisas também sejam assim. Nós que medimos mais o tempo pelas aparências relativas do peito que pelo calendário que fala ao cérebro, constantemente projetamos o que está cá do lado de dentro por sobre o que está ali do lado de fora. E nos enganamos. E interpretamos mal.

Assim como é preciso olhar diariamente para aquilo que nos diz o calendário, a fim de sabermos aquilo que a data programa para a rotina e não sermos enganados por um domingo interno que é sexta-feira externa, é também preciso voltar os olhos para as coisas tais quais elas são no mundo dos olhares, sob pena de perder-se na sensação de que uma cortesia pega de relance na íris é ternura romântica, de que certo brilho que outrora tivemos para com um ser amado se repete em outro que não nos ama, de que o dantes vivenciado aqui por mais que na aparência se pareça com o vivido ali nada é senão uma sensação, uma dissociação entre a prática que os olhos vêem e a teoria que os olhos já enxergaram.

Alguém, acho que um poeta italiano (não lembro quem), disse isto: “Meglio aggiungere vita ai giorni che non giorni alla vita.” / “Melhor acrescentar vida aos dias do que dias à vida.” Quanto ao amor, que se diga o mesmo: melhor acrescentar amor à vida do que vida ao amor. “O acessório segue o principal”, dizemos no Direito.

Olhe para as coisas sem carências, sem pulsões de querências e sofrências, sem pespegar às aparências outras essências que não lhes pertencem, sem acrescentar uma existência à coisa quando é a coisa que deve acrescentar à existência. É sábado do lado de fora? Que seja sábado do lado de dentro. É amor do lado de dentro? Que seja amor do lado de fora.

Autor

Dayher Giménez
Advogado e Professor