Redes sociais: a linha tênue da saúde mental

Sabemos o quanto as redes sociais são amplificadores para denunciar os sentimentos existentes dentro de nós, e o quanto isto pode ser danoso para quem sofre de solidão, depressão, ansiedade entre outros transtornos.

Quando o assunto é saúde mental, o mal uso das redes sociais aumentam os riscos de agravamento das doenças ligadas à imagem e baixa-estima, podendo se tornar uma guerra secreta ligada a quantas curtidas recebemos, quem seguimos, e quais são os reais motivos que sustentam estas decisões.

Para quem vive uma vida baseada neste tipo de superficialidade, este vício torna-se uma denúncia de quem se é, e o meio que se utiliza para manter esta dinâmica mostra o sentido que utilizamos para crescermos como indivíduos vazios.

Não é difícil notar quem usa suas redes sociais para manter seu “status quo”, quem usa como forma de engajamento profissional, como união familiar e com os amigos, que de forma estampada e coerentemente vibra pelas conquistas do outro numa relação de mão dupla.

Uma vida criada para interesses simplórios nas redes sociais acaba afetando a vida pessoal off-line, e o inverso é igualmente real: deixa de ser autêntico e acaba por denunciar as escolhas que sustentam seu mundo interno.

O que realmente acontece nunca é o que se posta, e o excesso de uma vida perfeita acaba por denunciar uma vida vazia e sem sentido, mostrando o tremendo buraco existencial que vivemos, num mal uso que cobra um preço alto ligado à negligência da vida real.

Vida perfeita não existe: o que existe é a criação de uma rede social perfeita construída para mascarar ou dissimular interesses vazios: fulano é popular, preciso ser amigo dele, vai me convidar para aquela festa, ou, me distancio daquela pessoa porque não quero que ela me visite ou que ela vá no meu aniversário, casamento ou formatura, ou porque para ser amigo de tal pessoa preciso me distanciar daquela outra, enfim, mudei de interesses e descarto aquele amigo ou parente, por não se encaixar mais nos meus interesses.

A saúde mental padece, e ficamos entre o imaginário e o real sem saber quem de fato somos e onde vamos parar.

Não deveríamos pretender estar em uma competição dentro das redes sociais. Se estamos, deveríamos nos perguntar o quanto disto levamos para a vida pessoal, e o quanto este comportamento denuncia quais são os verdadeiros objetivos que sustentam nossas vidas.

A vida real pede coerência, portanto, as redes sociais deveriam ser uma extensão mínima e condensada disto. Do contrário, podemos nos perder imaginando sermos importante, e padecemos construindo uma vida sem sentido. Nos enganamos numa fantasia onipotente só porque “escolhemos”, muitas vezes a serviço de uma instrumentalização precária e vazia.

Uma expectativa engajada com a saúde mental deveria preocupar-se em usar as redes sociais para enriquecer memórias, entrelaçando com nossas relações (familiares, de amizade e vida profissional), sobretudo tendo coerência na hora que nos comunicamos pelos meios que hoje estão à nossa disposição: responder com consideração, agradecer, dar parabéns, ter o mínimo do senso de se colocar no lugar do outro, tratando-o como gostaríamos de sermos tratados, ou seja, com consideração e sem esquecer de sua importância em nossa trajetória de vida.

Às vezes, além da saúde mental, o que falta mesmo é a boa e velha educação.

Música: “Guilty” com Barbra Streisand e Barry Gibb.

Autor

Claudia Zogheib
Psicóloga clínica, psicanalista, especialista pela USP, atende presencialmente e online. Redes sociais e sites: @claudiazogheib, @augurihumanamente, @cinemaeartenodivã, www.claudiazogheib.com.br e www.augurihumanamente.com.br | Foto: Edgar Maluf @edgar.maluf ©