PENEIRA FINA – 16.12.22

Caso da usina de oxigênio parece realismo fantástico

As pessoas mais jovens talvez não conheçam um autor de novelas, que também foi dramaturgo e escritor, chamado Dias Gomes. Ele escreveu novelas de imenso sucesso nos anos 70 e 80, que eram marcadas pelo chamado realismo fantástico. Ou seja, mesclava elementos da vida real, como políticos corruptos, e da fantasia, como lobisomem, mulher que explodia de tanto comer e homem que voava. Em nosso mundo, por vezes acabamos nos deparando com fatos que lembram muito as situações brotadas na mente sagaz do escritor. O caso da usina de oxigênio da Unidade de Pronto Atendimento 24 horas (UPA 24h) de Catanduva, objeto da matéria publicada na edição de ontem de O Regional, é uma delas.

Recordar é viver

Um povo sem memória está fadado à eterna opressão, já dizia um pensador (cujo nome não recordamos no momento). Por outro lado, lembramo-nos bem da inauguração da usina de oxigênio da UPA 24h, que, por acaso, ocorreu mais ou menos numa época dessa do ano. Então, nada melhor do que relembrar detalhes desse fatídico evento.

Choro e oração

Quem escreve estas singelas linhas teve a oportunidade de acompanhar de perto a cerimônia de inauguração da usina de oxigênio, que contou com muito choro, discursos com vozes embargadas e até oração e bênção solene proferida pelo prefeito Padre Osvaldo de Oliveira Rosa (PSDB). Olhando de longe, pode até parecer exagero. A verdade, porém, é que acabavamos de sair da fase mais crítica da pandemia da Covid-19, que ocasionou centenas de mortes na região e colapsou hospitais e serviços de saúde, como a própria UPA. A falta de oxigênio para intubar (ou entubar, como preferirem os gramáticos de plantão) era um dos dramas enfrentados na época. Obviamente que a nova estrutura tinha de ser comemorada.

Um mês

A informação de que a usina funcionou por apenas um mês e deixou de ser usada no fim de janeiro deste ano representa um acinte para com a população. Foram gastos R$ 1,1 milhão na instalação dessa estrutura, sendo R$ 100 mil do município e R$ 1 milhão da Petrobrás.

Prefere comprar de fora

Na resposta enviada ao nosso editor Guilherme Gandini, autor da matéria, a prefeitura alega que opta pela compra de oxigênio encapsulado, por ser de fácil manejo. Esse discurso atual é no mínimo curioso, pois, quando da inauguração da usina de oxigênio, a conversa era outra.

Discurso mudou

A fase mais crítica da pandemia da Covid-19 em Catanduva foi na metade do ano, levando a prefeitura a decretar lockdown, no mês de junho. Depois disso, o número de casos passou a cair, permitindo até a flexibilização de muitas regras sanitárias. Àquela altura, a demanda por oxigênio para tratar pacientes com quadros graves dessa doença já havia caído consideravelmente. A pergunta feita às autoridades do município, na época, era se o serviço teria serventia, depois de passado o pico da pandemia na cidade e no país. A resposta foi de que, dentre outras coisas, a nova usina serviria para suprir a demanda local em tempo normal e também garantir o abastecimento em um eventual momento crítico. Pelo visto, algo mudou, levando o governo municipal a deixar sem uso uma estrutura milionária.

Licitação

Por falar nesse assunto, há alguns dias foi aberta uma licitação da Secretaria Municipal de Saúde para locação de um concentrador de oxigênio. O custo estimado que o governo de Padre Osvaldo pretende pagar pelo aluguel do aparelho é de R$ 114 mil.

Irritou-se

Um fato marcante, ocorrido na inauguração da usina de oxigênio foi a irritação de Padre Osvaldo com o repórter de O Regional, que cobria o evento. Ele perdeu a paciência quando o profissional tentou entrevistá-lo, alegando que o jornal “distorceria tudo”. A usina desativada é testemunha desse fato.

Autor

Da Redação
Direto da redação do Jornal O Regional.