Palco iluminado

A carreira artística é muito ingrata no Brasil. Poucos artistas são alçados ao estrelato. Este, via de regra, é efêmero para a grande maioria. Carreiras duradouras e com sucesso constante são exceção no meio. Eu costumo dividir a origem do sucesso em duas variantes: a capacidade técnica e o aleatório. 

Da capacidade técnica fazem parte uma série de requisitos. Antes de mais nada, tem que incorporar a profissão. Tem que respirar, comer e beber música. Quanto mais, melhor! Por mais que a pessoa tenha talento, ou “jeito para a coisa”, tem que viver a música. Tem que ter foco total. E saber que o glamour na profissão é atípico e ilusório. Aliás, não sei bem o que significa glamour em qualquer ambiente de trabalho.

O que conheço é o famoso “sangue, suor e lágrimas”. São horas estudando música, dedicando-se a um instrumento e fazendo aulas de canto. Apresentar-se nos shows de forma profissional, pontualmente, com bom repertório. Aprender a tocar muitas músicas. Outro aspecto importante é aprender na prática. Tocar o tempo todo. Em tudo o que for lugar, na escola, em festas, em reuniões de amigos. Conviver e interagir com outros músicos. Frequentar os shows dos colegas. Ver e aprender com a performance de outros artistas. Assistir videoclipes de artistas do mesmo gênero. Conhecer a fundo os instrumentos de trabalho tais como instrumentos musicais, microfones, caixas de som, mesas de som. Ensaiar muito! Exaustivamente. Conhecer os detalhes e as nuances de cada música. Compor bastante, ter canções próprias. 

É saber que ninguém começa nos palcos do Rock in Rio nem em um especial de fim de ano de alguma emissora de TV. Não vai gravar um vídeo e ele viralizar na internet, mesmo porque isso não tem receita. Ninguém de qualidade surge do nada. Todos passam pelo sacrifício de tocar em tudo quanto é lugar e situação. 

Infelizmente, como tudo na vida, existe o fator aleatório. Cito o caso de um jovem caminhoneiro, um indivíduo branco que morava num bairro majoritariamente negro, que tocava violão e cantava desde os dez anos de idade, ouvia bastante música e observava bastante os cantores do bairro. Quis gravar um LP para presentear sua mãe. O executivo da gravadora anotou seu nome. Elvis Presley. O resto é história! 

Vinicius de Moraes precisava de um pianista para musicar seu filme 'Orfeu Negro'. Os pianistas preferidos por ele estavam impossibilitados de assumir o compromisso. Foi apresentado a um pianista que tocava em boates de Copacabana. Seu nome? Tom Jobim. Assim nasceu uma das parcerias musicais mais importantes da nossa história. 

Num país que historicamente dá pouco valor para as artes e para a cultura, quem persistir neste caminho deverá conscientizar-se das dificuldades quase insuperáveis da profissão. Esta é a vida de artista! 

Autor

Toufic Anbar Neto
Médico, cirurgião geral, diretor da Faceres. Membro da Academia Rio-pretense de Letras e Cultura. É articulista de O Regional.