Oração de Gratidão

Eu estava escrevendo este artigo, antes esboçado em algumas frases anotadas no meu grupo de um só no WhatsApp (imagino que todos vocês já tenham descoberto esta facilidade), quando percebi que ele estava tomando a forma de uma oração. Uma forma que lhe deu, de fato, muito maior beleza e significação. Ficou assim:

Senhor, eu te dou graças por ter acordado. Estou vivo enquanto milhares não terminaram a noite. Estou vivo, seja como for, e pronto para, se me concederes, terminar bem as horas que faltam para completar este dia e, então, chegar novamente ao amanhã, quanto hoje será ontem.

Senhor, eu te dou graças pelo último copo d’água que bebi. Há bilhões de seres humanos cujos corpos mais suam do que se hidratam. Há mais poros do que poços e, ainda que eu reclame da quantidade de cloro ou dos preços cobrados pela autarquia municipal, tenho água em abundância, um dilúvio particular saindo das minhas torneiras.

Senhor, eu te dou graças pelo pão nosso. Sim, eu comi a pizza de ontem no café da manhã. Tu bem sabes que raramente como pão, porque são calorias sem grande valor nutricional. Além do que, posso me dar ao luxo de fazer jejum intermitente. E quanto aqueles que jejuam compulsoriamente, obrigados à ronquidão dolorosa de um estômago vazio por dias e dias?

Senhor, eu te dou graças por ter o pouco que tenho em honestidade e por de nada ter falta. Quão terrível seria não ter nada e estar, como milhões de brasileiros, transformados em meras estatísticas na disputa político-ideológica. Quão mais terrível seria ter tudo, do bom e do melhor da terra, e ter perdido a alma para o deus cifrão? Tu ainda preferes o Lázaro leproso ao rico presunçoso.

Senhor, eu te dou graças por ter a quem amar e por ser amado -- uma família. Há solidões deliciosas, que nós escolhemos e abraçamos por seu poder curador e reconciliador com nosso eu. Mas há solidões de orfandade, de desamparo, de abandono e de rejeição. Que eu possa ser familiar de todos aqueles que encontrar pelo caminho.

Senhor, eu te dou graças por ter o discernimento de que nenhum dos bens que referi até agora serem frutos de quaisquer méritos meus. Eu sei que não sou nada. Antes, todas as coisas são graças tuas. Graças que distribuis a cada um dos homens e mulheres que criaste de acordo com sua muito individual necessidade salvífica. Tudo é graça, inclusive e sobretudo a “desgraça”, que muitas vezes reputamos por sofrimento irracional, por dor sem sentido; mas que, na verdade, é o teu mais puro amor incompreendido e pedagógico.

Senhor, eu te dou graças!

Autor

Dayher Giménez
Advogado e Professor