‘O que se vê e o que se sente’

 

Segundo a lenda contada pelo historiador romano Plínio, o “Velho”, a pintura originou-se quando um casal apaixonado precisou se separar e a esposa gravou com carvão o perfil do seu amado, para não esquecê-lo. A cena, lindamente perpetuada pelo pintor Jean-Baptiste Regnault, nos incita a refletir sobre a importância da Arte em nossas vidas; o quanto a experiência artística fixa em nossas memórias as lembranças e as sensações do que vivenciamos e a sua conexão com a própria vida. 

Registrar momentos faz parte da história humana desde os primórdios, nas cavernas, e hoje é amplamente difundido através da tecnologia, nas redes sociais, com selfies e stories. Por que fotografamos? Para guardar o momento efêmero que pode não se repetir e queremos eternizar. Às vezes, é só pelo momento, outras, para a vida. Podemos fazê-lo por nós ou apenas para mostrar aos outros. 

Mas o que vemos, sentimos? 

Ao longo das décadas, em contato com o público, vimos a mudança visível das plateias.  A observação atenta, a troca de emoções, a conexão artista/público aos poucos deixou de ser primordial para parte da plateia que vê, mas não sente, porque precisa registrar o momento e dividir em suas redes sociais, com seus seguidores, em detrimento da emoção única, que não volta mais.  

Evidentemente que as expressões culturais são diferentes: teatro, show, exposições, etc. O registro breve daquele momento pode ser importante para guardamos e compartilharmos, no entanto, o que fica e o que se sente, realmente, só a alma eterniza.  

Em 2016, o roqueiro Mick Jagger reclamou do público que foi assistir aos shows do Rolling Stones, em São Paulo, porque as pessoas não desgrudavam do celular: “parece que o público assiste pelo telefone. É a cidade do telefone", comentou.  

Se é muito comum nos dias hoje, revelam uma superficialidade de uma geração que tem dificuldade em se concentrar e focar o momento. Preferimos fotografar ou filmar ao invés de sentir, de curtir aquele instante tão único, tão passageiro, tão marcante. 

Sinal dos tempos. Você revê fotos, mas não lembra do que viveu. 

COMEÇANDO PELOS BEBÊS 

Coincidentemente, a Cia da Casa Amarela iniciou em 2016 sua pesquisa na produção de teatro para bebês, de 0 a 4 anos. Essa tendência artística teve origem na Europa, no século passado e ganha força com diversos criadores, dramaturgos e companhias teatrais em todo o mundo.

No Brasil esse movimento teatral é mais recente e a Cia da Casa Amarela tem mergulhado nesse processo tão fundamental de despertar a sensibilidade estética, artística e sensorial dos pequenos, visando uma imersão natural na Arte para que faça, naturalmente, parte de suas vidas, ampliando a visão e sentimentos.  

Ou seja, o que vê e o sente.  

 

Autor

Drika Vieira e Carlinhos Rodrigues
Atores profissionais, dramaturgos, diretores, produtores de teatro e audiovisual, criadores da Cia da Casa Amarela e articulistas de O Regional.