O que faz nascer uma história de amor?

A notícia da separação de um casal provoca curiosidade, interesse, até espanto: Por que uma relação amorosa termina? Mas ninguém se debruça com a mesma perplexidade sobre o mistério maior: o que faz nascer uma história de amor? 

O espanto deveria valer para todos os romances, não só para os casos que viraram livros, novelas, peças de teatro. A indagação vale não só para os Romeus e as Desdêmonas, mas para você, para mim, para a moça que vende verduras na feira. O que nos leva a tentar preencher nossa incompletude com aquela pessoa em particular e com nenhuma outra? 

É esse o grande mistério, para o qual não existe resposta. Por que duas pessoas, que nunca se viram antes, de repente se olham de um jeito diferente... – e o feitiço acontece? Por que elas passam a ter tanta importância, uma para a outra, que nada mais conta? Daí em diante, a paz estará para sempre comprometida pelo medo da perda, pois sem o outro, torna-se impossível respirar, impossível sobreviver. 

Os contos de fadas falam de princesas e príncipes de origens diferentes: eles vem de outras terras ou tinham um disfarce de fera. Mas os contos de fadas não servem para nos dar receitas do bem-viver no cotidiano, embora nos ajudem a entender a vida. O problema, você sabe, é que esses relatos terminam onde a vida começa: felizes para sempre, como? 

Na vida real, não dá para encontrar um parceiro perfeito, completo, feito de encomenda para o desejo da gente. Muitas vezes a atração entre os parceiros se dá, justamente, pelo que os diferencia. Ou seja, a gente ama, no outro, aquilo que não tem – com a fantasia de que, ao se unir àquele parceiro, a gente se aposse de tudo aquilo que ele tem e nós não temos. Como se a gente rejuvenescesse ao se casar com alguém mais moço, ou virasse doutor por se unir a alguém mais culto. Mas isso não acontece, e então desenvolve-se em surdina um sentimento de inveja, que faz com que cada parceiro tente destruir, no outro, justamente aquilo que mais o atraía – numa dinâmica que pode minar o relacionamento. 

A partir daí, as diferenças aparentes e conhecidas (de idade, de origem, de cultura) servem de escudo para esconder os desencontros que de fato envenenam o convívio – e para os quais o casal não olha: diferenças de ritmo, de humor, de expectativas. É pelo descuido com essas questões que se compromete a intimidade e acumulam-se os ressentimentos. 

Homens e mulheres de nossa cultura são mesmo seres diferentes, que chega a ser um atrevimento ousarem elaborar um projeto de vida em comum. Tão difícil, tão improvável esse encontro. E tão intolerável a vida sem ele... 

Mas, navegantes do mesmo Planeta Azul, corremos juntos o risco de explodir pelos ares. Juntos, poderemos nos afogar no mar de detritos em que a poluição ameaça transformar o mundo. Partilhamos das mesmas ansiedades: o medo da morte, do abandono, da solidão. E comungamos da mesma esperança de um mundo melhor, onde o amor possa crescer sem medo e o compromisso maior seja com a ternura. 

 

Autor

Ivete Marques de Oliveira
Psicóloga clínica, pós-graduada em Terapia Cognitivo Comportamental pela Famerp