O Brasil no comando do Mercosul

 

Criado em 1990 com o objetivo de promover a integração econômica e desenvolvimento regional de Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai, o Mercosul, também conhecido como Mercado Comum do Sul, não é apenas um bloco econômico, mas também fruto de um processo de integração regional. Entre os principais objetivos estão a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países-membros, assim como a coordenação de políticas macroeconômicas e a negociação conjunta em acordos comerciais com terceiros países ou outros blocos.

Naturalmente, o Brasil é o maior membro do acordo, representando a maior economia e o maior mercado consumidor. A Argentina é o segundo maior país em termos de economia e comércio dentro do Mercosul. Atualmente, os produtos agrícolas, como carne bovina, soja e açúcar estão entre os itens mais importantes nas trocas comerciais internas do Mercado Comum. 

No entanto, ainda que um dos objetivos declarados do Mercosul seja a integração econômica, nota-se uma substancial restrição às exportações brasileiras por parte dos nossos principais parceiros comerciais. Segundo um relatório da Confederação Nacional da Indústria (CNI) apresentado ao governo Lula, aproximadamente 61,4% das exportações brasileiras para a Argentina foram impactadas por barreiras comerciais de algum tipo, o que equivale a um impacto de US$ 9,4 bilhões num total de US$ 14,3 bilhões exportados para o país vizinho em 2022.

Há uma grande quantidade de produtos brasileiros que, para entrar na Argentina, sofrem de barreiras técnicas, demora na autorização para a entrada no país e dificuldades em receber o pagamento após a venda (o governo argentino restringe a compra de dólares por pessoas e empresas). Certamente, muito desse cenário deve-se à crise contínua que a Argentina enfrenta  há alguns anos, mas Alberto Fernandez e Lula parecem - convenientemente - esquecer dos obstáculos impostos pela Casa Rosada aos nossos produtos. Desde a eleição de Lula da Silva, o presidente argentino realizou diversas visitas ao Brasil e chegou a prometer o financiamento de importações argentinas de produtos brasileiros. Desde o início de seu mandato, Lula vem criticando severamente organismos internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI), e buscando defender a Argentina e os repasses financeiros de bancos,como o banco dos BRICs, ao país de Fernández. 

Agora, na reunião dos presidentes do Mercosul – a primeira desde 2019 com a presença do presidente brasileiro – o Brasil assume a presidência do bloco. A presidência é exercida de forma rotativa entre os membros, e o Paraguai deve assumi-la em seis meses. Nesse momento, caberá a Lula destravar acordos comerciais entre o Mercosul e outros países e blocos, como a União Europeia (UE). 

Esse último acordo, em especial, levou cerca de 20 anos para ser concluído e tem como objetivo eliminar tarifas e reduzir barreiras não tarifárias em uma ampla gama de setores econômicos como agricultura, indústria, serviços, compras governamentais, propriedade intelectual, desenvolvimento sustentável e solução de controvérsias comerciais. Quando entrar em vigor, será o maior acordo comercial do mundo e abrangerá quase 800 milhões de consumidores. Apesar das negociações terem sido concluídas no governo Temer, ainda há muito para que passe a valer. Os europeus, em especial os franceses, estão receosos da força do nosso agronegócio, e temem que a força dos latifúndios do Mercosul acabem com as pequenas produções europeias. Por isso, a Europa vem criticando tanto as políticas ambientais do Mercosul, o que representa uma maneira de atrasar a ratificação do acordo nos parlamentos dos países-membros da UE. 

Além do avanço no acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia, outro desafio que será enfrentado pelo comando brasileiro é a tentativa uruguaia de estabelecer um acordo próprio de livre comércio com a China. Se isso acontecer, será difícil para produtos brasileiros, argentinos e paraguaios serem suficientemente competitivos para entrar no vizinho do sul. 

Fato é que, com ou sem o Brasil na presidência rotativa do Mercosul, há inúmeros desafios para o crescimento e a consolidação do bloco, que não possui nenhum acordo comercial com países entre as 10 maiores economias do mundo. Enquanto Lula insiste que a Venezuela repressiva é uma democracia, perde-se a oportunidade de se expandir as fronteiras do nosso comércio não apenas para países verdadeiramente democráticos, mas também para nações que representam uma oportunidade de mercado para nossos produtos. 

 

João Alfredo Lopes Nyegray

Doutor e mestre em Internacionalização e Estratégia. Especialista em Negócios Internacionais. Advogado, graduado em Relações Internacionais. Coordenador do curso de Comércio Exterior na Universidade Positivo (UP)

 

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