O acesso é a regra e o sigilo, a exceção

No contexto atual, marcado por debates intensos sobre ética e governança, a transparência das ações governamentais surge como um requisito fundamental para a legitimidade das instituições democráticas. Sob a ótica do Direito Público, que engloba todas as normas jurídicas de natureza pública, a transparência não é apenas um mecanismo de fiscalização, mas uma ferramenta vital para garantir a confiança da população no governo.

Desde a promulgação da Lei de Acesso à Informação (LAI) em 2012, o Brasil deu passos significativos em direção a uma maior abertura governamental. A LAI foi um marco legal que estipulou que a informação pública deve ser acessível a todos os cidadãos, estabelecendo que o acesso é a regra e o sigilo, a exceção. Essa legislação permite que qualquer pessoa, sem necessidade de justificativas, solicite dados dos órgãos públicos, os quais devem responder em até 20 dias.

Porém, a implementação prática dessa lei ainda enfrenta obstáculos significativos. Além das questões técnicas e burocráticas, há um desafio cultural de longa data dentro do próprio governo. Muitas vezes, a resistência ao compartilhamento de informações é grande, seja por uma questão de controle de poder ou por uma falta de preparo institucional para gerenciar a abertura de dados de forma segura e eficiente.

A tecnologia, por sua vez, tem um papel duplamente importante neste cenário. Por um lado, facilita a disseminação e o acesso às informações, com a criação de portais de transparência e sistemas eletrônicos que permitem ao cidadão acompanhar em tempo real a execução orçamentária, licitações e contratos. Por outro lado, a mesma tecnologia apresenta desafios relacionados à segurança da informação e à necessidade de atualização constante das plataformas para evitar que se tornem obsoletas ou sejam suscetíveis a ataques cibernéticos.

Além da questão tecnológica, a eficácia da transparência pública está diretamente relacionada ao engajamento do cidadão. É fundamental que a sociedade utilize as ferramentas disponíveis para fiscalizar e questionar as ações do governo. Neste ponto, a educação desempenha um papel crucial, pois um eleitorado bem informado é mais apto a demandar accountability de seus líderes e a tomar decisões eleitorais baseadas em informações concretas e verificáveis.

Interessantemente, a transparência também pode servir como um catalisador para a inovação no setor público. Administradores públicos que sabem que estão sendo observados tendem a buscar a excelência na gestão dos recursos e na entrega de serviços. Isso pode levar a uma melhoria na qualidade dos serviços públicos, desde que acompanhada de uma estratégia sólida de gestão e avaliação de desempenho.

A história mostra que a transparência não é apenas uma exigência administrativa ou legal, mas uma necessidade fundamental para a saúde de qualquer democracia. Enfrentar esses desafios requer uma combinação de vontade política, avanços tecnológicos, educação cívica e, crucialmente, uma cultura de integridade e responsabilidade tanto no governo quanto na sociedade.

Este caminho não é fácil, mas os frutos a serem colhidos são inúmeros, conduzindo a uma governança mais justa e eficiente. Assim, enquanto a transparência continua a ser um ideal a ser alcançado, os passos dados nessa direção reafirmam o compromisso com um futuro onde governo e cidadãos caminham lado a lado em prol de uma sociedade mais justa e equânime.

Autor

Jaquelini Cristina de Godeis
Advogada. Ex-Assistente Especial da Assembleia Legislativa de São Paulo. Especializada em Direito de Família e Sucessões. Pós-Graduanda em Direito Contratual pela PUC-SP e Mestranda em Direito Público.