Nós vamos sorrir

No mês de março comemoramos o dia da mulher e cinco anos que enfrentamos a dura realidade do confinamento ocasionado pelo Covid 19. Duas datas importantes que nos lembram força.

Ainda que pareça repetitivo falar a respeito, lembrar que momentos difíceis deixam rastros de sobrevida que se fertilizam quando as vivências se traduzem em aprendizado e experiência emocional, atualizam em nós a própria história de maneira a repensarmos as próprias atitudes.

O dia da mulher surgiu num contexto onde as mulheres pleiteavam melhores condições de vida, trabalho e direito ao voto, enquanto que a pandemia nos colocou em casa, interrompeu vidas de pessoas que morreram, e muitos perderam emprego, mudaram estilo de vida, mudaram de cidade, etc. A experiência da pandemia reorganizou o espaço interno de muitos e deixou sequelas.

Diante de circunstâncias difíceis sempre temos oportunidade de repensar atitudes, reorganizar formas de viver a vida, priorizando urgências e como vão ser as coisas a partir da dificuldade.

Se hoje pudéssemos pensar no que aprendemos e o quanto crescemos na vida emocional nestes cinco anos de pandemia, assim como no quanto o dia da mulher contribui para refletirmos atitudes quando pensamos em igualdades, o que extrairíamos destas reflexões?

Ficar quase dois anos em casa sem poder sair esperando vacina não foi tarefa fácil, e se estamos vivos, significa que tivemos sorte e conseguimos atravessar o vale da morte sem perder a própria vida, vencemos. Ao mesmo tempo, perdemos pessoas, vivenciamos um luto coletivo, experenciamos dor, medo, desamparo.

Hoje, se pensamos na vida das mulheres, percebemos quantas lutas ainda continuam esquecidas e sem espaço de escuta. Ao mesmo tempo, muitas histórias nos levam a acreditar que existem mulheres que nos trouxeram ao longo do tempo a esperança de que podemos tudo.

A mulher pode ser ministra do Superior Tribunal Militar, pode ser atriz e ganhar prêmios, mãe e filha podem, pode ser Chiquinha Gonzaga,  Eunice Paiva, Irmã Dulce, Madre Teresa de Calcutá, dona de casa, organizar vida profissional e doméstica com competência, Virgínia Leone Bicudo, cantora, empreendedora, Chiara Lubich, rainha de bateria, sustentar sozinha sua família, enfim, tudo isto  vivenciando o feminino que espanta a muitos por sua força, ao mesmo tempo embelezando e trazendo luz à democracia, porque enquanto elas ocupam lugares diversos, elas lembram à sociedade que é impossível harmonia quando os espaços são ocupados somente por homens ou uma camada social específica. Na verdade, a humanidade não cresce sem um útero.

Ao contrário, é justamente no movimento das diferenças que somos convidados a entrar em relação com nós mesmos através do outro que nos tira da calmaria, nos convidando a repensar padrões antigos, e temos que sentar à mesa com alguém diferente de nós, que age e pensa à sua maneira, e no melhor da situação, nos ensina como o mundo deve e deveria ter funcionado desde sempre.

São estes exemplos que arejam os espaços e nos atualizam como devemos pensar a vida em sociedade.

O mês de março depois do Covid 19 e unindo-se ao dia da mulher, nos oferece material suficiente para muitas sessões de análise, e se refletimos sobre nossas vivências, extraindo as dificuldades e os aprendizados, olhando a vida em sociedade nesta perspectiva, não sobra lucidez haja visto o quanto somos convocados o tempo todo para exercer o imperativo de humanidade do qual viemos experenciar por aqui.

As vivências sempre se impõem como força na nossa mente, mas o que diferenciam as pessoas é o quanto elas estabelecem relação com aquilo que lhes acontece, ou seja, como vão processar suas vivências cotidianas a partir do que vão aprendendo em suas vidas. E neste caso, sempre é possível extrair algo que se aproveite.

Música “Na estrada” com Marisa Monte.

 

Foto de autor desconhecido, @auguri_humanamente ©

Autor

Claudia Zogheib
Psicóloga clínica, psicanalista, especialista pela USP, atende presencialmente e online. Redes sociais e sites: @zogheibclaudia, @augurihumanamente, @cinemaeartenodivã, www.claudiazogheib.com.br e www.augurihumanamente.com.br