Nas Olimpíadas, somos todas Maria Flávia

Não é de hoje que mulheres sofrem abusos silenciosos em seus próprios lares, que minam sua autoestima e refletem na carreira profissional.  

A atleta Maria Flávia de Lima compartilhou sua história de superação durante os Jogos Olímpicos de Paris e o caso gerou debate nas redes sociais. Para defender nosso país, ela sofreu calada.  

De acordo com Maria, defender-se das constantes acusações do ex-companheiro em processos judiciais é, hoje, seu maior desafio. Ele a acusa de abandonar a filha para competir pelo país e, com isso, a atleta corre o risco de perder a guarda da criança.  

Os abusos psicológicos e patrimoniais faziam parte da rotina diária de Maria Flávia. Ela vivia uma verdadeira maratona para dar conta dos afazeres domésticos, família e treinos. Chegou a ter lesões musculares por carregar a filha no colo enquanto subia e descia morros por quilômetros, trajeto que percorria diariamente para trabalhar.  

É comum mulheres como Maria vivenciarem a rotina de exaustão enquanto são cobradas, controladas e desprezadas dentro de casa. Em um claro exemplo de violência patrimonial, o companheiro detinha o poder sobre o dinheiro da atleta. O controle financeiro e as constantes tentativas de diminuir a autoestima são as principais armas do relacionamento abusivo.  

Com a rotina de abusos, as vítimas podem desenvolver diversas doenças psicossomáticas, como câncer, diabetes, doenças de pele, queda capilar e, ainda, a depressão, resultado da tensão psicológica vivida.  

Quando acredita que romper o ciclo de abusos com a separação irá cessá-los, a vítima se depara com um obstáculo ainda maior: a violência processual proveniente da litigância abusiva.  

Comumente, por não aceitarem o término da relação, companheiros tóxicos usam o judiciário para atacar suas vítimas e mantê-las presas à relação, ainda que a separação já tenha acontecido. É uma forma de perpetuar a prisão matrimonial, pois assim o relacionamento nunca termina. Ao compartilhar sua história, Maria Flávia alega enfrentar tentativas de silenciamento.  

Esse é o padrão comportamental abusivo, em que a vítima busca se libertar do ciclo violento, mas se depara com a prorrogação do cativeiro através dos incansáveis processos judiciais, na chamada violência processual.  

Quando expõe sua experiência, o abusador é beneficiado pelo sigilo processual imposto pelo judiciário, forçando a vítima ficar calada. Podemos dizer que se ficar o bicho come, e se correr o bicho pega. Ou seja, nessa prova, a luta cotidiana da atleta é o obstáculo mais desafiador. 

Além de atingir os índices olímpicos para ir à França competir, ela precisou vencer a violência doméstica. Nas Olímpiadas de Paris, Maria Flávia de Lima é ouro em superação de relacionamento abusivo! Maria fala por todas nós, e nós falamos por Maria! Somos todas Marias!  

Gab Saab

Especialista em psicologia jurídica, graduanda em Direito, palestrante e escritora

Autor

Colaboradores
Artigos de colaboradores e leitores de O Regional.