Não aceite pedaços

Um copo despedaçado não sustenta a água, não ajuda a saciar a sede. Um vaso despedaçado não carrega um bouquet, não apoia a fragrância do amor que cuidou das rosas e o amor que com elas se quer demonstrar. Uma mesa despedaçada não suporta os pratos, os talheres, a comida e a própria alimentação, do sabor à nutrição. Uma alma despedaçada não mantém a decisão, não faz do verso e da palavra de instantes uma convicção nutrida para a vida toda. Um coração despedaçado não custodia a promessa que o corpo pode quebrar rapidinho numa “rapidinha”.

Apenas as pessoas inteiras, como as coisas inteiras, são mais do que úteis: são confiáveis na sua integridade, na sua unidade de potência e ato. Quem tiver que juntar seus cacos do ser, como os estilhaços do cristal da taça e da porcelana da floreira; quem tiver que calçar as pernas bambas e alinhar as ripas da távola; quem? quem assim for (quem assim é) terá que ser deixado de lado para que cuide e termine seus processos solitariamente, no canto dos fragmentos.

Não aceite pedaços quando sua garganta estiver árida, quando as flores estiverem murchando à mão, quando a fome der nós górdios no seu estômago, quando a carência ou qualquer sentimento mais frágil e afetuosamente vacilante te desesperar.

A água secará na fonte, o perfume se consumirá na pétala, o banquete apodrecerá em lavagem para os porcos e seu coração adoecerá. O que não for inteiro, um todo, vai te quebrar, vai te fracionar, vai te dividir. Assim como não se compra objetos aos pedaços, inconectáveis, não se aceita os pedaços desconexos (tempo, atenção, cuidado, carinho: vida) da existência despedaçada do outro.

Autor

Dayher Giménez
Advogado e Professor