Nada é bobagem, nem a bobagem

Para quem é tocado pela psicanálise sabe que se trata de um encontro que acontece com o nosso próprio processo de análise e que proporciona aprendermos sobre nós mesmos exatamente porque do outro lado existe uma escuta qualificada e atenta que permite que este encontro aconteça.

Esta experiência emocional marca a vida de uma pessoa para sempre. Transforma, modifica o jeito de olhar, de pensar, e possibilita entrarmos em contato com uma experiência subjetiva que favorece o reconhecimento e origem de vários sintomas: medos, angustia, ciúmes, inveja, amor, dores corporais, somatizações, pequenezas da vida como falar mal dos outros, tentar diminuir, desconsiderar, não ter amor à verdade, não estar disposto a conviver com a inculturação, com as diferenças, com outras denominações, identidades, classe social, e tantas coisas que existem neste mundo e que a ciência se desdobra desde sempre para pensar e estudar a origem de tanta divisão e dor que o ser humano padece.

Quem entra em contato consigo próprio através deste encontro que é proporcionado pela experiência subjetiva na psicanálise sabe do que estou falando e o quanto os resultados falam por si só, e apesar das palavras serem insuficientes para darem conta de traduzir o que se passa dentro de uma sessão de análise, a dimensão antropológica contida na experiência subjetiva colabora e transforma o tempo todo.

Através da análise pessoal entramos em contato com núcleos adormecidos, que enquanto não olhados e visitados, padecem e dificultam sermos quem de fato podemos ser.

Quando fui apresentada para a psicanálise em 1983 através das obras de Freud, Melanie Klein, Winnicott, Bion e todos os psicanalistas contemporâneos que escreveram, estudaram, escrevem e estudam, adentrei um universo desconhecido até então para mim, mas através da experiência subjetiva em minha análise pessoal cada vez mais fui sendo tocada, e sobretudo constatei e reconheci sua eficácia, vivi cada transformação.

É difícil explicar com palavras o que significa passar por este processo, elas podem não dar conta de traduzir as transformações que experimentamos em nossas vidas e de quem atendemos. Da minha parte não fui em busca de transformação, mas sim do desconhecido, do aprender com a experiência, daquilo que eu ainda não conhecia de mim mesma.

Gostaria de agradecer ao meu analista já falecido, ao meu futuro analista que ainda não iniciei, e a todos que se debruçam a estudar, ensinar, escrever, pesquisar. São tantos que gostaria de mencionar aqui, tantos.

Perder tempo explicando ataques é tarefa perdida, e diante de uma história constituída, penso que não há necessidade de defender algo que já se estabeleceu como ciência.

Freud foi perseguido pelo nazismo de Hitler e sobreviveu, e o que ele diria de algumas mazelas contemporâneas? Não me arrisco comentar, mas confesso que suspeito o que ele diria se comentasse algo.

Na psicanálise nada é bobagem exatamente porque em tudo está contido nós mesmos, até as “bobagens” que fazemos e ouvimos por aí.

Música “You've Got a Friend”, com Military Wives.

Autor

Claudia Zogheib
Psicóloga clínica, psicanalista, especialista pela USP, atende presencialmente e online. Redes sociais e sites: @claudiazogheib, @augurihumanamente, @cinemaeartenodivã, www.claudiazogheib.com.br e www.augurihumanamente.com.br | Foto: Edgar Maluf @edgar.maluf ©