Manuela (Amália) e a evocação republicana

À memória de Pedro Luiz Brum Fickel

A palavra “república” é latina, cujo significado é “coisa do povo”, tipificando o sistema de poligamia diante do protótipo masculino. Trata-se da ideologia patriarcal, na qual a concepção de política funciona como a administração de um harém (povo, ou cidade). Por isso as cidades, na Grécia Antiga, eram simbolizadas pela imagem feminina, como a representação do Mito de Helena: em Esparta (Menelau) e Troia (Páris). A troca de esposo faz alusão à alternância, isto é, a gestão política.

No romance histórico “A casa das sete mulheres” (2002), de Leticia Wierzchowski, há a temática da luta pela república brasileira, a partir da história do General Bento Gonçalves e as mulheres, que foram trancadas na Estância da Barra, durante a “Guerra dos Farrapos” (1835 a 1845), quando o Estado do Rio Grande do Sul lutou contra o Império do Brasil. A imagem da república parece enaltecer as figuras femininas, enquanto sujeitos que aguardam a apuração dos conflitos políticos. Assim, a figura masculina (eleita) ressoa o ato matrimonial.

Atraído pela República Rio-grandense, vem o Italiano Giuseppe Garibaldi às terras gaúchas, com o objetivo de fortalecer as tropas revolucionárias. Nessa ocasião, o italiano conhece a sobrinha do General Bento Gonçalves, no pleno desenvolvimento do espaço romântico, pois Garibaldi “lutava pela República, e por ela, por Manuela” (Wierzchowski, 2002). A identidade de “chefe de Estado” conota a “batalha de acasalamento”, ponto ápice das eleições, por meio do período eleitoral.

A derrota republicana parece tingir a imagem de Manuela, durante a narrativa, visto que “no meio disso tudo estava Garibaldi [...] gritando pela república, destilando seu ódio aos impérios” (Wierzchowski, 2002). O rito delineado (encontro e desencontro / ganhos e perdas) demonstra a bravura de um guerreiro em direção à vitória, o coração da sobrinha de Bento Gonçalves. A república, em Garibaldi, seria a desconstrução do sistema patriarcal vivido pela família de Manuela, ou seja, o ódio contra as formas de opressão.

O desejo por uma república sintetiza o fim dos impérios tenebrosos, o desejo pelas cinzas das horas, a recusa de “pão e circo”, o sonho de uma vida melhor etc. Manuela, nossa figura republicana, esperou pelo guerreiro até o fim e ficou conhecida como a “Noiva de Garibaldi”, seguindo a essência do Mito de Penélope, que aguardava o retorno de Ulisses. A identidade feminil evoca a república.

Em Apocalipse, a Nova Jerusalém está “adereçada como uma noiva ataviada para o seu marido”, pois a cidade entrega as chaves ao proprietário. Quantas noivas “republicanas” aguardam os eleitos tomarem posse – o início pode ser um descuido do fim. A personagem Manuela (Amália) ressalta a essência da república: “Havíamos vivido a História, e seu gosto era amargo, no final” (Wierzchowski, 2002).

Foto: Manuela (Amália) e Giuseppe Garibaldi

Autor

Prof. Dr. John David Peliceri da Silva
Formado em Letras, em Direito e Pedagogia. Mestre, Doutor e Pós-doutorando em Letras pela Unesp. Atua como Supervisor Educacional na Secretaria Municipal de Educação de Catanduva.