Mães e filhas

Freud faz a afirmativa de que a mãe é de fato o primeiro objeto de amor da criança, tanto da menina quanto do menino, porque é ela quem providencia os primeiros cuidados essenciais para sua subsistência. E pode ser a mãe realmente ou qualquer um que represente a função materna, até um homem, mas ali ele não vai se apresentar como pai, está cumprindo um papel de mãe. Essa função é tão importante, pois nós, humanos, temos a característica de nascer completamente desamparados. Não sobrevivemos se não houver alguém nos cuidando e alimentando. E, por ser tão imprescindível na vida da criança, a mãe acaba naturalmente exercendo um enorme poder sobre ela. No início da vida da criança, este poder é absoluto, inclusive poder de vida e de morte. É o desejo da mãe que impera. É ela quem determina o que quer do filho, isto é, o que este deve querer. É a mãe quem diz assim: “agora você está com fome, agora você vai mamar” ou “agora você está com soninho, vai dormir”. Ela é o grande Outro, como é chamada na psicanálise.

Gostar de ser mulher e querer ser mulher é o que constitui a condição feminina. O apuro no modo de se vestir ou o cuidado em passar horas no cabeleireiro ou numa academia de ginástica não quer dizer tudo a respeito da feminilidade, em termos de construção de uma identidade feminina. Não é incomum a mulher, no fundo, ter preferido nascer homem e, às vezes, assumir a posição masculina, isto em nível inconsciente.

O menino se sai melhor do processo de identificação que a psicanálise chama de complexo de Édipo, porque, ao se parecer com seu pai, encontra uma identificação como homem. A menina, embora introduzida pelo pai no mundo simbólico e salva por ele da confusão alienante com a mãe, não poderá resolver só com isso seu complexo de Édipo. Enquanto o menino, apesar de continuar amando a mãe – e a amará para sempre – vai se afastar dela (afinal já tem sua identidade masculina, não precisa dela nesse sentido), a menina continua “quietinha”, pertinho da mãe, meiga e obediente. Esperando algo da mãe, uma resposta sobre seu ser mulher. Ela espera que a mãe lhe diga o que é ser mulher – este ser indefinível.

Autor

Ivete Marques de Oliveira
Psicóloga clínica, pós-graduada em Terapia Cognitivo Comportamental pela Famerp