Lei da Anistia e seu efeito em Catanduva

A Lei Nº 6.683, de 28 de agosto de 1979, mais conhecida como a Lei da Anistia, pode ser considerada como um dos mais importantes marcos do fim do regime militar no Brasil (1964-1985). Ela beneficiou mais de 100 presos políticos e permitiu o retorno de 150 pessoas banidas e 2000 exiladas, que não podiam voltar ao país sob o risco de serem presas.

O problema é que a lei também conferiu anistia para militares acusados de crimes de violação dos direitos humanos.

Antecedentes históricos

Depois do período mais duro da repressão, sob vigência do Ato Institucional nº 5, o governo militar iniciou uma abertura política lenta e gradual no Brasil.

Contribuíram para isso as manifestações populares que tomavam conta do país, bem como uma crise interna no regime devido aos assassinatos do jornalista Vladimir Herzog e do metalúrgico Manuel Fiel Filho, ocorridos sob tortura no DOI-CODI - órgão de repressão do governo - em 1975. Crescia também a pressão pela anistia, com apoio de entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Em 1978, foi criado no Rio de Janeiro o CBA (Comitê Brasileiro pela Anistia), com o objetivo de pressionar o governo para que concedesse o perdão a pessoas acusadas de crimes políticos, de modo a permitir que presos fossem soltos e exilados voltassem ao país. Entre os exilados estava o sociólogo e ativista político Herbert José de Souza, o Betinho, irmão do cartunista Henfil, que, inclusive, foi citado nos versos da música O Bêbado e o Equilibrista, de João Bosco e Aldir Blanc, gravada por Elis Regina em 1979.

Votação tumultuada

Em meio ao clima de redemocratização, o presidente João Baptista Figueiredo elaborou o projeto de Lei da Anistia e encaminhou ao Congresso Nacional. Figueiredo foi o último presidente da ditadura brasileira e governou o país de 1979 a 1985.

O projeto foi aprovado numa sessão tumultuada na Câmara dos Deputados em 22 de agosto de 1979. Na época, havia apenas dois partidos legitimados pelo governo: a Aliança Renovadora Nacional (Arena), que apoiava a ditadura e tinha maioria no Legislativo, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que fazia oposição. Desde o início do regime, em 1964, políticos e intelectuais que se opunham ao regime militar tiveram seus direitos políticos cassados. Outros militantes viram na clandestinidade e na luta armada a única forma de combater a repressão. Nestas atividades, cometiam assaltos a bancos, para financiar guerrilhas, e sequestros, para exigir a soltura de companheiros presos. Pouco mais de dois meses depois de aprovada, a Lei da Anistia teve como efeito permitir o retorno ao país de políticos como Leonel Brizola, ex-governador do Rio de Janeiro e duas vezes candidato à presidência pelo PDT, e Carlos Minc, que já ocupou o posto de ministro do Meio Ambiente. Intelectuais como Darcy Ribeiro e Paulo Freire, que estavam exilados do país por conta de seus ideais políticos, também retornaram com a anistia.

Entretanto, com o perdão político, não apenas os presos, torturados e exilados podiam caminhar livremente pelo Brasil, mas também os torturadores e assassinos que trabalharam a serviço do regime. Os parlamentares do antigo partido MDB criticavam o fato de alguns presos serem soltos somente no mês de dezembro daquele ano. Também argumentavam que não havia garantias para que os servidores públicos prejudicados pelos atos institucionais retornassem normalmente às suas atividades.

Apesar de mais de 35 anos após sua promulgação, ainda hoje é discutido o teor da Lei da Anistia. Muitos ex-presos políticos na ditadura, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ministério da Justiça e Casa Civil refletiram seus posicionamentos: eles argumentam que a lei não pode se estender “(...) a crimes comuns praticados por agentes da repressão contra opositores políticos durante o Regime Militar”.

Já o Ministério da Defesa, que comanda o Exército, a Advocacia Geral da União (AGU) e o Ministério das Relações Exteriores dizem que a anistia não pode ser revogada, porque ela é anterior aos efeitos da Constituição de 1988, que não permite ceder anistia a torturadores.

Catanduva

Catanduva, como ocorreu em quase todas as cidades, também possuiu cidadãos que foram feridos pelos Atos Institucionais, desde a instalação do regime militar, em 1964.

Entre eles estavam dois ferroviários, um advogado e um farmacêutico, que mesmo apresentando histórias diferentes, tiveram pontos comuns: a ignorância das razões que levaram as autoridades a atingi-los pelas medidas de exceção e, principalmente, a humilhação de serem olhados, durante anos, por seus concidadãos, como pessoas marcadas.

Foram eles: os ferroviários José Fraga Salgado e Antonio Gulia Júnior; o advogado Edie José Frey; e o farmacêutico Agnaldo Moreira.

Os três primeiros tiveram decretada sua aposentadoria compulsória por consequência do Ato Institucional Nº 1 e o último, além de ter sido demitido sumariamente do cargo que ocupava (funcionário do SAMDU – Serviço de Assistência Médica de Urgência), teve seus direitos políticos cassados por 10 anos.

Fonte de Pesquisa:

- Jornal Opinião Semanal, de 15 de julho de 1979.

- Material pesquisado no acervo do Centro Cultural e Histórico Padre Albino.

 

Fotos:

Contribuíram para a criação do projeto de anistia as manifestações populares que tomavam conta do país, bem como uma crise interna no regime devido aos assassinatos do jornalista Vladimir Herzog e do metalúrgico Manuel Fiel Filho, ocorridos sob tortura no DOI-CODI - órgão de repressão do governo - em 1975

Em meio ao clima de redemocratização, o presidente João Baptista Figueiredo elaborou o projeto de Lei da Anistia e encaminhou ao Congresso Nacional. Figueiredo foi o último presidente da ditadura brasileira e governou o país de 1979 a 1985

O AI-5 foi um dos Atos Institucionais mais severos durante o regime militar no Brasil, pois dava ao presidente amplos poderes, inclusive o de fechar o Congresso Nacional, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais

Desde o início do regime, em 1964, políticos e intelectuais que se opunham ao golpe militar tiveram seus direitos políticos cassados. Intelectuais como Darcy Ribeiro (foto) e Paulo Freire, que estavam exilados do país por conta de seus ideais políticos, também retornaram com a anistia

 

Autor

Thiago Baccanelli
Professor de História e colunista de O Regional.