Grandes ciclistas na história de Catanduva

“Depois da primeira corrida ciclística em 1937, a coisa pegou fogo”. Essa era a frase de abertura de uma matéria sobre o ciclismo em Catanduva, no ano de 1977. 

O entusiasmo maior era de Piupiu – apelido de José Soto – e Caetaninho – abreviação carinhosa de Caetano Clemente Neto – que passaram a treinar diariamente por ruas e estradas, sem maiores compromissos com ninguém. Na época, em meados da década de 1930, Carlito Machado era o homem que estimulava e amparava toda e qualquer modalidade de esporte e prometia aos rapazes que iria promover provas importantes com prêmios e tudo o mais. 

E uma coisa era certa: sempre que o Carlos Machado prometia, ele cumpria. Assim, os rapazes atacavam o rijo do treinamento. Mas, notavam que não tinham certeza do que estavam tentando. Se estavam certos ou errados em correr por dia 20 ou 30 quilômetros; o tamanho melhor da catraca; a altura do selim e do guidão; o calibre dos pneus; o trem de corrida, para grandes distâncias; postura correta para os arranques de velocidade máxima. Enfim, tinham mil perguntas sem respostas e, infelizmente, em Catanduva, naquela época, ninguém sabia responder essas indagações. 

Conversando com especialistas 

Procuraram em livros e revistas, jornais e almanaques ou qualquer coisa que servisse para melhorar seus conhecimentos. Nada encontraram, só restando uma solução: uma viagem para São Paulo para lá conversarem com um dos melhores especialistas no assunto: Franz Peitich, campeão sul-americano que trabalhava na Loja da Caloi. 

O maior problema para a viagem era convencer o pai de Piupiu – o Sr. Pedro Soto. Porém, na prática, foi totalmente a favor da viagem, bem como o avô de Caetaninho – o Sr. Caetano Clemente – que era o responsável por Caetaninho.  

Aliás, esses dois senhores jamais criaram qualquer embaraço a respeito das corridas para os jovens corredores, apesar dos sustos constantes, pois Piupiu e Caetaninho tinham o hábito de sair por aí em longos percursos. 

“Quando saíamos para treinar era comum mudar os planos e sumir estrada além. Daqui à São José do Rio Preto fazíamos em 2h30m; à Bebedouro, 1h40m; e à cidade de Olímpia, em 2h00m, somente ida é claro. Mas considere que eram estradas de areião. Quando voltávamos daquele que seria um pequeno treino pelas redondezas, os velhos estavam subindo pelas paredes, tamanha preocupação”, relata Piupiu em entrevista à Revista “A Raquete”, de maio de 1977. 

Na mesma entrevista, após ter rindo à vontade, Piupiu ainda relembra: “Lembro-me de um dos costumes de meu pai, um tanto quanto humorístico. Toda vez que eu viajava para participar de provas ciclísticas, meu pai dava o dinheiro calculado para as despesas, sempre perguntando se dava e eu sempre respondendo que sim. Depois, então, ele me entregava mais uma quantia extra, acompanhada da prelação: ‘Olha, meu filho, este dinheirinho é para você esconder em outra parte. Caso você venha a ser roubado, não vai ter problema, concorda?’ É claro que eu concordava”. 

Quanto a viagem de São Paulo, tudo ocorreu na mais perfeita ordem. Procuraram na Casa Caloi o famoso campeão sul-americano Franz Pleitich, austríaco naturalizado brasileiro e corredor de velocidade em velódromos. Franz interessou-se pelos jovens catanduvenses, dando-lhes ensinamentos das várias técnicas para um atleta tirar maior proveito de sua máquina, além de mostrar como treinar, como manter uma postura acertada e como desenvolver o “escat” de chegada. 

Com esse conhecimento, Piupiu adquiriu maiores chances e, posteriormente, levantou grandes provas, pois seguiu à risca os ensinamentos de Franz Pleitich. 

As vitórias 

Carlos Machado cumpriu com o prometido: duas corridas foram realizadas com o patrocínio de seu jornal O Corneta. Depois da primeira prova – disputada em Catanduva a 25 de janeiro de 1937 – e a segunda, denominada de 1ª Competição Ciclística O Corneta –  disputada em 02 de janeiro de 1938 – , com percurso de Catanduva à Catiguá, ida e vinda, com vitória de Piupiu, realizando o trajeto em 55 minutos e 10 segundos. Em segundo, tivemos Caetaninho com 56 minutos e 25 segundos, seguido de Pedro Soto Filho. 

Quatro meses depois, realizou-se a 2ª Competição Ciclística O Corneta, em 03 de maio de 1938, com o mesmo trajeto da primeira prova. 

Mais uma vez Piupiu chegou em 1º lugar, e conseguiu Caetaninho a 2ª colocação na prova. Piupiu cobriu o percurso em 52 minutos e 05 segundos, melhorando o seu tempo em três minutos e 05 segundos em relação à prova anterior. Caetaninho melhorou o tempo em 01 minuto e 53 segundos. 

À noite, no Bar do Vicente, os ciclistas de Catanduva que participaram da prova, em companhia de Carlos Machado, entraram numa cervejada oferecida pelos senhores Sandoval & Monteiro, do depósito da Companhia Cervejeira Paulista de Ribeirão Preto. 

Dois meses depois, em 10 de julho de 1938, realizou-se outra corrida, sob patrocínio da Rádio Propaganda, denominada Campeão de Catanduva, com percurso pelas ruas da cidade. Venceu mais uma vez Piupiu Soto e em segundo lugar Caetaninho. Em 25 de dezembro de 1939, houve a segunda prova Campeão de Catanduva, com resultado igual à primeira. 

A dupla dinâmica representou Catanduva em vários eventos esportivos da região, como em São José do Rio Preto, Araraquara e Ribeirão Preto, sempre conseguindo as primeiras colocações. Catanduva estava se tornando respeitada nesta modalidade.  

Por consequência desse destaque, foi fundado o Ciclo Clube de Catanduva, tendo como presidente a figura de Carlos Machado. 

Em 1939, Augusto Canoso, mais conhecido como Pudim, começaria a dividir as honras da vitória com Piupiu. Caetaninho havia deixado, definitivamente, de participar das provas, o que faria Piupiu pouco tempo depois.  

Com Pudim, encerrou-se a primeira fase do ciclismo de Catanduva, que ficou inativo até 1949, quando entrou em cena o famoso Pedro Stocco, chamada por alguns esportistas de “fase Pedro Stocco”. 

Pedro Stocco correu de 1950 a 1961, porém entre essas duas datas, ficou três anos inativo por motivos particulares. 

De 1953 a 1958 foi considerado pela Federação Ciclística Brasileira como um dos 10 melhores corredores do país. Inúmeros recortes de A Gazeta Esportiva atestam essa verdade. Por diversas vezes foi convocado pela Federação Paulista de Ciclismo para integrar seleções para campeonatos, porém, Pedro Stocco nunca pôde atender os convites por causa de seu trabalho. 

 

Corrida de bicicletas em Catanduva nos dias 04 e 05 de agosto de 1956, com um percurso de 10.000 metros. A saída se deu em frente ao antigo Cine República, na Praça da República e o vencedor da prova foi Juvenal Terêncio

 

Fonte de Pesquisa: 

 - Revista A Raquete, de maio de 1977. 

 - Material pesquisado no acervo do Centro Cultural e Histórico Padre Albino.

Autor

Thiago Baccanelli
Professor de História e colunista de O Regional.