Governo do Quinto dos Infernos
Antes que os defensores da “boa moral” e os patifes do “politicamente correto” venham construir qualquer argumento ou narrativa de cancelamento acerca do título deste artigo, preciso trazer um pouco de história para o debate.
Aos tempos de um Brasil Colonial, em que era preciso prestar contas à Coroa Portuguesa, se fazia obrigatório dar ao Império português, 20% de todo ouro produzido em nosso solo. Para os que são desprovidos de afinidade com matemática, preciso dizer que isso significa que um quinto da produção era entregue ao governo a título de impostos. Além do mais, era comum em Portugal se referir ao Brasil como um inferno, muito em virtude de ser um lugar muito remoto e ser também o lugar que mandavam os exilados, considerados indesejados em Portugal. Agora, acho que é autoexplicativo o porquê da expressão “quinto dos infernos”.
Mas nossos mineiros eram inteligentíssimos. “Extremamente religiosos”, levavam as imagens para dentro das minas e lá escondiam uma parcela do ouro para não ser objeto de tributação portuguesa. O esquema era de clara sonegação fiscal. Ora, diga-me se nunca ouviu a expressão “Santos do Pau-Oco”. Portugal resolveu dobrar a aposta e passou a retirar o quinto diretamente nas casas de fundição. Retirando o imposto diretamente na fonte, o cenário de sonegação seria ainda mais dificultoso.
Nesse momento, que as ações do Império começaram a doer no bolso da elite mineira, essa classe passa a se organizar e mobilizar uma revolta que apesar de frustrada e fracassada, mostrou que mexer no bolso das elites, é quase que sempre, uma manobra extremamente arriscada.
Mas deixando um pouco a história de lado e agora, analisando um Brasil atual, precisamos tentar focar em dados para mostrar, exageradamente, que fomos parar no “meio do inferno”.
Segundo um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), o brasileiro precisou de 149 dias trabalhados, ou melhor, 4 meses e 29 dias, só para pagar tributos exigidos pelo Governo Federal, Estadual e Municipal. É quase metade do ano trabalhando para pagar impostos. Impostos que não vemos sendo aplicados na prática e a bem da verdade, quando aplicados, são ineficientes. Mas veja pelo lado bom: nós temos o SUS!
Corriqueiramente, governos populistas, visando sua recondução ao seu cargo político, cada vez mais criam benefícios sociais. Mas não existe almoço de graça, se de um lado há quem recebe benefícios, do outro, há quem pague por esses benefícios. Em rápida consulta no portal da transparência do Governo Federal, é possível identificar que em 2024, R$ 283,66 bilhões foram usados do orçamento para concessão de benefícios à mais de 35 milhões de beneficiários.
Ademais, aqui não se discute a legitimidade de quem recebe o benefício, mas sim o fato de o aumento de gastos com benefícios sociais comprime o orçamento ao passo que o governo tende a aumentar impostos para equilibrar o jogo entre seu ego populista, suas gastanças com privilégios e as necessidades orçamentárias.
O Cavalo de Troia do governo passou fácil demais pelos corredores de Brasília ao aprovarem aquilo que é, no mínimo, vexatório chamar de “Reforma Tributária” do consumo, que vai trazer muitas surpresas nos próximos anos e ajustando ainda mais o cinto de quem se aventura pelos caminhos da sonegação fiscal.
Mas sejamos minimamente sinceros, aparentemente, nossos representantes aprenderam um pouquinho de história para saber que mexer com o bolso de uma determinada classe, pode dar muitos problemas para quem quer manter o ciclo de poder. Quer seja por esse (ou outro) motivo, que o texto da querida “Reforma Tributária” é permeado do começo ao fim de privilégios para setores específicos que conseguiram as benesses devido à sua grande capacidade de fazer lobby pelos corredores de Brasília.
E o governo já prepara a segunda temporada, talvez deveríamos chamar de Cavalo de Troia 2. Já corre em “avançado estado de destruição” pelos corredores do Congresso Nacional, a mudança na cobrança do imposto de renda. Não sei, embora eu confesse ser favorável à mudança, alguma coisa me diz que nessa mudança no imposto de renda que o governo estuda fazer, me cheira a “teoria do F”, que aprendi com um professor que tive na faculdade.
A “teoria do F”, assim apelidada por mim e mais alguns amigos da faculdade, foi um exemplo figurativo que o professor usou em sala de aula para identificar quando há dolo ou culpa em uma conduta. Adaptando a “teoria do F” para este ambiente, haverá culpa quando o agente não quiser “ferrar”, mas acabar “ferrando”, por outro lado, haverá dolo, quando o agente querer “ferrar”, e “ferrar” intencionalmente.
O Estado, pela “teoria do F”, me parece que sempre está agindo com dolo nas suas condutas. Parece que há um certo desejo do governo em cobrar mais impostos, em ver a sociedade mais submissa, mais dependente, mais incapaz de si mesma. Não é possível que só incomode a mim tudo isso.
No fim das contas, o que tenho a impressão é permanecemos pra sempre no mesmo ciclo: o governo sufoca a população com mais impostos, a população paga e no fim, nós não vemos esses impostos retornando em ações concretas e eficientes para o povo, mas pelo contrário, ficamos satisfeitos com a entrega de serviços as minguas; Passaram se séculos e os métodos só evoluíram e se modernizaram, só mudaram as coroas, antes douradas, produzidas com o ouro da colônia, e agora, está cravejada de ideologia e privilégios. E nessa história, o único confortável mesmo, é o próprio governo, que agora quer mais do apenas o quinto dos infernos.
Mateus Ferraz Sttuqui
Técnico em Administração e Graduando em Direito
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