Especialista de si

Existe um assunto sobre o qual você sabe mais do que qualquer outra pessoa no mundo. Qual assunto? Você.

Você sabe sobre si mais do que qualquer outro ser humano. Não há quem possa superar seus conhecimentos acerca de si. Nenhum outro indivíduo pode medir conhecimentos com você quando o tema é você, você mesmo.

No entanto, uma questão apriorística deve ser levantada: você tem se auto-conhecido? A prática do auto-conhecimento é o exercício fundamental do próprio ser. Conhecer-se é viver, realmente. Daí decorre que quem não se conhece, não vive propriamente; apenas existe, como mamífero. Sem o esforço diário da auto-descoberta significante (saber-se para entender-se e, então, compreender-se), nós não somos nada além de primatas com um cérebro mais robusto. Não passamos de um sistema digestivo onívoro ambulante, impulsionado pelo bipedismo.

Neste sentido, a clássica afirmação socrática do “conhece-te a ti mesmo” é uma ordem humanizadora. É mais que uma lei em favor da razão: é uma norma de capacitação humana: quanto mais você se perscruta, mais você perscruta a humanidade. Quanto mais você e eu, partes que somos do todo que é a humanidade, nos analisamos; quanto mais nos expomos à auto-dissecação do nosso espírito; quanto mais exploramos os rincões da nossa alma: mais nos tornamos humanos e menos animais, na acepção negativa, meramente biológica e instintiva, da palavra.

E é aí que ressurge a necessidade de sermos nossos maiores especialistas. Por mais que seus pais, cônjuge, irmãos, primos, amigos, etc, conheçam muito sobre você, ao menos potencialmente é você quem mais e melhor está capacitado para ser especialista de si. Seus conhecimentos acerca do seu funcionamento físico e metafísico superam tremendamente aquilo que os outros sabem a seu respeito. Parafraseando o ditado, só você realmente detém a consciência acerca de como, onde, quando e por que seu “calo aperta” e ou desaperta. O auto-conhecimento é o portal da verdade especialmente própria, do mistério personalíssimo que todos nós custodiamos enquanto seres individuais.

Ser especialista de si é ser consciente das forças e das fraquezas, das virtudes e dos vícios, das glórias e das misérias, enfim, das dinâmicas positivas e negativas que diariamente entram em atrito dentro de nós, que se combatem na guerra interminável da “individuação”, como ensinou Jung; dinâmicas de teses, antíteses e sínteses que vão construindo nosso caráter através das luzes que jogamos contra as sombras da nossa personalidade natural.

Há um belo verso dos Salmos que roga por este auto-conhecimento. Curiosamente, o faz na linguagem empregada pela psicanálise junguiana, já citada: “Tu, Senhor, manténs acesa a minha lâmpada; o meu Deus transforma em luz as minhas trevas.” (Salmo 18:28)

E aí, você está disposto a ser especialista de si?

Autor

Dayher Giménez
Advogado e Professor