Enturmado ou brifado?
Trabalhei como auditor da Unimed por anos. Devo muito a isso. Permitiu-me conhecer melhor a profissão, os colegas, as clínicas e os hospitais. Também fiquei bastante conhecido. Cresci bastante como médico e como pessoa. Meu ciclo lá acabou-se há quase oito anos. Naturalmente perdi muitos contatos. Muita gente saiu do circuito. Muita gente nova vai chegando. Sua vez passa. Ficam as boas lembranças. A natureza funciona assim.
Uma das habilidades que desenvolvíamos era conhecer a fundo o corpo clínico de cada hospital que visitávamos. Facilitava muito o serviço. Mas só era possível porque eu fazia isso todos os dias. Dedicava-me à atividade com bastante afinco. Permitia eu me incorporar à paisagem e fazer parte do ecossistema.
Lembrei-me do fato durante a transmissão do Carnaval. Os locutores descrevem os participantes do desfile como se fossem íntimos da galera. Por estarem no ramo há muito tempo, é possível que conheçam bastante gente. Mas falam dos indivíduos como se tivessem participado de uma roda de samba na casa da pessoa, ontem mesmo! Descrevem os detalhes do desfile, do enredo e das fantasias como se não saíssem do barracão da escola de samba e tivessem feito parte do processo todo.
Há poucas semanas assisti a à cerimônia de entrega do Oscar. O locutor faz isso há algum tempo. Presumo que deva assistir a muitos filmes e conheça algo do assunto. Mas falava das fofocas dos filmes e dos atores como se tivesse acompanhado o set de filmagens de cada uma das películas. Parecia que o sujeito vivia em Hollywood.
Futebol é a mesma coisa. Os locutores transmitem jogos há décadas. Nosso calendário possui muitos jogos. Devem ter visto de tudo e em bastante quantidade. Certamente conhecem bastante gente. Mas derrapam feio quando tentam passar a sensação de que sabem tudo. Por exemplo, quando tentam pronunciar os nomes dos jogadores no seu idioma original. Sai cada barbaridade...
Mas o maior mistério de todos sempre será Paulo Salim Maluf. Não discutirei aqui sua polêmica atuação política. Mas ele chegava numa cidade e por mais inóspita que fosse, chamava um por um dos nativos pelo nome. Isso muito antes do computador, da internet e do ponto na orelha se tornar algo acessível. Virou lenda. Por dias o povo da cidade comentava sobre sua prodigalidade em conhecer e elogiar as pessoas. Todos sentiam-se importantes. Talvez nunca saibamos se ele tinha a melhor memória do mundo ou a melhor assessoria do mundo. O fato é que ele dava um show em todas as cidades que visitava.
Os que citei, são enturmados ou brifados? Um pouco dos dois? Tem muito enrolador na praça. Tentam passar a sensação de são entendidos no assunto. Parecem autoridades na matéria quando não são. Precisam estudar e se enturmar de verdade. Urgente! O nível está muito baixo.
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