Entre o comer, rezar e dançar
No próximo dia 20 de novembro, quinta-feira, celebra-se o Dia da Consciência Negra, uma data de grande relevância histórica e social no Brasil. Criada em homenagem a Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares e símbolo da resistência negra, esta data nos convida a refletir sobre a luta pela igualdade, sobre as raízes da cultura afro-brasileira e sobre o papel fundamental da população negra na construção do país.
Em Catanduva, essa reflexão se fortalece ao lembrarmos de Comadre Luíza, uma personalidade negra cuja trajetória marcou profundamente a história e a cultura da cidade. Mesmo após seu falecimento, sua memória permanece viva no carinho da comunidade, em suas contribuições e em seu exemplo de força, dignidade e presença ativa na vida social e cultural catanduvense. Comadre Luíza representa o legado e a resistência que o Dia da Consciência Negra busca preservar e honrar.
A data segue essencial na atualidade, pois nos lembra da importância de combater o racismo, promover a igualdade de oportunidades e valorizar as vozes e histórias negras que moldam nossa identidade coletiva. Celebrar o Dia da Consciência Negra é reafirmar o compromisso com uma sociedade mais justa, consciente e verdadeiramente inclusiva.
Luíza
Nascida numa senzala de açúcar na cidade de São Sebastião – RJ, no dia 24 de agosto de 1874, era filha de escravos originários da África, que quando crianças foram trazidas para o Brasil.
Como nasceu no ano de 1874, acabou se beneficiando com a Lei do Ventre Livre, promulgada em 1871.
Sete anos mais tarde, na companhia de seus pais, partiu da até então capital do país para a região de Ribeirão Preto, instalando-se em uma grande fazenda pertencente à Família Junqueira, muito influente naquela região.
Permaneceu ali por 25 anos, onde veio a conhecer João Cândido, mineiro de nascimento, também beneficiado da Lei do Ventre Livre, com quem depois de um rápido namoro veio a casar-se, concebendo, posteriormente, três filhos: João, Sebastião e Dionízio.
Rumo ao povoado
Com a morte de seus pais, Luiza, juntamente com seu marido, começou a procurar outro lugar para fixar moradia. Inicialmente, de acordo com a vontade de João Cândido, optaram por terras localizadas em Minas Gerais; porém, por sugestões dos próprios patrões, reformularam a decisão e partiram rumo às terras do Sr. Antonio Maximiano Rodrigues, amigo de caça do Sr. Neca Junqueira.
Transportados pelo coronel José Pedro da Motta em um carro de bois, chegaram ao pequeno povoado de São Domingos de Cerradinho em 1907, para trabalhar na propriedade combinada. Vale destacar que Luiza aprendera a cozinhar muito bem com a esposa de Antonio Maximiano Rodrigues, Dona Francisca Salles de Jesus, que exercia bem muito essa arte.
Com o falecimento do marido, Luiza encontrou-se em situação difícil para criar e educar os filhos, que ainda eram crianças na época. Porém, Luiza não desanimou, arregaçou as mangas e trabalhou sério até o fim de sua vida.
Comadre
Alegre e de bem com a vida, sempre caridosa ao extremo, Luiza integrou-se rapidamente na vida comunitária, sendo indispensável sua presença em festas, já que era uma ótima cozinheira.
Nenhum trabalho doméstico lhe era estranho, porém tinha uma grande particularidade com a cozinha e adorava as crianças, trabalhando muitas vezes como babá e ama-de-leite.
Tinha o hábito de chamar todos de compadre ou comadre, passando a ser chamada carinhosamente pelos catanduvenses de Comadre Luiza.
Uma das grandes paixões de Luiza era o carnaval. Sabendo disso, muitas de suas patroas lhe davam folgas nos dias de festa, além de emprestarem roupas e adereços carnavalescos. Foi a primeira mulher catanduvense a aparecer em público com autêntico espírito carnavalesco, em 1917, nas decoradas ruas de Vila Adolfo.
Além de grande paixão pelo carnaval, Luiza tinha outra característica marcante: sua devoção religiosa. Muitos frequentadores da Igreja Matriz de São Domingos sempre a viam ajoelhada aos pés de Nossa Senhora Aparecida, além de constantes visitas que fazia aos enfermos do Hospital Padre Albino.
Como se fosse um ritual, todos os dias Luiza ia à Estação Ferroviária para observar a movimentação dos trens. Ao pressentir a saída do trem, ajoelhava-se no chão e com as mãos erguidas e olhar fixo no céu, punha-se a orar, invocando a Deus proteção aos que se encontravam no trem.
Morte
Em 25 de abril de 1943, Catanduva perdeu um de seus cidadãos mais fantásticos e simples que já existiu por aqui. Às 16 horas da tarde, Luiza deixou este mundo vítima de um colapso cardíaco que veio a sofrer, apesar de não ter lhe faltado a devida assistência médica, sendo atendida pelo Dr. Olímpio de Carvalho.
Enterrada no túmulo 11.644 no Cemitério Municipal Nossa Senhora do Carmo, há quem acredite que por intercessão da alma bondosa e querida da comadre muitas bênçãos foram recebidas para eles e para seus familiares.
Milagrosa ou não, o que se tem certeza é que nossa comadre foi uma mulher única e especial em nossa cidade.
Fonte de Pesquisa:
- Acervo do Centro Cultural e Histórico Padre Albino
Foto: O túmulo da Comadre Luiza é um dos mais visitados no Cemitério Nossa Senhora do Carmo, onde muitos atribuem a ela várias graças recebidas.
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