Édie Frey: entre a música e a política

“Tinha sete anos de idade em 1932. Existia, nessa época, um barbeiro, Sr. Guido Marguti, que tocava violino sempre aos domingos. Juntava-se, em sua casa, amigos para tocar música. Os instrumentos eram variados. Cada um trazia o seu. Eu, pequeno e com a curiosidade aguçada, chegava perto da janela da casa do barbeiro para ouvir aquele som paradisíaco.

De tanto escutar o grupo do Sr. Guido Broglia tocar nos fundos da casa, perturbei meu pai, a fim de que ele me matriculasse em uma escola de música. Descobri, por acaso, que o bondoso barbeiro era, nos dias de folga, professor particular de música. Estava feito. As aulas com ele começaram. Esforcei-me para aprender violino, escutava sermões do professor com o objetivo de aprimorar os ouvidos e as mãos”.

É com essa lembrança que Édie José Frey inicia seu livro Tempos de Ditadura – Memória, organizado pelo jornalista Felipe Boso Brida, em 2010, onde faz grandes lembranças de sua vida, principalmente dos momentos que viveu durante o Regime Militar no Brasil.

A Música

Poucos meses mais tarde de iniciada as aulas com o Sr. Guido Marguti, a família de Édie Frey mudou-se para a cidade de Pindorama, onde lá continuou tendo aulas de música, agora com o Sr. Jorge Galati, importante maestro nascido na Itália e autor da notória valsa Saudades de Matão, composta por ele em 1964.

De volta a Catanduva, no ano seguinte, teve aulas particulares com Orlando Puzzoni, maestro dedicado e também importante para sua carreira. Puzzoni era regente da Lira Musical Flor de Sumaré e tocava em programas de rádio.

A partir das aulas com Puzzoni, Édie foi se aprimorando cada vez mais na arte musical e se apresentando em vários locais: inscreveu-se em cursos de músicas em São José do Rio Preto, tocava em eventos da região, treinava dia e noite em sua casa, entre outras tantas atividades relacionadas a música.

Se dedicou por mais de 50 anos à música e conheceu pessoas essenciais para o seu crescimento profissional e humano.

Entrada na Política

Édie entrou na política motivado por escritores brasileiros e estrangeiros que tratavam o assunto com seriedade. Além disso, teve influência de seu pai, José Augusto Norberto Frey, que havia sido vereador em Catanduva, em 1950, e presidente da Câmara em 1951.

Mesmo sendo de partidos opostos – Édie era do PR (Partido Republicano) e seu pai do PSP (Partido Social Progressista) – rivais na ideologia, sempre se respeitavam, apenas não compartilhando o mesmo pensamento político.

Mesmo crescido um uma família cuja ética tinha como princípio o exercício da cidadania, Édie exerceu seu cargo de vereador por apenas três meses, pois foi afastado por consequência do Regime Militar no Brasil.

Dias amargos

Líder militar articulador do Golpe de Estado, em 1964, marechal Castelo Branco, ao assumir o governo no Brasil, rapidamente baixou o Ato Institucional Nº 1 (AI-1). Os militares contaram com o apoio dos governadores Magalhães Pinto, de Minas Gerais, Adhemar de Barros, de São Paulo, e Carlos Lacerda, do Rio de Janeiro. O pretexto era o combate à corrupção e à subversão.

Nessa época, Édie exercia a função de diretor do Grupo Escolar São Francisco, e, punido pelo Ato Institucional Nº 1, perdeu o cargo, conforme os artigos 7º e 10º do referido AI, que suspendia por seis meses as garantias constitucionais ou legais de vitaliciedade e estabilidade de políticos e professores.

Em relação à sua campanha política, Édie contou com o apoio de Júlio Verna, influente líder comunista, que, inclusive, colocou na rua um pequeno caminhão que fazia propaganda, com os seguintes dizeres: “Vote em Frey Nº 111”. Obteve, também, a indispensável ajuda do amigo e professor Milton Januário que, como presidente da Associação dos Acadêmicos de Catanduva, lançou um manifesto em favor de sua candidatura, o qual era colocado debaixo das portas das residências a fim de divulgar o trabalho do então candidato.

Foi ainda apoiada por Pedro Soto, que chegou a distribuir folhetos às irmãs de caridade dizendo que em nossa cidade existia um candidato a vereador que era um “frei”.

Os 90 dias

Édie Frey exerceu o cargo de vereador por apenas três meses. De 1º de janeiro a 1º de abril de 1964. Nesse ano, foram eleitos, além dele, mais 18 vereadores: Amil Zackia, Angelo Mestriner, Antônio Díspore, Antônio Fernandes Leão, Antônio José Miranda, Carlos Machado, Constante Frederico Ceneviva, Eder Pedro pellizzon, Gabriel Hernandez, Guido Broglia, Gregório Rodrigues Gil, Libano Pachá, Lúcio Cacciari, Paulo Cretella Sobrinho, Pedro Cedin, Pedro Nechar, Venâncio Lima Ferreira e Waldo Chimello.

A primeira manifestação pública da nova Câmara Municipal, empossada no dia 14 de janeiro de 1964, se deu por meio de um requerimento de Édie apoiando o presidente João Goulart pela campanha em favor às Reformas de Base. Por causa desse posicionamento, foi penosamente criticado por grande parte dos vereadores e por um número infinito de catanduvenses.

Também apresentou outros projetos de relevância, inclusive um tornando de utilidade pública a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE).

Libano Pachá e Édie Frey foram eleitos pelo Partido Republicano – PR. Entre inúmeras proposições, além do requerimento manifestando apoio ao presidente João Goulart, apresentou requerimento, com os vereadores Lúcio Cacciari, Antônio José Miranda e Gabriel Hernandez, cumprimentando Jango pela edição da Lei de Remessa de Lucros.

Como vereador, eleito em 1964 pelo PR, Édie integrou a bancada que dava apoio ao prefeito José Antônio Borelli. Apresentou diversas proposituras na Câmara, entre as quais voto de apoio ao Movimento Popular de Cultura de Catanduva. Além disso, fez um requerimento para que fosse constituída uma comissão para disciplinar a distribuição de bolsas de estudo da prefeitura e outro solicitando a constituição de uma Comissão de Biblioteca. Outros

requerimentos de sua autoria solicitavam reforma de vários prédios municipais ocupados por estabelecimentos de ensino e de júbilo pela recente instalação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Catanduva.

Fonte de Pesquisa:

- Livro Tempos de Ditadura – Memória, de Édie José Frey, organizado por Felipe Boso Brida, Editora Komendi, Campinas – SP, 2010.

 

FOTOS:

Foto de Édie Frey junto com sua filha Silvana Campaneli Frey. Édie, enquanto político, ficou apenas três meses como vereador, pois foi impedido por causa do Regime Militar no Brasil

Édie teve influência de seu pai, José Augusto Norberto Frey (foto), em sua entrada na política que havia sido vereador em Catanduva, em 1950, e presidente da Câmara em 1951

Édie José Frey e Felipe Boso Brida em noite de lançamento do livro Tempos de Ditadura – Memória, onde Édie faz relembranças de vários momentos de sua vida, principalmente daqueles que passou preso durante o Regime Militar no Brasil

Autor

Thiago Baccanelli
Professor de História e colunista de O Regional.