É uma brasa, mora?

Neste mês, comemoram-se os 60 anos de lançamento do programa “Jovem Guarda”, exibido pela TV Record. Era apresentado pelo trio Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa. Com forte apoio das gravadoras e intensa campanha publicitária, virou um fenômeno de audiência. Eram influenciados pela batida do Rock and Roll, pelo soul da gravadora Motown, pelos Beatles e por Elvis Presley. Enquanto movimento cultural, caracterizava-se por uma mescla de música, comportamento, vocabulário e moda.

As canções tinham melodias e letras simples. Os temas eram românticos e açucarados. Tratavam de amor e do cotidiano dos jovens. Inicialmente, os cantores e compositores começaram a fazer versões de músicas do rock britânico e norte-americano. Por vezes, os fãs pensavam que eram canções de autoria dos próprios cantores. No entanto, as letras em português muitas vezes eram diferentes e não uma tradução fiel do original. Depois, numa segunda fase do movimento, começaram a compor suas próprias canções.

A moda era caracterizada pelas calças “boca-de-sino” (largas na barra), cores vibrantes, camisas estampadas e coladas ao corpo, minissaias, muitas vezes usadas com botas de cano alto, jaquetas de couro, cabelos com franjas, à moda dos Beatles. Completavam o visual os óculos escuros, anéis, lenços coloridos e correntões.

O vocabulário era pontuado por gírias. As principais eram “é uma brasa, mora?” (algo que é muito bom), “tremendão” (alguém incrível), “carango” (carro bom), “broto” (moça bonita), “pão” (moço bonito), “barra limpa” (algo sem problemas, seguro), “papo firme” (conversa séria, sem rodeios), “legal” (algo bom), “mora?” (entende?), “coroa” (pessoa mais velha).

Além de Roberto, Erasmo e Wanderléa, o movimento contou com Ronnie Von, Eduardo Araújo, Wanderley Cardoso, Martinha, Vanusa, Leno e Lilian, Jerry Adriani, dentre outros. As principais bandas eram Golden Boys, Renato e Seus Blue Caps, Os Incríveis, Os Vips e The Fevers. Com o fim do movimento, Sérgio Reis migrou para a música sertaneja de estilo urbano. Poucos, como Erasmo Carlos, permaneceram no rock. A maioria enveredou para a música romântica, frequentemente tachada de “cafona” (mau gosto, brega, sem refinamento).

A Jovem Guarda ou iê-iê-iê sofria um forte preconceito da crítica por não ser engajada politicamente. Curiosamente, reza a lenda que o nome Jovem Guarda surgiu inspirado em uma frase do líder soviético Wladimir Lênin: “O futuro pertence à jovem guarda porque a velha está ultrapassada”. O movimento acabou praticamente junto com o fim do programa homônimo. Roberto Carlos decidiu parar para se dedicar à carreira solo. Como legado, introduziram o Rock no Brasil, a guitarra, o órgão Hammond e influenciaram uma nova geração de artistas. Sem dúvida, um movimento “prafrentex”.

Autor

Toufic Anbar Neto
Médico, cirurgião geral, diretor da Faceres. Membro da Academia Rio-pretense de Letras e Cultura. É articulista de O Regional.