É Neura Minha
Já escutamos alguém falar a expressão “é neura minha”, indicando o quanto já estivemos “encucados” com algum pensamento, situação ou afeto.
Embora este termo seja “popular”, em sua etimologia estamos falando dos neuróticos, e sua descrição se caracteriza a partir de uma divisão que separa a representação do afeto, e o que caracteriza os tipos clínicos é o destino deste afeto que se desligou de uma ideia.
As pessoas consideradas neuróticas manifestam na maioria das vezes sentimentos e pensamentos à flor da pele relacionados a questões emocionais-afetivas, estando permanentemente num conflito psíquico que as impedem de aproveitar a vida de forma prazerosa. Este sintoma geralmente tem início na infância e as acompanham por toda a vida. São pessoas que possuem grandes apreensões sobre tudo a sua volta e são emocionalmente vulneráveis, não reagem bem a mudanças ou críticas.
Dentro do campo das neuroses há basicamente três grupos de categorias pelas quais os processos de defesa se desenvolvem: a histeria, a obsessão e a fobia.
Na histeria a neurose se manifesta no corpo num processo chamado conversão, e pode ocorrer perturbação mental, um estreitamento no campo da consciência ou alterações motoras e sensoriais onde o indivíduo acaba por “encenar” doenças como forma de escapar de algumas situações que considera insuportável para si, relacionados a lembranças reprimidas de grande valor emocional.
A neurose obsessiva é definida a partir da presença de sintomas como distúrbios do pensamento e ideias repetitivas que provocam sofrimento e atos compulsivos: lavar as mãos excessivamente, voltar para ver se a porta está trancada, e invasão na mente de imagens, ideias ou palavras onde pensar que algo pode acontecer desperta angústia e medo que o faz recuar. É o reflexo de nossas vivências, traumas e recalques sendo seus sintomas uma expressão simbólica de um conflito psíquico.
Na fobia a manifestação se dá pelo medo, seja ele de determinados lugares, objetos ou situações e se caracteriza pela fixação da angústia num pavor desproporcional ao perigo que acaba provocando reações incontroláveis fazendo a pessoa evitar situações, tendo permanentemente atitude de fuga, estando sempre em estado de alerta.
Freud ao desenvolver a teoria psicanalítica deu um significado ao termo como sendo o modo como o indivíduo se relaciona com seus desejos e contradições em que a neurose se caracteriza como resposta a eventos que foram recalcados e reprimidos como estratégia mental de defesa, relacionados a um ou mais momentos específicos da formação da personalidade, ligados a sexualidade e relacionado a questões corporais e de origem somática.
Atualmente muitas neuroses obsessivas estão ligadas ao que Freud chamou de caráter anal, manifestadas em pessoas inescrupulosas, controladoras, inflexíveis, e isto acontece por se ter a falsa ideia que ser assim traz conforto, não dando espaço ao novo, ao imprevisto, sendo descrita como a doença da culpa onde o indivíduo cria situações e pretextos para viver neste funcionamento: tem medo do desejo exatamente porque não quer correr riscos, tendo dificuldade de estar na dúvida. Outro traço marcante são as relações ambivalentes onde o obsessivo tem dificuldade em unir o seu amor ao desejo por medo do desamparo, passando do amor ao ódio, a cortes abruptos, muito típico no campo das perdas. Outro traço seria a formação reativa em que o indivíduo discursa de um jeito e age de outro. Outro exemplo seria quando o indivíduo se isola por não querer entrar em contato com o outro, agindo de forma fria, seguindo regras que estabeleceu a si para não se ligar ao afeto por ter medo da troca que existe no amor.
Não existe cura em suas manifestações, mas ao entrar em contato em psicoterapia com estes sentimentos, emoções e angústias, o paciente encontrará a origem de seu sintoma, e o manejo clínico o ajudará a entender quais questões fazem com que ele tenha este tipo de comportamento. Aos poucos, seus sintomas tendem a melhorar, por isto é necessário tratamento.
Música: “Littlest Things” com Lily Allen.
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