Divorciar do Brasil

Toda vez que alguma notícia choca, ouço de várias pessoas que desejam sair do Brasil. Pode ser por um crime bárbaro, um ato de corrupção descoberto, um privilégio exposto, a crise moral em que nos encontramos, a piora da crise econômica e da pobreza ou a crise política que não acaba. Não importa o motivo. A sentença é quase sempre a mesma: “não dá mais, vou embora deste país”.

E aí, as pessoas começam a vaticinar sobre o que seria a vida num país civilizado, convivendo com pessoas evoluídas. Falam de Portugal, onde tem todos os benefícios da Europa e falam o nosso idioma. Falam da civilidade da Inglaterra e da Irlanda, destino predileto dos descolados. Cantam loas à França, terra dos queijos, dos vinhos e dos direitos humanos. Loas à Itália, que, dizem ser o Brasil na Europa. Falam ainda dos países frios, como o Canadá, onde neva, em contraponto a este Brasil de clima infernal. Falam principalmente dos Estados Unidos, a pátria da democracia moderna e da liberdade individual.

E as pessoas caem numa perigosa armadilha. Uma coisa é curtir as maravilhas de uma estadia num bom hotel, com dinheiro no bolso e tempo livre para passear e sem hora para nada. Isso tudo gera uma visão idealizada do exterior. Outra, é amargar o cotidiano frio, anônimo e solitário de ser um estrangeiro.

Conheci um médico que viveu toda a sua carreira nos Estados Unidos. Aposentou-se lá. Disse-me que depois de 30 anos, mesmo fluente e estudioso da gramática inglesa, os americanos percebiam que ele era estrangeiro. Não adianta negar, seremos sempre “de fora”. Seja onde for, existe discriminação na prática e no cotidiano. Tente disputar uma vaga de emprego com um nativo para perceber o que estou falando. Este cenário certamente piora quando adentramos ao interior do país, que em todo lugar é mais conservador do que as grandes cidades e capitais. Os salários médios dos imigrantes também são menores se comparados ao dos nativos.

É um erro acharmos que seremos recebidos como os imigrantes o são no Brasil. Para o brasileiro tanto faz. Em muitos dos países civilizados o imigrante é encarado como ameaça ao nativo.

Os costumes não são iguais. A comida é diferente. O tempero é diferente. Conforme o lugar, a comida tem gosto de plástico. As leis trabalhistas não protegem os estrangeiros. Você não convive mais com sua família e seus amigos.

Sim, o Brasil tem encrencas aos montes. Algumas, a meu ver, quase sem solução e outras que certamente demorarão 2 ou 3 gerações para consertar. Mas, por mais problemas que tenhamos, é melhor ficarmos e construir um novo Brasil do que tentar a vida lá fora, onde nem tudo é glamour. Não tem essa que aqui é o inferno e lá fora o paraíso.

Tenho a impressão de que seria mais um caso em que o divórcio acaba ficando pior do que o casamento.

Autor

Toufic Anbar Neto
Médico, cirurgião geral, diretor da Faceres. Membro da Academia Rio-pretense de Letras e Cultura