Desfavelamento em Catanduva (III)

Durante os dois últimos domingos, essa coluna retratou várias etapas do processo do desfavelamento em Catanduva. No dia de hoje, no qual o assunto será finalizado, inicio relatando o papel que a Igreja Católica teve dentro do processo.

Em março de 2001, o Bispo Diocesano de Catanduva, Dom Antônio Celso de Queiroz, visitou o prefeito Félix Sahão Júnior, questionando sobre a previsão de início das obras do desfavelamento. Naquele momento, as Igrejas Católicas da cidade criaram uma Pastoral para auxílio nos trabalhos do projeto do desfavelamento e seus membros estavam à disposição do projeto para auxiliá-lo em todos os tipos de trabalho, desde o social até a mão de obra.

Após as colocações do bispo diocesano, o prefeito convocou em seu gabinete todos os representantes das Secretarias de Governo, envolvidos com o projeto. Durante a reunião, o secretário de Obras, Serviços e Meio Ambiente, Nilton Marto Vieira da Cruz, salientou que faltava apenas a ligação de energia elétrica no local, para o início das obras, mas, que, de acordo com o engenheiro responsável da CNEE - Companhia Nacional de Energia Elétrica - a energia estaria no local em poucos dias. Após a ligação de energia elétrica, Nilton relatou que o trabalho de construção do barracão de madeira que servirá como canteiro de obras e a realização de um mutirão de limpeza dos lotes seria iniciado.

Pastoral da Favela Divina Providência

Criada em julho de 2000, com a vinda de Dom Antônio Celso de Queiroz para a diocese de Catanduva, a Pastoral da Favela Divina Providência tinha por objetivo reconhecer, nas pessoas que moravam na favela, sua dignidade fundamental de filhos de Deus.

Diante disso, a Pastoral visitava a favela procurando criar um vínculo de amizade, ouvindo moradores e atendendo a alguma necessidade mais urgente. No Projeto Desfavelamento, a Pastoral servia, aos sábados e aos domingos, refeições fornecidas pelas paróquias, para moradores da favela que trabalhavam em regime de mutirão na construção de suas casas.

“O café da manhã também é servido graças à generosidade de pessoas e de algumas padarias. Na favela da rua Mococa, aos domingos, entre 08h30 e 10h30, está sendo feito um trabalho com as crianças de catequese e recreação, sendo também servido pão com margarina. Atualmente, a Pastoral está promovendo uma campanha de móveis usados, para serem doados aos moradores da favela quando mudarem para o Jardim Eldorado, onde estão sendo construídas as casas”, trazia O Jornal, de 28 de outubro de 2001.

Dez casas prontas no Jardim Eldorado

Em 10 de maio de 2001, o jornal O Regional trazia que “(...) o programa de Desfavelamento da Prefeitura Municipal está em andamento no Jardim Eldorado e dez casas já foram erguidas pelos futuros moradores do local”. De acordo com o secretário municipal de Obras, Nilton Marto Vieira da Cruz, no local serão construídas 300 unidades habitacionais, que deverão estar prontas em um ano e meio”.

Em outubro do mesmo ano, o mesmo jornal trazia a previsão de entrega de mais 160 casas para o mês de maio de 2002 e 100 casas se encontravam em fase de cobertura e de respaldo, concluindo, assim, a primeira fase. A Secretaria de Obras fez uma estimativa para janeiro de 2002 iniciar o serviço de implantação de água e esgoto, visando as 140 novas moradias.

Em agosto de 2003, a maioria dos moradores da favela do Parque Iracema não acreditavam que o Projeto Habitacional Eldorado seria concluído até o final do ano, prazo estipulado pela prefeitura. “Falaram que iam entregar em junho e não foi. Agora estão dizendo que é para o final do ano, mas não estamos contando mais com isso”, relatou futuro morador em reportagem do jornal O Regional, de 02 de agosto de 2003.

Chave na mão e barraco no chão

“Chaves nas mãos e barracos no chão.” Essa era a ordem da CDHU, que deveria ser seguida à risca pela Prefeitura de Catanduva, que ficou encarregada de destruir os barracos instalados no Parque Iracema.

“A prefeitura está montando uma operação de logística para ajudar a fazer mudança e, simultaneamente, desmanchar o barraco”, explicava o secretário Bittencourt, em matéria de 17 de dezembro de 2003, neste matutino, acrescentando que “(...) O objetivo é que nenhuma outra família se instale no barraco da contemplada com a casa. Infelizmente, temos alguns terrenos onde estão parte dos barracos da favela que não pertencem à prefeitura. Mas temos certeza que os proprietários não vão ter interesse em continuar com aqueles barracos”.

Para as famílias moradoras da favela e que não foram contempladas com as casas, em razão de não se encaixarem nas exigências da CDHU, Bittencourt disse que elas não ficariam desamparadas. “A Assistência Social da prefeitura já está estudando outro local para abrigar essas famílias”.

Entregas das chaves

“No próximo dia 23 de dezembro, às 10h00, praticamente na véspera de Natal, Catanduva vai resgatar uma dívida social de mais de três décadas. As famílias que habitam os dois maiores bolsões de pobreza da cidade estarão ganhando endereço, dignidade e cidadania. O governo de Catanduva convida a população para presenciar este marco na história da cidade e o início de um novo momento na vida de 300 famílias”, trazia o Jornal Realidade, de 20 de dezembro de 2003.

Na quarta-feira anterior, dia 17, já era possível observar intensa movimentação de caminhões e trabalhadores no local (ao lado do Bom Pastor), que finalizavam a colocação de massa asfáltica nas ruas, a colocação da caixa d’água e outras providências que eram tomadas. Na sexta-feira, dia 19, em meio a uma alegria antecipada, aconteceu a entrega das chaves, através de sorteio e a devida ligação dos hidrômetros de água e dos relógios de força.

Para justificar a entrega das 300 casas do Projeto de Desfavelamento, mesmo com o local em estado precário e sem a devida infraestrutura necessária, a secretária municipal de Assistência Social, na época, Maria Cecília Jorge, disse que o objetivo da prefeitura era o de marcar a data e entregar as 300 casas antes da comemoração do Natal.

Desamparados

Durante a manhã do dia 24 de dezembro de 2003, funcionários da prefeitura e da CDHU corriam contra o tempo para agilizar moradia para cerca de 40 famílias que viviam nas favelas e que não foram contempladas com as casas do projeto. Em alguns casos, de acordo com o representante do CDHU, as questões foram encaminhadas à Justiça. Entre eles, casos de famílias que ameaçavam construir uma nova favela em Catanduva se não conseguirem uma casa.

“Na maioria dos casos, são famílias que nós caracterizamos de um membro só. São maridos e mulheres que se separaram durante o processo de inscrição e entrega das moradias. Essas pessoas deverão resolver essas questões na justiça”, explicou Polimeno. Outra solução encontrada para resolver o problema da falta de moradia foi encaminhar pessoas para morar com parentes.

Fonte de Pesquisa:

- Jornal O Regional, de 11 de março de 2001; de 10 de maio de 2001; de 02 de agosto de 2003; de 17 de dezembro de 2003.

- O Jornal, de 27 e 28 de outubro de 2001.

- Jornal Realidade, de 20 de dezembro de 2003.

- Material pesquisado no acervo do Centro Cultural e Histórico Padre Albino.

Fotos:

Criada em julho de 2000, com a vinda de Dom Antônio Celso de Queiroz para a diocese de Catanduva, a Pastoral da Favela Divina Providência tinha por objetivo reconhecer, nas pessoas que moravam na favela, sua dignidade fundamental de filhos de Deus

Em muitos momentos, moradores desacreditaram na entrega das casas em datas estabelecidas pela prefeitura. “Falaram que iam entregar em junho e não foi. Agora estão dizendo que é para o final do ano, mas não estamos contando mais com isso”, relatou futuro morador em reportagem do jornal O Regional, de 02 de agosto de 2003.

No Projeto Desfavelamento, a Pastoral servia, aos sábados e aos domingos, refeições fornecidas pelas paróquias, para moradores da favela que trabalhavam em regime de mutirão na construção de suas casas. Na imagem, trabalhadores construindo casas no Jardim Eldorado

Autor

Thiago Baccanelli
Professor de História e colunista de O Regional.