Desenvolvimento e Perdas

Em meio a todos os acontecimentos deste ano, algumas famílias vão se renovando, enquanto outras vão se desgastando.

Seria ingênuo acreditar que a discussão nasce de uma simples incompreensão ou dificuldade em lidar com perdas. Infelizmente, o cenário vivido na política e no futebol afeta a todos nós, está longe de acabar, e diz respeito a como fomos ensinados a nos comportar diante das dificuldades e perdas.

Nascer no país do futebol e estar num ano que teve eleições, nos faz conviver rotineiramente com a troca de farpas entre torcedores, partidos, eleitores, que sempre tem uma justificativa para manter sua posição, alguns com dificuldade para aceitar os resultados.

Desde o nascimento, nossas experiências simbólicas representam algo muito importante, capaz de desenhar nossa estrutura física, mental, emocional e espiritual. No curso do desenvolvimento, a maior razão para o sofrimento psíquico da criança é a impossibilidade dela poder estabelecer uma comunicação emocional e profunda com um adulto significativo. Seus responsáveis, precisam olhar, decodificar e atender com “coerência” suas demandas. Atitudes assim, só contribuem para que ela seja o adulto que nossa sociedade necessita, com clareza para entender o que se passa, e disposição para aceitar as perdas. Educar é também ensinar o filho a se adaptar, este que talvez seja um dos maiores ganhos do aprendizado: aprender a se adaptar, a lidar com perdas, e ter alguém que o compreenda para que depois na vida adulta ele seja alguém que consiga compreender.

As crianças desde sempre percebem muito mais os entornos do que podemos imaginar, e como nos comportamos, serve de referência para a formação delas, sendo nós seus primeiros modelos. Nossa maneira de ser e agir, influencia e determina a identidade e a construção de sua personalidade, esta que fica à mercê da convivência que se estabelece, e o desenvolvimento emocional dos filhos só tem a ganhar quando delimitamos os espaços entre o que queremos e o que podemos, o ideal e o real, enfrentando todas as situações como adultos e sendo modelo.

O interessante na educação não é ter sempre momentos felizes, confortáveis e de vitórias, e sim, momentos de construção em meio às dificuldades. É como os filhos deveriam se virar frente às adversidades, quando as coisas não saem do jeito que estavam esperando, e para que isto aconteça eles precisam de modelos.

Se assim não for, os filhos serão adultos permanentemente fragilizados, infantilizados, incapazes de se posicionar com determinação e clareza frente aos fatos, sempre com dificuldade em aceitar as perdas, adultos birrentos.

Tempos difíceis e situações adversas revelam muito sobre nós. E como nos comportamos, determinam como queremos ser e viver frente à vida que pensamos para nós e nossos descendentes.

Penso que todas as situações vividas neste ano deixarão marcas que não serão necessariamente ruins. Nem sempre o adverso é prejuízo enquanto transformamos dificuldades em fonte de aprendizado, crescimento, compreensão e reflexão.

Estamos fora da Copa, encontrando justificativas para escolher em quem torcer na final, nos preparando para as festas de fim de ano, e para iniciarmos o ano com um novo presidente.

Foram muitos os acontecimentos que nortearam 2022, estes que marcarão a história para sempre.

As festas de fim de ano vão coroar tudo o que vivemos este ano, certamente será assunto em muitas ceias. E o mais importante de tudo o que vivemos, é se conseguirmos nos manter amigos mesmo tendo opiniões, times e partidos diferentes.

Este texto foi escrito ao som da música “Autumn In New York” com Ella Fitzgerald e Louis Armstrong.

Autor

Claudia Zogheib
Psicóloga clínica, psicanalista, especialista pela USP, atende presencialmente e online. Redes sociais e sites: @claudiazogheib, @augurihumanamente, @cinemaeartenodivã, www.claudiazogheib.com.br e www.augurihumanamente.com.br | Foto: Renato F. de Araujo @renatorock1 ©