CINEMA EM FOCO - 19.12.23

Os bárbaros

Dois irmãos gêmeos, Gore e Kutchek (David e Peter Paul), são adotados quando crianças por uma tribo, os Ragnicks, que mora num povoado tranquilo no meio das cavernas. Um dia, um maligno senhor da guerra, Kadar (Richard Lynch), invade o local, trucida com os moradores e rapta os irmãos, preparando-os para serem gladiadores. Até que uma disputa por um rubi sagrado fará Gore e Kutchek entrar em uma jornada inesperada com muitos perigos.

Filme B que divertiu uma juventude inteira nas sessões da tarde, uma coprodução EUA/Itália de aventura com guerreiros e monstros numa civilização perdida. Por isso o filme não tem um tempo certo, é uma fantasia maluca entre a Idade da Pedra e a Idade Média, sem preocupação com a História – há neandertais, arena de gladiadores do Império Romano, cavaleiros das Cruzadas e monstros mitológicos – ou seja, um mundo um tanto distópico e estranho.

É um filme descontraído para ver sem exigências, sem reclamar dos canastrões que desfilam na tela. Dois deles são os irmãos gêmeos protagonistas, David e Peter Paul, fisioculturistas e ex-lutadores de luta livre, que depois fizeram filmes de comédia e ação como ‘Confusão em dobro’ (1992) e ‘Duas babás nada perfeitas’ (1994) – David faleceu em 2020, enquanto Peter continua se apresentando na TV. Richard Lynch faz um vilão, um violento senhor da guerra – o ator fez mais de 150 filmes, muitos como antagonista, como ‘Invasão U.S.A.’ (1985).

O filme deu prejuízo na época e foi mal-recebido pela crítica. Todo rodado na Itália (para ter custo de produção mais baixo), conta com figurinos reaproveitados de uma fita parecida, ‘Guerreiros de fogo’ (1985), com Arnold Schwarzenegger. A trilha sonora é do italiano Pino Donaggio, de ‘Vestida para matar’ (1980).

Outro italiano era o diretor, Ruggero Deodato, falecido recentemente, que assinou um dos trabalhos mais provocadores de terror dos anos 80, ‘Holocausto canibal’ (1980), vendido como um ‘filme proibido’, um snuff sobre canibalismo que até levou Deodato para a cadeia. Rodou nos EUA alguns longas, mas nunca deixou a Itália. ‘Os bárbaros’ é seu longa mais popular e cultuado, lançado recentemente em DVD pela Obras-primas do Cinema com boa cópia.

Os bárbaros (The barbarians). EUA/Itália, 1987, 87 minutos. Ação/Aventura. Colorido. Dirigido por Ruggero Deodato. Distribuição: Obras-primas do Cinema

O dentista

Dr. Feinstone (Corbin Bernsen) é um dentista conceituado que vive com a esposa numa mansão. Quando flagra a mulher traindo-o com o jardineiro, entra em parafuso. Ele desenvolve uma estranha forma de se livrar desse trauma: matando seus clientes na cadeira de dentista.

A distribuidora Obras-primas do Cinema acaba de lançar uma edição especial com os dois filmes de terror da franquia ‘O dentista’, feitos entre 1996 e 1998. É um disco em DVD, envolto numa luva especial, com capa dupla face e trailers como extra. Ambos os filmes, B, misturam terror, um slasher gore, com sadismo e humor negro, com um Corbin Bernsen sinistro como o protagonista. Ele é um maníaco perturbado pela traição da esposa, que passa a matar pessoas dentro e fora do consultório, com requintes de crueldade.

Há cenas de tortura com instrumentos odontológicos, com aquele motorzinho chato arrebentando os dentes e as gengivas dos coitados – quem tem aflição não deve ver. Como não lembrar de uma cena icônica do cinema, que deve ter inspirado o diretor Brian Yuzna (de ‘A sociedade dos amigos do diabo’), a de Dustin Hoffman sendo aterrorizado na cadeira de dentista pelo maquiavélico nazista interpretado por Laurence Olivier no fantástico thriller ‘Maratona da morte’ (1976)?

Com enquadramentos tortuosos que dá dor de cabeça, repleto de plongée e contra-plongée, ‘O dentista’ fez sucesso na época do home vídeo e ganhou continuação dois anos depois, com mesmo diretor e elenco.

O dentista (The dentist). EUA, 1996, 92 minutos. Terror. Colorido. Dirigido por Brian Yuzna. Distribuição: Obras-primas do Cinema

O dentista 2

Internado num sanatório por ter matado seus pacientes no consultório, o sádico dentista Feinstone (Corbin Bernsen) foge de lá, muda de identidade e instala-se em uma cidadezinha do interior. Tenta uma nova vida, mas a vontade de matar aumenta. Ele então passa a tocar o terror em sua nova clínica odontológica.

Com mais humor negro e mortes mais violentas, com muita sangueira, ‘O dentista 2’ causa furor e aflição com suas sequências de tortura e assassinato no consultório odontológico. Corbin Bernsen retorna com mais loucura no papel-título, o cruel dentista que depois de fugir do sanatório, tenta uma nova vida, mas a vontade de matar é maior.

Brian Yuzna retorna também na direção – o diretor filipino consolidou-se como em filmes de terror B, no fim dos anos 80 com o ‘A sociedade dos amigos do diabo’ (1989), depois ‘A noiva de Re-Animator’ (1990), ‘Natal sangrento 4 – A iniciação (1990), ‘A volta dos mortos-vivos 3’ (1993), um dos segmentos de ‘Necronomicon – O livro proibido dos mortos’ (1993) e outros.

Saiu em DVD na edição especial com o filme anterior, lançado pela Obras-primas do Cinema. Cuidado com a classificação indicativa – 18 anos!

O dentista 2 (The dentist 2). EUA, 1998, 99 minutos. Terror. Colorido. Dirigido por Brian Yuzna. Distribuição: Obras-primas do Cinema

A ilha de Bergman

Na ilha de Fårö, no mar báltico, o diretor sueco Ingmar Bergman (1918-2007) abre sua casa para uma conversa com a diretora Marie Nyreröd, em que falará sobre seus filmes, os amores e a rotina.

A Versátil Home Video lançou a versão reduzida desse documentário para a TV sueca, produzido pela Sveriges Television (SVT) em parceria com a Svensk Filmindustri (SF) – esta, produziu a maioria dos filmes do diretor sueco. A versão, curta, de 83 minutos, é uma edição americana, sendo que na Suécia o telefilme saiu com 174 minutos. Mesmo com um corte bruto, conseguimos entrar na alma do cineasta e compreender seu mundo particular. Nessa longa conversa com a diretora Marie Nyreröd, Bergman, sozinho percorrendo os cômodos de sua casa na ilha de Fårö, mostra sua rotina, discute como realizou grande parte de seus filmes em sua residência, fala de seus casamentos e amores, a difícil relação com os filhos, os divórcios (que viraram motivo de tema dos filmes e também de seus tormentos) e também relembra um passado distante, de quando começou no teatro antes do cinema.

O diretor sueco, nove vezes indicado ao Oscar, dirigiu 75 filmes e telefilmes, entre 1944 e 2003, foi casado com a atriz e musa de seus longas, Liv Ullman, e na época do documentário estava com 86 anos.

O documentário vem como extra no bluray de “O sétimo selo” (1957), lançado pela Versátil há poucos anos. Atenção, pois há um filme recente de mesmo título, lançado em 2021, com Vicky Krieps, Tim Roth e Mia Wasikowska, que se passa na ilha de Fårö e faz uma homenagem a Bergman.

A ilha de Bergman (Bergman och filmen, Bergman och teatern, Bergman och Fårö). Suécia/Dinamarca/Noruega/Finlândia, 2004, 83 minutos. Documentário. Colorido/Preto-e-branco. Dirigido por Marie Nyreröd. Distribuição: Versátil Home Video

Autor

Felipe Brida
Jornalista e Crítico de Cinema. Professor de Comunicação e Artes no Imes, Fatec e Senac Catanduva