Café da Manhã

Acordar pode representar muitas coisas: sair da cama, abrir a janela, sair dos mecanismos que mantemos e que nos faz acreditar que o jeito que está sendo tem que ser para sempre. Será?

Sabemos que os mecanismos de defesa são formas que o inconsciente encontra para reprimir certos desconfortos e que são representativos de grande parte de nossas ações, ou seja, aquilo que não queremos enxergar reprimimos, deslocamos, negamos, sublimamos, regredimos como defesa para não entrarmos em contato com o que nos adoece, e utilizamos estes mecanismos mantendo a engrenagem emperrada com a finalidade de reduzir a angústia diante daquilo que não conseguimos lidar e que consideramos como ameaça. São processos que não permitem que a nossa mente encontre uma solução para conflitos não resolvidos e que a qualquer sinal de desconforto, desviamos, deixamos para depois.

Um conflito cria em nós uma certa angústia que nos motiva a ter que resolver o problema. O que acontece é que nem sempre somos capazes de resolver a situação de forma imediata e direta exatamente por eles não serem resolvidos somente pela razão. Isto acontece porque os problemas pessoais tem sempre um envolvimento emocional que diminui nossa capacidade de discriminar e enxergar a situação, consequentemente nos levando a resolver as coisas de maneira tortuosa ou deixando para depois, buscando processos adaptativos que chamamos de mecanismos de defesa. A base é sempre a angústia, e quanto mais angustiados estamos, mais profundos serão os mecanismos ativados.

No que diz respeito ao café da manhã, sendo esta a primeira refeição que acontece depois de uma noite de sono, diz respeito a um importante momento em que nos preparamos para o dia, talvez um momento em que nos lembramos dos incômodos e das situações que temos que resolver.

Se deixamos para depois ou para que os outros resolvam algo que é nosso, corremos o risco de continuar num funcionamento destrutivo, permanecendo numa trama inconsciente que nos mantém cativeiros de nós mesmos e que nos deixa cada vez mais sem coragem para enfrentar o imbróglio que paralisa a engrenagem.

Outro ponto a considerar quando reprimimos os desconfortos deixando para depois, é o fato que o tempo não para esperando que estejamos próximos de nós mesmos a ponto de nos acessarmos.

O café da manhã tem destas coisas, acorda, às vezes desperta e nos faz pensar sobre.

Este texto foi escrito ao som da música “Baby” com Os Mutantes, Tecnicolor.

Autor

Claudia Zogheib
Psicóloga clínica, psicanalista, especialista pela USP, atende presencialmente e online. Redes sociais e sites: @claudiazogheib, @augurihumanamente, @cinemaeartenodivã, www.claudiazogheib.com.br e www.augurihumanamente.com.br | Foto: Edgar Maluf @edgar.maluf ©