A vida seria tão sem graça sem você. Percebi assim que foi embora
A ausência não é mero vazio: é presença invertida, mais tangível que a própria realidade que a precedeu. No paradoxo da perda, descobre-se que só o nada possui consistência.
A expectativa da realidade é invariavelmente adornada por otimismo, mas esse otimismo não passa de um disfarce para a tragédia reiterada da experiência. A cada novidade, confirma-se que somos constituídos por altruísmos trágicos: sacrificamos o essencial em troca do supérfluo, renunciamos à verdade em nome da conveniência, celebramos a ilusão como se fosse vitória.
Não distante desse processo, a sociedade se enredou nos dilemas éticos que ela mesma arquitetou. Ergueu códigos morais que pretendiam conter o caos, mas acabaram por legitimar a decadência. A ética tornou-se instrumento de vaidade, não de virtude; espetáculo, não fundamento.
O ecossistema humano colapsou, não pela carência de meios, mas pelo esgotamento de fins. E, diante da consciência da falência, adotou-se como estratégia o silêncio: encobrir o fracasso, maquiar a ruína, negar a nudez que finalmente se revelou. Não tememos a destruição, mas a vergonha de reconhecer que o colapso nasceu daquilo que chamávamos de progresso.
Tecnologia foi erigida como redenção, mas se consolidou como servidão. Desenvolvimento foi proclamado como triunfo, mas não passou de aceleração do vazio. Nunca acumulamos tantos instrumentos e nunca fomos tão incapazes de utilizá-los em direção a algo superior. Eis o paradoxo inescapável da modernidade: abundância de meios, indigência de sentidos; excesso de conexões, deserto de vínculos; proliferação de dados, escassez de conhecimento.
Não se pode mais ignorar os efeitos do avanço descontrolado da tecnologia. Ela se tornou substituta de vínculos, distorce relações, dilui experiências reais, nos afasta uns dos outros e subverte o conhecimento. É inadmissível que pais mal consigam sentar à mesa com os filhos ao final do dia para saber como foi o dia de cada um, ou que jovens tenham todo o seu conhecimento apenas em nuvens digitais, vidas mediadas por telas e algoritmos. Esse é o legado de uma promessa de progresso que se transformou em alienação. É urgente questionar a direção que tomamos, antes que aquilo que chamamos de desenvolvimento, consuma com o que resta de humanidade em nós, conduzindo-nos a uma trajetória antinatural e imoral sob a perspectiva dos relacionamentos humanos.
Mateus Ferraz Sttuqui
Técnico em Administração e Graduando em Direito
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