A vida aos 50 (graus)

Em 2015, 196 países assinaram um tratado na ONU, comprometendo-se a evitar o aumento de dois graus Celsius até 2100. Caso a temperatura do planeta suba este tanto, a Groelândia e parte da Antártida derreteriam e o nível do mar subiria 13 metros, encobrindo praticamente todas as cidades litorâneas do planeta. Estima-se que existiriam em torno de um bilhão de refugiados “climáticos” no mundo. Um problema é a grande chance de atingirmos o aumento de um grau e meio até 2027. Caso aconteça, será difícil segurar mais meio grau em 70 anos. Mesmo assim, nenhum dos países desenvolvidos abrirá mão do seu enriquecimento nem diminuirá suas emissões de carbono. Existe a praticamente impossível conciliação de interesses privados e coletivos, locais e globais.

O aumento da temperatura global acarretará cada vez mais e maiores ondas de calor. A vida, tal como a conhecemos, pode estar em risco. Acabaremos por ter pessoas mais isoladas, fechadas em bolhas de ar condicionado. O desfrute da convivência humana diminuirá. As cidades, se transformarão de “selvas de pedra” para um “deserto apocalíptico”, onde as ruas e as praças ficarão desertas durante semanas, porque ninguém conseguiria sair com tanto calor. Num extremo, será preciso impedir até o tráfego de automóveis. Ou as cidades se reinventam ou estarão condenadas.

A temperatura média global bate recordes quase todo ano. Os fenômenos climáticos extremos não pertencem mais ao futuro e sim ao presente. A emissão de CO2 já é maior do que o planeta consegue absorver. A Europa sofre mais do que os outros continentes. Em 2022, Portugal esteve em seca extrema ou severa em 100% do seu território. Outros sete países europeus marcaram em 2023 a maior temperatura de sua história.

Existem atualmente 350 grandes cidades em todo o mundo onde um total de 200 milhões de pessoas lutam com frequência contra temperaturas acima de 35 ºC. Até 2050, esse número crescerá para cerca de mil cidades e 1,6 bilhões de pessoas (de um total estimado de 9,7 bi) enfrentarão calor extremo durante mais de três meses consecutivos por ano. O calor extremo será o “novo normal”.

O aumento da temperatura não é consenso. Há quem diga o contrário, que o planeta está resfriando. Negacionismo virou moda. Nem o pior cínico há de negar que o planeta está com febre. Isso terá repercussões no sistema de saúde. Crescerão as doenças transmitidas por pernilongos. Ainda teremos reflexos na segurança alimentar, escassez de água, diminuição do turismo, secas, enchentes, extinção de espécies animais e vegetais, colapsos de ecossistemas. É necessário estarmos preparados para tudo isso. Dizem que se tirar a nossa região do mapa, a temperatura do planeta cairá dois graus. Sorte (?) a nossa que por estas bandas, já somos meio acostumados com o calor.

Autor

Toufic Anbar Neto
Médico, cirurgião geral, diretor da Faceres. Membro da Academia Rio-pretense de Letras e Cultura. É articulista de O Regional.