A solidão como companhia

Está chegando o Natal e com ele várias emoções, sentimentos; e a solidão é um deles. Por isso resolvi escrever sobre esse tema e no final deixar uma dica.

Estar só não é uma doença, também pode ser uma opção existencial tão respeitável quanto poderia ser um casamento por amor ou por conveniência. Mas devemos dividir o universo dos solitários em sadios e enfermos. Estes últimos caracterizam-se por defender sua solidão com um verdadeiro arsenal de argumentos, que utilizam quando são interrogados ou para consumo próprio. Tais argumentações foram extraídas, em sua maioria, de experiências dolorosas; mulheres que amaram intensamente e ficaram presas para sempre à lembrança de um homem que as abandonou. Maridos que sofreram uma traição e, a partir daí, não confiaram mais na honestidade feminina.

O universo humano relata muitas histórias similares em que o denominador comum é sempre o mesmo: não podem amar novamente, não confiam em outra pessoa para entregar seus preciosos sentimentos.

Quando ouvimos uma convicta mulher solitária vemos que suas razões são poderosas. Não querem saber de homens, estão em paz sozinhas, e reiniciar uma relação seria equivalente a recomeçar uma penosa guerra. Embora os motivos sejam lógicos, algo em sua atitude nos faz pensar que no caso de aparecer na sua vida um homem bem-intencionado, capaz de amá-la realmente, ela o trataria da mesma forma que o outro, verdadeiramente perigoso e desconfiável. Sem perceber, contam a possibilidade de uma nova relação, porque as razões históricas tem mais peso que qualquer percepção atual. Não estão doentes no sentido clássico, porém perderam a capacidade de discriminar quando são atacadas ou quando são amadas.

Um dia um paciente do hospital psiquiátrico em que trabalhei, chegou à sessão de psicoterapia profundamente alterado. Disse que não tolerava mais ser objeto da curiosidade das pessoas, pois sentia que todos o olhavam de modo ostensivo. Observavam-no fixamente e ele não suportava mais isso. Evitei a tentação de dizer-lhe que isso não era verdade, que eram fantasias sem fundamento, mas verifiquei que embora perturbado, não estava totalmente errado. Realmente o observavam, só que o faziam em resposta a seu estranho modo de se comportar; seu modo de olhar chamava a atenção. Tratava-se de um paranoico. É paranoico porque está patologicamente convencido de que o observam, porém, na realidade, se faz objeto do olhar por ser paranoico.

A paranoia é uma doença psíquica cuja dinâmica apresenta alguns pontos de semelhança com os problemas que estamos tratando. É uma doença curiosa e ilustrativa e é obvio que os paranoicos não são necessariamente solitários, nem afirmamos que os solitários sejam paranoicos. Ambos compartilham uma certeza: de que são observados ou decepcionados, enganados por seus semelhantes. São seres que se sentem ameaçados, e não lhes resta outra alternativa a não ser defenderem-se.

Assim como os neuróticos tem dúvidas e querem respostas, os paranoicos tem certezas e querem convencer-nos de suas razões e justificá-las.

Todos nós somos um pouco paranoicos. É notável quando, por algum motivo, sentimos insegurança ou medo. O universo inteiro percebe e aproveita justamente esse momento para nos perseguir.

 

Ivete Marques de Oliveira

Psicóloga clínica, pós-graduada em Terapia Cognitivo Comportamental pela Famerp

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Artigos de colaboradores e leitores de O Regional.