A Sociedade em Vigilância: Fiscalização dos Atos Públicos

Nos meandros da democracia contemporânea, a sociedade emerge como protagonista crucial na vigilância e fiscalização dos atos públicos. Essa mudança de paradigma, impulsionada pela crescente demanda por transparência e responsabilidade, representa um avanço significativo no controle dos poderes instituídos e na garantia dos direitos dos cidadãos.

No cerne dessa transformação encontra-se a consolidação do princípio da participação cidadã, fundamentado na premissa de que a democracia não se limita apenas ao ato de votar, mas também à capacidade dos cidadãos de influenciar ativamente as decisões políticas e administrativas que afetam suas vidas. Nesse contexto, a sociedade civil assume um papel de vigilante dos atos públicos, exercendo um controle social que transcende as fronteiras tradicionais do Estado.

É notório que a evolução tecnológica desempenha um papel crucial nesse processo. As ferramentas digitais e as redes sociais ampliam exponencialmente a capacidade dos cidadãos de monitorar e denunciar irregularidades, promovendo uma verdadeira revolução na forma como a informação é compartilhada e disseminada. Não mais confinados aos limites físicos das instituições governamentais, os olhos da sociedade estão agora em todos os lugares, prontos para expor qualquer desvio de conduta ou abuso de poder.

Nesse sentido, o filósofo francês Michel Foucault oferece considerações relevantes ao discutir o conceito de vigilância como uma ferramenta de controle social. Em sua obra seminal "Vigiar e Punir", Foucault argumenta que o poder disciplinar opera não apenas através de instituições formais, como o Estado, mas também através de mecanismos de vigilância e normalização presentes em todas as esferas da sociedade. Nessa perspectiva, a vigilância exercida pela sociedade civil não é apenas um exercício de transparência, mas também uma forma de resistência aos dispositivos de poder que buscam subjugar e controlar.

No entanto, é importante reconhecer que os avanços na fiscalização dos atos públicos não são isentos de desafios e obstáculos. A disseminação de informações falsas e a manipulação da opinião pública são apenas alguns dos dilemas enfrentados nesse novo cenário de vigilância. Além disso, a resistência por parte das estruturas de poder estabelecidas muitas vezes se manifesta através de tentativas de restringir o acesso à informação e de minar a credibilidade das denúncias feitas pela sociedade civil.

Diante desses desafios, torna-se imperativo fortalecer os mecanismos de proteção e apoio aos defensores dos direitos humanos e dos valores democráticos. A liberdade de expressão e o direito à informação devem ser salvaguardados como pilares fundamentais da democracia, garantindo que aqueles que se dedicam à fiscalização dos atos públicos possam fazê-lo sem temor de retaliação ou censura.

Em última análise, a ascensão da sociedade em vigilância representa um marco na história da democracia, evidenciando o poder transformador da participação cidadã na construção de uma sociedade mais justa e transparente. Ao exercer seu direito e dever de fiscalizar os atos públicos, os cidadãos não apenas fortalecem os alicerces da democracia, mas também afirmam sua capacidade de moldar ativamente o destino de suas comunidades e nações.

Autor

Jaquelini Cristina de Godeis
Advogada. Ex-Assistente Especial da Assembleia Legislativa de São Paulo. Especializada em Direito de Família e Sucessões. Pós-Graduanda em Direito Contratual pela PUC-SP e Mestranda em Direito Público.