A ilusão ideológica nas redes e o poder real do centrão

Vivemos uma era em que o entendimento político virou quase um ritual de repetição. As redes sociais transformaram o debate em palco para slogans e frases prontas, enquanto o conteúdo, a análise e a ponderação ficam de lado. Milhares de pessoas replicam opiniões que não compreendem, apenas porque foram ditas por alguém que admiram ou que compartilha sua posição política. Nesse ambiente, surgem conceitos pinçados do nada, como o tal do “socialismo fabiano”, rotulado como ameaça, sem que a maioria saiba do que se trata.

O socialismo Fabiano nasceu no Reino Unido, em 1884, propondo reformas sociais graduais, sem revolução, defendendo igualdade de oportunidades e papel moderador do Estado, mas sem atacar a economia de mercado. É, portanto, algo distante tanto da ortodoxia marxista quanto do populismo latino-americano. Mesmo assim, virou alvo preferido de certos grupos nas redes, que tentam colar esse rótulo em adversários para desqualificá-los.

No jogo das redes, isso pouco importa. A verdade factual vale menos que a percepção alimentada por algoritmos. Nesse cenário, o debate político foi substituído pela guerra de narrativas.

Enquanto isso, no mundo real, quem governa o país não são os militantes virtuais nem os ideólogos digitais. É o Centrão. Esse bloco de partidos, sempre presente, esteve com Dilma, Temer, Bolsonaro e agora com Lula. Todos o criticam, mas ninguém governa sem ele. E é aí que mora a ironia: enquanto os radicais de direita e esquerda se atacam, o centro fisiológico avança, negocia e ocupa o poder.

O Brasil tem 30 partidos registrados, mas as decisões fundamentais passam sempre por esse núcleo. Eles não gritam, não viralizam no TikTok, mas controlam o Orçamento, os ministérios e os votos. A militância pode até xingar o Centrão nas redes, mas é ele quem garante governabilidade — ou a destrói. E isso diz muito sobre quem, de fato, manda no país.

É hora de admitir: o embate ideológico virou uma ilusão. A prática política brasileira não é movida por doutrinas, mas por acordos. O discurso é de esquerda ou de direita, mas o jogo é de centro. Enquanto o país não entender essa equação, seguirá apegado a fantasmas ideológicos, enquanto o Centrão, com sua discrição eficiente, continuará conduzindo os bastidores do poder.

Gregório José

Jornalista, radialista e filósofo 

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Artigos de colaboradores e leitores de O Regional.