A hostilidade de Cordão Escuro (I)
O que muita gente ainda desconhece é o fato de que, em tempos antigos, o povoado de Cordão Escuro, hoje Palmares Paulista, lá no início do século XX, era muito mais importante que nosso nascente povoado.
Para comprovar isso, em seu livro “A História de Catanduva de A a Z”, o professor Vicente Celso Quaglia traz que “(...) pela Estrada do Taboado, única via de acesso ao ‘mundo civilizado’, o trânsito de mercadorias se fazia, de forma sempre crescente, no lombo dos burros cargueiros ou nos carros de boi, transformando o incipiente arraial do Cordão Escuro num efervescente entreposto comercial, ao qual socorriam os primeiros habitantes do arraial de São Domingos do Cerradinho, atual Catanduva”.
Violência
Mesmo com uma importância maior, se comparado com outros povoados vizinhos, Cordão Escuro não apresentava um ambiente totalmente pacífico e tranquilo para se viver.
Muitos historiadores já escreveram a respeito do tema, mostrando que em tempos anteriores, o sertão era palco de disputas e de diversas formas de violência.
Manuel da Fonseca, por exemplo, em sua obra “Vida do Padre Belchior das Pontes”, ao se referir às regiões de Minas Gerais, por exemplo, traz que “(...) reinava entre tanta abundância de ouro e luxúria (...) acompanhavam este monstro os contínuos roubos, os homicídios, as injustiças e finalmente tudo aquilo que costuma haver naqueles lugares onde há falta de homens virtuosos.” E ainda completa que tais crimes ficavam sem castigo “(...) porque nas Minas justiça humana não teve ainda tribunal nem o respeito do que em outras partes gozam”.
Infelizmente, o arraial de Cordão Escuro, nos seus primórdios, não fugiu à regra dominante nos tempos da mineração do ouro. A presença da violência e das maldades perturbava a tranquilidade da comunidade em formação, onde a autoridade constituída era ausente ou omissa no seu exercício, para manter a ordem social.
O cronista do arraial, José Barbosa, filho do Subdelegado de Polícia, Juvêncio Barbosa Lima, depois da ereção à vila de Palmares, em 03 de abril de 1908, foi testemunha ocular de alguns atos de violência que tumultuaram a pequena comunidade.
Em seu livro “Cordão Escuro”, ele nos fala de dois ingleses, provavelmente pesquisadores de minas de ouro, “(...) em época que não se pode ao certo precisar”, adquirirem uma grande gleba de terras no atual bairro rural do Laranjal, onde “localizaram a sede da futura fazenda e colônia, construídas com gosto e capricho”, qual como uma fazenda modelo.
Brutalmente assassinado à faca um dos ingleses por um nordestino embriagado e seu empregado, no centro do vilarejo, a fazenda foi abandonada pelo seu sócio e amigo, que desapareceu, sendo depois a propriedade rural loteada para sitiantes, dos quais se destacaram: Gaspar Trazzi, Gaspar Longhini, José e Rodolfo Schettini, Irmãos Mestriner, os Paulatti, Caetano Ensina, Sebastião Bernal, Carmelo Ragonezzi, Pedro Parron e outros, no cultivo de extensos cafezais.
José Joaquim de Santana
Outro caso contado por José Barbosa e que, inclusive, foi citado pelo professor Vicente Celso Quaglia em seu livro “Sombras do Passado – Historiografia de uma Cidade”, foi o caso da “demanda do Palmital”, cujo personagem principal foi o major da Guarda Nacional, José Joaquim de Santana, foragido da justiça da região de Jardinópolis, Alta Mogiana, por ter sido responsável por crime cometido “com os maiores requintes de selvageria.” Adquirindo de José Theodoro de Carvalho um sítio na parte baixa do Palmital, pela violência foi ampliando a sua propriedade agrícola, seja pela arrogância das atitudes, seja pelo regime de terror que implantou na vizinhança.
“Por volta de 1912, mais ou menos, a Justiça deu ganho de causa ao pseudo e pretendido dono das terras em litígio”, grande parte delas com boas benfeitorias e plantações em véspera de abundantes colheitas. Para o efeito do despejo das famílias lá assentadas, o Major conseguiu o uso da força, tendo vindo de São Paulo um contingente da Força Pública do Estado, composto de quarenta soldados sob o comando de um oficial, “que cometeu a maior tropelia e devastação até então desconhecida naquelas paragens”, vasculhando as casas, incendiando os ranchos, os paióis, as roças e até os animais de criação. Aliás, foi assim que no início de nossa colonização, grandes fortunas se acumularam, mas deixando um rastro de injustiças, de crimes, de assaltos, sempre acobertados pelo Poder Público. O certo é que descendentes do arbitrário Major ficaram marcados, ao longo do tempo, com o estigma de enriquecimento ilícito, da prepotência e da impunidade criminosa.
Fonte de Pesquisa:
- Livro “A História de Catanduva de A a Z”, de Vicente Celso Quaglia.
- Livro “Sombras do Passado – Historiografia de uma Cidade”, de Vicente Celso Quaglia
Fotos:
No final do século XIX e início do XX foi comum uma onda de banditismo em várias regiões do Brasil. Uma delas foi o Cangaço, que teve a figura de Lampião como destaque. Na foto, escadaria da Igreja de Piranhas, Alagoas, onde a polícia exibe seu arranjo macabro: as cabeças de Lampião (ao centro, embaixo), de Maria Bonita e do restante do bando
Foto da Força Pública do Estado de São Paulo, hoje Polícia Militar, fazendo treinamento no ano de 1914. Era acionada para resolver uma grande quantidade de crimes na região
Coronel Nerel, chefe da missão francesa, fazendo a crítica das manobras, em presença do Secretário de Justiça de São Paulo, Dr. Eloy Chaves, Coronel Baptista da Luz, Comandante da Força Pública do Estado de São Paulo e toda a oficialidade reunida no ano de 1914
Mapa da Estrada do Taboado, elaborado em 1895 pelo engenheiro Olavo Augusto Hummel. Nascia em Jaboticabal e ia até na divida do Estado de São Paulo com o Mato Grosso (Rio Paraná)
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