A Epopeia da Gratidão

Segundo alguns políticos, o professor deveria trabalhar pelo amor, ser grato pela possibilidade de exercer o dom divino que recebera ao encarnar nesta terra. Agradecer o salário indigno e degradante e as demais demandas que oneram o trabalho do professor. Recentemente presenciamos uma retórica no mínimo engraçada sobre a gratidão em uma audiência pública, relatada pelo prefeito, no geral, serviu para dar o seguinte recado: sejam gratos pela reestruturação que nos coage de forma a aceitar passivamente, como ovelhas em um rebanho a imposição de algo que sequer fomos consultados! 

Alguns entusiastas podem até achar que o professor ganha milhões, mas vamos olhar em uma perspectiva menos eclesiástica... O professor tem que muitas vezes auxiliar com a compra de materiais porque muitas vezes não tem na escola, nas festas, colaboramos com brindes para pagar as contas da APEM que a Prefeitura não cobre, entre outros pontos. Não vemos o professor falando que merecemos a gratidão de ninguém, sabe por quê? Porque conhecemos o nosso trabalho e embora façamos além, isso ainda é colocado como exercício da docência. 

De fato, para argumentar que é feito algo, basear-se numa retórica ineloquente pode gerar uma maior desmoralização para com os docentes, quando na verdade, nada do que foi apresentado foge ao escopo da obrigação que se deve ter com o cargo eletivo que se exerce. Trocando em miúdos, o fato de se ter escola para trabalharmos não faz com que seja obrigação termos uma gratidão servil e apascentada. 

Mas vamos aos fatos que podem por vezes passar despercebidos em um discurso parco e torpe...Em 2021, o Instituto Península fez uma pesquisa com os professores e pasmem, a pesquisa revelou que na percepção de 74% desses profissionais os professores não são respeitados no Brasil, enquanto que para 77% a profissão é desvalorizada, e 90% declarou que sua profissão não recebe bons salários. 

E pra finalizar, o Relatório da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que mostram que a média do salário inicial dos professores dos anos finais do ensino fundamental no Brasil é a menor entre 40 países analisados pela pesquisa. 

Compreendemos que investir em recursos materiais é necessário, porém, sem o principal elemento mediador realmente valorizado, estaremos sempre retrocedendo, cada vez mais e não adianta cobrar eficiência com professores desacreditados, desmoralizados. 

A educação nunca deve ser tomada como gasto, mas como investimento e mais, investimento na pessoa humana que lá está exercendo a docência, que ao longo das décadas, vem sendo marginalizada. Mas esquecem que esse descaso reflete diretamente na prática docente, consequentemente, na educação como um todo.

Autor

Eduardo Benetti
Professor Recreacionista em Catanduva