A dor que ninguém vê

Vivemos em uma sociedade acostumada a reconhecer a dor que sangra, que deixa marcas visíveis. Mas e a dor invisível? Aquela que não aparece em exames, que não vira manchete, que se esconde atrás de um sorriso forçado ou de um “está tudo bem”? A violência psicológica é uma dessas dores — silenciosa, contínua e profundamente destrutiva.

Ela acontece quando alguém, por palavras, atitudes ou omissões, atinge a dignidade do outro. Pode estar disfarçada de “cuidado”, “zelo” ou “preocupação”, mas se revela nos gestos de controle, nos xingamentos, nas críticas constantes, no isolamento imposto, nas ameaças sutis, na manipulação emocional. Em relacionamentos afetivos, familiares, profissionais e até religiosos, a violência psicológica atua como uma erosão interna, minando a autoestima e o senso de valor pessoal da vítima.

O mais cruel é que, por não deixar marcas no corpo, essa violência muitas vezes não é levada a sério. Frases como “mas ele nunca encostou a mão em você” ou “você está exagerando” invalidam o sofrimento real de quem está sendo emocionalmente violentado. E assim, muitas vítimas se calam — envergonhadas, confusas, com medo de não serem acreditadas.

As consequências, no entanto, são graves. Depressão, ansiedade, síndrome do pânico, distúrbios alimentares e até ideias suicidas podem surgir como resultado de um processo contínuo de desvalorização e sofrimento psíquico. O que parece “apenas” um problema emocional é, na verdade, uma forma de violência tão séria quanto qualquer agressão física.

Precisamos aprender a ouvir os sinais da dor emocional. Precisamos validar o sofrimento do outro, sem julgamento ou ironia. Precisamos, sobretudo, compreender que a violência psicológica existe, destrói e mata — ainda que em silêncio.

É papel de todos nós romper esse ciclo. Ao menor sinal de humilhação, manipulação ou abuso emocional, é essencial buscar ajuda, romper o silêncio e fortalecer redes de apoio. Ninguém merece viver prisioneiro de um sofrimento que o mundo insiste em ignorar. Porque a dor que ninguém vê, se não for acolhida, é a que mais destrói.

Autor

Ivete Marques de Oliveira
Psicóloga clínica, pós-graduada em Terapia Cognitivo Comportamental pela Famerp